Daniel Oliveira admite manter "todas as dúvidas sobre excessos normativos para determinar a organização de debates televisivos entre candidaturas, não porque se deve deixar o mercado funcionar, mas porque o resultado tem sido o esvaziamento desses debates", e isto acontece: "ou porque são tantos que ninguém os vê, ou porque são irrealizáveis".
No seu espaço habitual de Opinião, na TSF, o cronista considera que, em campanha, já estes debates são irrealizáveis, e justifica: "Não se pode pôr mais de duas dezenas de líderes a debater; não esclarece nada nem ninguém. É um simulacro de debate que só pode resultar num simulacro de democracia."
"A ideia de que faz sentido pôr no mesmo saco organizações mortas, sem militantes ou eleitores, e partidos políticos com atividade quotidiana e representatividade social não defende a justiça eleitoral, destrata essa justiça", defende Daniel Oliveira. O jornalista analisa, assim, que, "ao exigirem-se debates impossíveis de organizar, só se conseguiu acabar com os debates durante a campanha, esvaziando-a de conteúdo".
É por estes motivos que o cronista não vê como tal tenha favorecido a democracia, antes pelo contrário. No entanto, Daniel Oliveira lembra que "a lei diz uma coisa que as televisões têm cumprido, mesmo com a multiplicação de partidos com assento parlamentar". O que a lei determina é que "os debates que se realizem na fase anterior à campanha, mas já depois de marcadas as eleições, devem ter em conta a representatividade política e social das candidaturas". Determina ainda que "essa representatividade existe se a candidatura tiver obtido representação nas últimas eleições para aquele órgão", acrescenta Daniel Oliveira, constatando, por isso, que "a lei foi pensada para um tempo em que havia quatro partidos e uma coligação no Parlamento". Hoje há nove. "Foi pensada para quando podia ser cumprida fazendo o debate a cinco, ou dez debates frente-a-frente. Não há debates de centros com nove participantes; são uma sucessão de pequenos direitos de antena onde cada um tenta dizer uma frase que entre nos resumos noticiosos."
A "atual fragmentação parlamentar" obriga a 36 debates, contabiliza o jornalista. "É um absurdo que ninguém vê, e em que ninguém quer participar", lamenta. "Para minorar os estragos, as televisões inventaram um novo critério: partidos que tenham perdido o seu deputado ficam de fora." Só que "nada na lei, que é bem explícita no critério para medir a representatividade das candidaturas - são os que tenham obtido representação nas últimas eleições -, permite esta leitura", esclarece o cronista, que faz ainda as contas aos debates assim poupados: são oito confrontos televisivos a menos.
O Livre é "o único dos partidos prejudicados por esta originalidade", e decidiu recorrer à Justiça. "Como a lei atribui a regulação deste conflito à Comissão Nacional de Eleições e à Entidade Reguladora para a Comunicação Social, é expectável que o tribunal atire a decisão para a CNE e para a ERC. Conhecendo o historial de decisões da CNE, tenho muito poucas dúvidas de que dará razão ao Livre."
Já no que diz respeito à ERC, é "irrelevante", aponta Daniel Oliveira. "As eleições autárquicas já lá vão e ainda não deliberou sobre a queixa contra o debate entre Medina e Moedas na TVI."
"Tenho, sobre a gestão que o Livre faz da sua vida interna e sobre a polémica que levou à perda da deputada única, muitas críticas a fazer", assume o cronista, que atira: "Não é por acaso que o Livre é o único partido dos que se estrearam em 2019 que não ambiciona um crescimento; é culpa sua. Todo o seu funcionamento interno, tributário de um populismo basista inconsequente, é feito para se autossabotar; só funciona quando não funciona, escolhendo Rui Tavares sempre que Rui Tavares se candidata a qualquer cargo."
Daniel Oliveira sustenta, contudo, que os dramas internos do Livre não são chamados quando o que está em causa é o respeito pelas leis eleitorais. "O CDS está à beira da extinção e participará, com todo o direito, nos debates, porque, até os eleitores voltarem a expressar a sua posição, vale o que teve em 2019. E o Livre, da última vez que foi a votos a legislativas, teve resultados semelhantes aos da Iniciativa Liberal e do Chega." Este partido tem, portanto, "todo o direito a estar nos debates", sublinha o jornalista.
O cronista contesta o "absurdo deste sistema de debates", e frisa que "a cegueira burocrática impôs o fim dos debates em campanha eleitoral, e esta lei, que não foi adaptada a uma nova realidade com muitos mais partidos no Parlamento, arrisca-se a fazer o mesmo aos debates antes da campanha".
"Por essa Europa fora, em países com grande tradição democrática, são os critérios editoriais a determinarem quem está nos debates. O PS e o PSD não valem o mesmo que a Iniciativa Liberal, e a Iniciativa Liberal não vale o mesmo que o PURP e o PPM. A própria natureza dos debates é diferente, conforme o peso de cada um." Por isso, Daniel Oliveira conclui que, "nesta justa exigência, estamos apenas a decidir quem participa em simulacros de debate político, e será provavelmente encontrado um arremedo de solução que não deixe o Livre completamente fora dos debates".
"O problema está na lei, e, se é para cumprir a lei, não há um partido a que ela não se aplique", finaliza.
* Texto redigido por Catarina Maldonado Vasconcelos