Um comboio, um maquinista. Quatro retratos da ferrovia europeia

Em dia de greve em Portugal devido à possibilidade de existir apenas um funcionário de serviço em cada comboio, a TSF foi à descoberta da realidade noutros países da Europa.

Na Bélgica, um comboio sem "pica" não anda. Há um projeto em "standby" para eliminar o agente de cobranças, mas, os sindicatos não o deixaram avançar.

À semelhança do que acontece em Portugal, as entidades que gerem os caminhos de ferro belgas apresentaram também, há dois anos, um projeto para os comboios poderem circular apenas com a presença do maquinista, mas a ideia foi de imediato rejeitada pelos sindicatos.

"Está fora de questão retirar o agente de cobranças do comboio. Porque ele não tem apenas um papel de controlo dos passageiros. Tem um outro papel, muito importante, ao nível da segurança", afirmou à TSF Philippe Delhalle, presidente do Sindicato Livre dos Trabalhadores dos Caminhos de Ferro, que representa a função pública ferroviária, frisando que muitos outros serviços se perderiam.

"Não vamos deixar que isso aconteça. Isso é certo", garantiu.

Já em França, há muito que não existe um agente de cobrança nos transportes suburbanos e que os comboios funcionam apenas com um maquinista.

Neste país, a questão polémica é outra: os trabalhadores dos comboios contestam as mudanças que o presidente Emmanuel Macron pretende fazer no sistema ferroviário, como a privatização do setor e os cortes nos benefícios dos funcionários (que, até ao momento, não podiam ser despedidos e tinham como idade mínima para a reforma os 52 anos).

Por estes motivos, a companhia ferroviária SNCF (Société Nationale des Chemins de fer Français) está em greve dois dias úteis por semana, durante três meses.

Do outro lado do Canal da Mancha, a situação é parecida com a de Portugal. No Reino Unido, há 30 anos que um terço dos comboios já circula apenas com o maquinista. No entanto, a luta dos sindicatos intensificou-se nos últimos dois anos, com dezenas de greves, exigindo a manutenção do guarda responsável pela abertura e fecho das portas das carruagens, em prol da segurança dos passageiros.

Uma das linhas mais afetadas pelos protestos é a que liga Londres ao sul do país e na qual, todos os anos, são feitas 165 milhões de viagens.

Há dois anos que as greves nos comboios da Southern têm causado o caos na vida dos utentes. Só no verão de 2016, o mais complicado desde 1994, houve 17 greves de com duração de 24 ou 48 horas. De lá para cá, nada mudou na relação entre a empresa gestora e os sindicatos e, de tempos a tempos, acontece outra greve.

Os sindicatos dizem que os gestores só estão a pensar no lucro e a esquecer a segurança dos passageiros. A empresa defende-se dizendo que os novos comboios, que entretanto comprou, são mais seguros, e até já garantiu que manterá uma segunda pessoa no comboio mas não com funções ligadas à segurança (seria apenas uma espécie de agente de apoio ao cliente).

Estando em causa uma das linhas mais movimentadas das Grande Londres, a instabilidade laboral levou mesmo à intervenção do mayor da capital britânica, Saqid Khan, que veio a público apelar ao governo para que retomasse o controlo da empresa, pelo menos, de forma temporária. A luta sindical alastrou entretanto a outras linhas de várias regiões do Reino Unido.

Na Alemanha, esta é uma questão que nem se coloca: os comboios nunca circulam apenas com um funcionário.

De acordo com a GDL, a União dos Condutores Ferroviários da Alemanha, vários trajetos foram cancelados no último ano precisamente devido à falta de trabalhadores - uma vez que a existência de, no mínimo, dois funcionários por comboio é vista como uma medida de segurança indispensável.

Durante vários anos, a Deutsche Bahn, o principal operador ferroviário do país eliminou vários postos de trabalho, mas, em 2014, anunciou uma mudança de rumo, revelando o objetivo de contratar 10.000 funcionários até ao ano de 2020.

O principal desafio é contornar os cerca de 7.000 funcionários que pedem a reforma, a cada ano. a companhia emprega, no total, cerca de 300.000 pessoas.

*com João Francisco Guerreiro, Lígia Anjos, Emanuel Nunes e Joana de Sousa Dias

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