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Estamos junto ao Tejo, onde outrora avieiros originários da Praia da Vieira, rio abaixo e rio acima, cumpriam funções especiais de valorização a que as pessoas da cidade ainda hoje não fazem a devida justiça. Alves Redol chamou-lhes carinhosamente ciganos do rio e foi aqui, em Alhandra, que muita da ação nómada se desenrolou, entre Santarém e Vila Franca de Xira.
O restaurante Voltar ao Cais, animado diariamente pela chef Dina Mendes e o seu marido Marco Ascenção num local único, debruçado sobre o rio, trabalha um receituário único.
A sopa de peixe é gloriosa, de sabores vincados e temperos fortes. É entrada que recomendo sem hesitações. Para entrar mais devagar, opte pelo queijo de cabra fresco com doce de abóbora. Isto se conseguir resistir ao genial brás de farinheira, cremoso e rico.
Dina faz peixinhos da horta de crocância excecional, excelente para ir passando por molho tártaro, servido ao lado. E há muito mais por onde escolher.
No capítulo do peixe, pontifica o maravilhoso torricado com bacalhau assado. Igualmente patrimoniais são as enguias fritas com arroz malandrinho de tomate, de memorável harmonia de sabores. Há gambas à Brás que ficam na memória e rissóis de garoupa de ir às lágrimas, servidos com um espetacular arroz cremoso de grelos.
Vale a pena reservar espaço no estômago para acomodar um magnífico bife da vazia com molho de mostarda antiga. A sensibilidade da chef Dina é grande no tocante a pontos de cozedura e o acerto é total neste bife. Carne selada e caramelização forte no exterior, suculência e sabor no interior.
O toque caseiro faz-se sentir em vários momentos, especialmente nos pastéis de massa tenra, e ainda bem que assim é, apetece levar meia dúzia para casa, mas todos sabemos que é no instante do termo da fritura que devemos fazer-lhes as honras.
Provei uma outra delícia que obviamente recomendo, que é o frango caramelizado picante com molho de soja. Digno dos deuses.
As sobremesas são pura sedução, todas a primar pelo equilíbrio, sem excessos. A mousse de chocolate com noz caramelizada é um caso muito sério e a sericaia não lhe fica atrás. O café ou digestivo têm sabor especial na esplanada, mesmo em cima das águas tranquilas do Tejo.