Portugal deu ontem um novo passo na investigação científica nacional. A partir desta quinta-feira, investigadores e universidades portuguesas passam a aceder à mais completa base de dados bibliográficos e bibliométricos reconhecida internacionalmente. O lema é igualdade de direitos no acesso à informação.
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Desde quinta-feira a comunidade científica portuguesa passou a poder aceder a um serviço que contempla uma base de dados bibliográficos e bibliométricos e a plataforma de pesquisa online Web of Knowledge do Instituto de Informação de Filadélfia (ISI).
O serviço permite a investigadores, estudantes e interessados aceder a informações que até ao momento só existiam fora de Portugal, evitando esforços económicos de várias ordens, e dá um novo impulso ao desenvolvimento de projectos científicos em Portugal.
«É um instrumento essencial para qualquer pessoa que trabalha em ciência ou que trabalha em profissões que precisam da informação científica», explicou Mariano Gago, ministro da Ciência e da Tecnologia em entrevista à TSF.
Trata-se de «uma grande base de dados bibliográfica onde, se se quiser saber quem fez investigação sobre cancro, ou quem é que fez investigação sobre plasmas, ou quem é que fez investigação sobre anthrax nos últimos anos, pode muito rapidamente saber onde estão os centros de competência, saber tudo o que está publicado, saber o que está mais perto de si e depois ir à procura da informação concreta», acrescentou.
Até ao momento só o Observatório das Ciências e das Tecnologias, um organismo do Ministério da Ciência e tecnologia (MCT), dispunha deste serviço, mas ainda assim de uma forma limitada.
A partir de agora instituições de ensino superior público, laboratórios do Estado, laboratórios associados e outras instituições científicas, através de uma assinatura nacional junto do ISI, para já assegurada pelo Ministério, têm uma nova porta aberta para o futuro.
De acordo com um comunicado do MCT o serviço «estará em funcionamento até 31 de Janeiro de 2002, por acesso via Internet, para um máximo de 100 utilizadores simultâneos, após o que as bases de dados serão instaladas em Portugal para o acesso em Intranet».
«O acesso será, de imediato, gratuito para todas as instituições. No futuro e para permitir a sustentabilidade do investimento, poderão vir a ser estudadas modalidades de comparticipação das instituições abrangidas pelos custos da assinatura», acrescenta o documento.
Mariano Gago prefere não falar de custos
Questionado sobre as modalidades de comparticipação das assinaturas e sobre os custos deste serviço em Portugal, Mariano Gago preferiu não responder à pergunta, sublinhando que se tratava de um assunto no âmbito do Tribunal de Contas.
Lurdes Rodrigues, presidente do Observatório das Ciências e das Tecnologias, realçou a importância deste novo serviço, que considera uma ferramenta fundamental de trabalho, ultrapassa todas estas dificuldades.
«É uma coisa absolutamente extraordinária»,«facilita as condições de trabalho» porque «um investigador português que quisesse ter acesso a estas condições de trabalho tinha que ir ao estrangeiro ou pagar muito caro cá», disse.
Segundo a investigadora, o resultado da introdução deste «instrumento fundamental de trabalho», pode traduzir-se num «aumento imenso» no número de trabalho de cientistas.
A apresentação do produto foi feita ontem (quinta-feira), na Fundação para a Computação Científica e Nacional. Na sessão participaram Mariano Gago, ministro da Ciência e Tecnologia, Lurdes Rodrigues, presidente do Observatório das Ciências e das Tecnologias, Jeff Clovis, director do ISI. Na plateia encontravam-se vários investigadores interessados no serviço e representantes das universidades e institutos politécnicos.
A maior biblioteca do mundo à mão de todos nós
O serviço destina-se sobretudo a ser usado por especialistas em investigação científica e interessados no assunto, mas qualquer pessoa que queira ter acesso a ele pode «dirigir-se a uma biblioteca universitária ou a uma instituição científica da biblioteca nacional», clarificou Mariano Gago.
Os institutos e as universidades são os principais alvos porque «é aí que se trabalha nestas coisas, estes são os principais utilizadores e depois existem ainda 300 mil universitários em Portugal que são os potenciais utilizadores» explicou Lurdes Rodrigues, que sublinha que apesar da disponibilidade do produto a outros públicos «esta iniciativa é destinada ao mundo da investigação (...) não vale a pena ter fantasias».
Por outro lado, prosseguiu, «é uma ferramenta muito fácil para qualquer jornalista saber o que é que em Portugal, no momento exacto, se está a fazer. Fica também acessível a qualquer dirigente de empresas que queira saber o que é que as instituições portuguesas estão a fazer».
Cidadão comum ganha com melhor ciência
Mariano Gago acredita que o cidadão comum tem muito a ganhar com o novo serviço, apesar do sistema não estar directamente acessível para todos e destinar-se sobretudo a especialistas no assunto.
«O benefício para o cidadão comum é ter uma investigação científica e uma ciência mais actualizada em Portugal (...) e é ter a certeza que a investigação científica em Portugal beneficia das mesmas condições de trabalho que a investigação científica nos outros países», realçou.
Uma aposta certa para a cidadania
Para Lurdes Rodrigues, o facto de o serviço estar disponível também em bibliotecas e universidades e de, inicialmente, os gastos serem comportados pelo Governo revela uma grande «generosidade» e uma aposta segura na ciência em Portugal.
«Há uma grande generosidade política ao considerar isto um serviço público» porque «a ciência é de facto uma prioridade política onde se faz uma assinatura nacional e se torna isto um serviço público. É assumir na essência que a ciência e tecnologia é uma prioridade», sublinhou.
Um processo moroso
Apesar de ser um serviço tão importante para a comunidade científica em Portugal e no mundo, só agora chegou a território nacional. Para o ministro da Ciência e da Tecnologia tratou-se de uma questão de criação de condições, técnicas e de segurança, no país para albergar de modo seguro esta nova ferramenta.
«Era preciso reconhecer a própria credibilidade do país em organizar este serviço no seu interior», explicou Mariano Gago.
«O que foi preciso foi, por um lado, organizar-nos internamente, demonstrarmos capacidade não só técnica para vir a albergar o espelho das bases de dados de uma forma sistemática e segura no interior do país para o acesso das instituições nacionais», argumentou.
Por outro lado, era ainda necessário «que existisse uma rede de responsabilidade, à escala de todas as instituições, que permitisse a uma única entidade, neste caso o Ministério, ser responsável pelo país todo e por todas as instituições do país perante o Instituto de Informação Científica de Filadélfia», acrescentou.
Outro ponto muito importante foi a discussão dos custos que «demorou tempo», realçou.
Caminhar passo a passo para o futuro
O projecto é um investimento futuro para a criação da nova biblioteca de Ciência e Tecnologia em Rede, explicou Mariano Gago. Mas as novas iniciativas dependem da evolução do trabalho dos editores internacionais.
«A partir daqui o passo seguinte para a construção de uma biblioteca de ciência e tecnologia em rede (...) não depende só de nós, não depende só do país e depende da própria evolução tecnológica dos editores em termos internacionais», afirmou.
Neste momento existe um esforço muito grande da «maioria dos grandes editores científicos, que está a converter rapidamente todas as revistas científicas mundiais, em todas as áreas, para formato digital», sublinhou.