Decorre até domingo, em Montemor-o-Velho, o Campeonato Mundial de Combates Medievais. As armas são verdadeiras e as armaduras chegam a pesar 35 quilos. Portugal está representado.
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Na arena montada no castelo de Montemor-o-Velho, sobranceiro aos campos do Baixo Mondego, Alexandra Duarte, 44 anos, agente da PSP em Peniche, prepara-se para enfrentar uma adversária luxemburguesa.
Armada com uma espécie de alabarda - uma vara em madeira encimada por uma peça metálica que faz lembrar um machado -, armadura dos pés à cabeça e vestimenta decorada com cinco quinas em azul e branco, ao sinal do árbitro Alexandra avança para cumprimentar a oponente, mas recebe uma pancada na perna, escorrega e cai.
Restabelecida da surpresa, a agente da autoridade reage e, ao longo dos três rounds, acaba por dominar a opositora. Quem ache que é teatro, desengane-se, porque a luta corpo a corpo é real, embora com regras apertadas e claras para proteger a integridade física dos participantes.
Os golpes de arma e os derrubes dão pontos, cabeçadas e murros também são permitidos, não contam para a pontuação, mas cansam e desorientam o adversário.
No final do combate que durou poucos minutos, em declarações à agência Lusa, visivelmente cansada e a arfar, Alexandra Duarte explica que foi o gosto pela História que a levou a aderir aos combates medievais, vai para quatro anos, tendo começado há quase oito pela esgrima histórica.
"Como era a única que conseguia, entre aspas, bater nos rapazes, e aguentar a pancada sem me queixar, quando abriram a possibilidade das mulheres competirem foi só transitar de um lado para o outro", afirma.
Apaixonada por História, a lutadora portuguesa argumenta que os combates medievais "dão uma perspetiva diferente" da História de Portugal e de batalhas como Aljubarrota.
"Quando temos uma armadura em cima, aprendemos a sentir a nossa História com um orgulho diferente", assinala.
Por outro lado, na competição mundial - que decorre pela primeira vez no nosso país e que envolve 23 países - "não há distinções" entre lutadores, embora países como os Estados Unidos da América e Polónia dominem a modalidade e Portugal ainda esteja a começar.
"Somos todos amadores, fazemos isto porque gostamos e é um desafio. Conseguimos envergar uma armadura, chegar ali e aguentar os três rounds. E chegar a casa e treinar, é diferente de ir para um ginásio, para uma piscina, é uma condição física que se adquire também em equipa, como o exército trabalhava na Idade Média", destaca Alexandra Duarte.
Nuno Serra, responsável da Liga Portuguesa de Combate Medieval, sublinha a dureza dos combates: "Os golpes são duros. Tem a sua violência, tem a sua dureza. Tem também muita honra e muita camaradagem", revela.
"É um combate real, com as pessoas a bater a sério. Mas, no final dão um abraço e estão contentes, quer ganham quer percam", diz.
A modalidade está a dar os primeiros passos em Portugal - no mundial em Espanha, há dois anos, a prestação "foi relativamente fraca", mas a equipa nacional quer aumentar o nível de participações em torneios internacionais para ganhar experiência.
Na equipa portuguesa, além da agente da PSP, pontificam vários informáticos, alguns artesãos e uma fisioterapeuta "que dá muito jeito para algumas lesões", uma realidade idêntica à de outros países, em que os competidores possuem outras ocupações. "Por aí há advogados, há médicos, nos outros países também há uma grande variedade", afirma Nuno Serra.
Já o polaco Hubert Filipiak, presidente da Federação Internacional de Combate Medieval (IMCF), explica que até domingo irão decorrer dez competições, masculinas e femininas, individualmente ou em grupo, com armas diferentes, entre as quais alabardas, ou espadas com ou sem escudos, entre outras.
"É muito interessante de assistir. Podem ser combates muito rápidos em que acontece muita coisa. Em grupo, às vezes, ao fim de uns minutos, estão dez homens estendidos no chão, há muita ação", explica.
De acordo com Hubert Filipiak, as armas utilizadas são "autênticas", embora não afiadas e, a exemplo dos trajes e armaduras, idênticas às utilizadas nos séculos XIV, XV e início do século XVI.
"As armaduras pesam entre 20 a 35 quilogramas [quanto maior o lutador, mais quantidade de metal a armadura tem] e é possível bater com rapidez e velocidade máxima porque a armadura protege o corpo", garante.
O presidente da autarquia de Montemor-o-Velho, Emílio Torrão, sustenta, por seu turno, que o evento, que tem entrada gratuita, para além da componente desportiva, envolve a comunidade local e artesãos de vários pontos do país e do estrangeiro, instalados num mercado medieval dentro das muralhas.
"Estamos a dar vida ao castelo e o castelo está a dar vida ao concelho e à vila. O castelo não é uma maldição, é algo que podemos explorar, potenciar e este é o ambiente próprio para o fazer", declara.