A luta de classes no ensino superior

O estudo do Projeto EDULOG, da Fundação Belmiro de Azevedo, divulgado nos últimos dias, mereceu uma reflexão de Daniel Oliveira sobre o acesso, mais ou menos facilitado, a ferramentas que potenciam o rendimento escolar. De acordo com os dados obtidos, "os alunos de famílias mais favorecidas entram nos cursos de maior prestígio e com médias mais altas". Por seu lado, "os de famílias mais pobres vão para os politécnicos e para os cursos com médias mais baixas".

A explicação é muito simples para o jornalista. A diferença nos resultados académicos explica-se desta forma: "Porque ter livros em casa faz diferença. Porque ter explicações faz diferença. Porque o meio cultural onde se cresce faz diferença. Porque o dinheiro faz diferença."

"Até a inflação das notas nas escolas privadas, bastante comentada, faz diferença", aponta ainda o cronista, que frisa os 73% dos estudantes de medicina filhos de pais "que concluíram o ensino superior", ou a igual proporção de alunos de enfermagem que são "filhos de pais com o secundário, pelo menos".

O elevador social nem sempre é eficaz para desfazer as crenças enraizadas, denota o jornalista: "Mesmo quando há promoção social, a posição de subalternidade mantém-se."

"Alberto Amaral, coordenador deste estudo e presidente da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior, explica a coisa de forma crua: as classes mais baixas só podem tirar vantagem das oportunidades oferecidas pela expansão do sistema quando as necessidades das classes mais altas estiverem completamente satisfeitas", acrescenta.

Daniel Oliveira deixa, portanto, um apelo. "Podemos, e devemos, bater-nos pela democratização da escola. Podemos, e devemos, recusar esta ideia de que pode haver cursos, onde só se entra com médias de 17 ou 18, negando a possibilidade de, na própria especialização, os alunos continuarem a fazer um caminho que nunca começou no mesmo lugar", posiciona-se.

O jornalista rejeita, por isso, que se criem verdades alternativas só pelo conforto que estas possam oferecer. "Não devemos, nem podemos, ter ilusões: a escola não é uma ilha na sociedade. Se a sociedade é desigual, a escola reproduz a desigualdade", afiança.

"A escola, pública, universal, é o melhor instrumento para combater a desigualdade, mas nunca apagará um astro que vem de fora." Neste sentido, Daniel Oliveira salienta também que "é confortável pensar que a meritocracia é sabotada pela corrupção, pelo nepotismo ou pelo tráfico de influências, questões morais que travam o elevador social", mas que "até conta a rede de conhecimentos que o privilégio social oferece".

"É a desigualdade na distribuição de rendimentos que se traduz numa desigualdade de oportunidades e que torna a conversa da meritocracia numa treta." Uma treta que, diz, "culpa o de baixo pelo seu falhanço, e que convence os de cima de que o privilégio é um direito que conquistaram com o seu trabalho".

Para os políticos, fica também uma mensagem: "Quem quer discutir política sem discutir desigualdade está a perpetuar um jogo viciado."

"Podem dar a luta de classes como morta. Não é por isso que a luta entre classes deixa de fazer as suas vítimas", atira Daniel Oliveira.

* Texto de Catarina Maldonado Vasconcelos

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