O colapso dos três bancos norte-americanos Silvergate, Signature e Silicon Valley são o tema escolhido esta semana por Daniel Oliveira no seu habitual espaço de Opinião na TSF, mas o cronista começa por avisar que não irá descodificar o obscuro mundo da banca. Prefere uma "simplificação óbvia", explicando que o colapso é um dano colateral da subida rápida das taxas de juro.
"Simplificando, quando as taxas de juro sobem, os investimentos em obrigações feitos no passado e que estão em carteira perdem valor. As perdas não são imediatamente registadas no balanço. A desvalorização dessas obrigações só tem efeitos práticos se elas tiverem de ser vendidas para, por exemplo, garantir os levantamentos de depósitos. Se há uma corrida aos balcões, essas perdas revelam-se. Foi isso que aconteceu num banco especializado em startups tecnológicas", explica Daniel Oliveira.
Reconhece, no entanto, que não era fácil prever o maior aumento de taxas de juro dos últimos 40 anos em versão acelerada.
"Podemos dizer, portanto, que o Banco Central Europeu e a reserva norte-americana estão a ser bastante imprudentes ao aumentar os juros a este ritmo. Não falta quem o esteja a dizer, aliás, há algum tempo", afirma o jornalista.
Sem saber se estes bancos serão apenas as primeiras vítimas e se vai, ou não, haver contágio, Daniel Oliveira não tem dúvidas de que a queda de um banco com a dimensão do Credit Suisse seria, seguramente, "um tiro no porta-aviões".
"O governo suíço tentou travar a tragédia com a sua compra pelo banco UBS, mas os mercados não reagiram bem. Nos EUA as autoridades também foram rápidas a reagir. O Tesouro e a Reserva Federal anunciaram que iriam garantir os depósitos na íntegra, além do limite de 250 mil dólares segurados pelo Fundo de Garantia de Depósitos FDIC. Como não estou limitado por dogmas ideológicos contra a intervenção do Estado na economia e na finança - pode ser na banca, em companhia aéreas, casas devolutas e preço dos alimentos, desde que seja absolutamente necessário -, não tenho de fazer contorcionismo nos meus princípios. Cabe ao Estado garantir a confiança no sistema para que ele não colapse. Claro que, para isso, seria bom que começasse a regular a banca e não apenas a salvá-la, mas esse é outro debate", sublinha o cronista.
Para Daniel Oliveira, o senão destas ações é um risco moral que desresponsabiliza os depositantes de serem cautelosos, sabendo que o Estado, no fim," põe sempre a mão por baixo", transformando os contribuintes em "eternos fiadores".
"As duas novidades nesta intervenção é que a Reserva Federal fez saber que emprestará dinheiro aos bancos pressionados pela necessidade de devolver os depósitos que lhes foram confiados com taxas de juro baixas e que aceita como colateral, em troca desta cedência de liquidez, obrigações pelo seu valor original de compra não desvalorizada, como foi pela subida das taxas de juro. O mais interessante foi mesmo ver a Goldman Sachs a retirar publicamente o seu apelo para uma subida das taxas de juro por parte da Reserva Federal. Enquanto elas sobem desembestadas e rebentam com a economia e com a classe média ser afetar a banca, tudo bem. Não há alternativa como todas as receitas que nos impõem através do domínio que têm sobre bancos centrais falsamente independentes, mas quando belisca os que mandam, pede-se uma pausa", afirma.
Caso a crise alastre ao resto da banca, Daniel Oliveira acredita que será para parar o aumento das taxas de juro.
"Se, pelo contrário, o contágio tiver sido contido pela intervenção do soberano, é para voltar ao ritmo anterior porque, afinal de contas, é só a vida das pessoas que está a ir para o charco. Por agora, o Banco Central Europeu não está convencido. Se ainda não partiu, continuemos. Aprendemos com a crise de 2009 que as autoridades europeias são como São Tomé: só abandonam os seus dogmas quando o desastre é bem visível. Mais depressa exigirão nova austeridade aos Estados do que reconhecerão que a receita que impõem não está a resultar. Não que a senhora Lagarde tenha de se preocupar", considera Daniel Oliveira.
O cronista acredita que, quando tudo correr mal, os eleitores vão vingar-se nos respetivos governos e Lagarde continuará a confirmar que o "princípio de Peter está errado": "É possível continuar a progredir numa carreira muito para lá do limite da incompetência", remata.
*Texto redigido por Cátia Carmo