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Catorze anos depois da aprovação da Lei de Memória Histórica, pelo Governo do socialista Rodríguez Zapatero, chega ao Conselho de Ministros a Lei de Memória Democrática, mais ambiciosa que a primeira, e que pretende promover o reconhecimento das vítimas do franquismo, ilegalizar a Fundação Francisco Franco e transformar o Vale dos Caídos num cemitério civil.
A nova lei, que foi elaborada pela ex vice-presidente Carmen Calvo, antes de ser substituída por Félix Bolaños na recente remodelação do Executivo, quer pôr no centro as vítimas da Guerra Civil e da ditadura, dar-lhes o reconhecimento que merecem, retirar este episódio da História espanhola do esquecimento e desfazer o tabu que ainda hoje o envolve. "Como se atrevem alguns a dizer que há vítimas de primeira e vítimas de segunda e que estas vítimas não contam? Alguém pensa que podemos construir algum futuro sobre esse silêncio, sem justiça, para chegar à paz e ao perdão? Fraco favor estaríamos a fazer aos mais novos, a quem temos de entregar um país decente", disse Calvo, numa apresentação recente da lei.
A nova lei procura ir mais longe na reparação dos danos causados pelo regime de Franco
Como tudo o que envolve a Guerra Civil em Espanha, a lei está longe de ter consenso político. O Partido Popular diz que já tem preparada uma Lei da Concórdia, que substituirá esta assim que o partido chegar ao poder. O Vox, partido de extrema-direita, mesmo sem conhecer o texto, já avisou que vai recorrer ao Tribunal Constitucional.
Reconhecimento das vítimas
A lei estabelece dois dias para o reconhecimento das vítimas da ditadura e da Guerra Civil: o 31 de outubro, para todas as vítimas, e o 8 de maio para os exilados. Além disso, todas as sentenças dos tribunais ditadas durante a Guerra Civil vão ser anuladas.
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Apologia do franquismo
A partir de agora, a apologia do franquismo passa a ser delito. A lei estabelece multas de até 150.000 euros para as infrações muito graves, que incluem trasladar restos de vítimas da Guerra Civil sem autorização, destruir fossas comuns e lugares de homenagem, e o enaltecimento do franquismo "em atos que humilhem as vítimas".
A Guerra Civil nas escolas
Em 2014, um relatório da ONU criticou que os livros de texto em Espanha se referissem à Guerra Civil "em termos gerais, perpetuando a ideia de uma responsabilidade simétrica entre bandos". A nova lei pretende mudar isso e quer introduzir conteúdos específicos sobre a Guerra Civil no ensino secundário e que "o sistema educativo espanhol tenha dentro dos seus objetivos o conhecimento da história democrática espanhola". O Ministério de Educação vai reformular o currículo educativo para incluir estas modificações e formar os professores.
Fundação Francisco Franco
A fundação que enaltece o nome do ditador até hoje vai ser ilegalizada. A partir de agora, a lei estabelece a extinção das fundações que "não visem o interesse geral", que façam apologia do franquismo e que exaltem o golpe de Estado "promovendo a humilhação das vítimas".
Exumação das vítimas
O Estado tem agora a obrigação de exumar, identificar e entregar os restos das vítimas às famílias, ao contrário do que acontecia na lei de memória histórica aprovada por Zapatero em 2007, onde o Estado apenas se encarregava de subsidiar as exumações a pedido das famílias.
O Governo vai levar a cabo um registo oficial das vítimas, que se vai transformar numa enorme base documental e um banco de ADN para armazenar o perfil das vítimas exumadas e facilitar a sua identificação.
Vale dos Caídos
O Vale dos Caídos, que já perdeu parte do seu significado com a exumação do ditador Franco, será um cemitério civil e um lugar de memória, uma espécie de museu dedicado a dar a conhecer as circunstâncias da sua construção e o seu significado.
A aprovação em Conselho de Ministros é o primeiro passo para a aprovação da lei, que terá ainda de passar pelo Congresso dos Deputados e pelo Senado antes da sua inclusão no Boletim Oficial do Estado.