Um "otimista irritante" também tem períodos de azar. No caso de um otimista que é primeiro-ministro, será sempre difícil distinguir o que de menos bom resulta da falta de sorte ou da falta de pontaria nas escolhas. António Costa tem vivido os últimos meses mergulhado em sucessivos episódios que transmitem do Executivo uma imagem de desgaste e de fragilidade política. Até a remodelação ontem anunciada, e que estava a ser preparada há vários dias, acabou por parecer atabalhoada, na sequência de uma fuga de informação que obrigou a anunciar novos secretários de Estado em dois tempos diferentes.
António Mendonça Mendes é o nome mais sonante nas mudanças. Transita para adjunto do primeiro-ministro, assumindo um papel de coordenação política que, com o tempo, poderá ajudar a criar um escudo que trave muitos dos casos que constantemente expõem António Costa. Esta escolha nasce, no entanto, com uma fragilidade à partida: ao ganhar peso político, Mendonça Mendes passa a sentar-se nas reuniões do Conselho de Ministros, onde já está a irmã, Ana Catarina Mendes. Como secretário de Estado não intervém nem tem poder de voto, mas a mudança de estatuto não é de todo irrelevante e já deu munições a alguns partidos de oposição.
Além de duas transições de pasta, há quatro novas entradas no Governo. E Fernando Medina aproveita para reforçar o seu ministério: é criada a secretaria de Estado das Finanças, que não existia desde o Governo anterior. Quanto aos demitidos, os secretários de Estado da Economia e do Turismo, torna-se evidente que a desautorização pública do ministro da tutela, aquando do incidente da descida transversal do IRC, não foi ultrapassada. António Costa Silva exigiu constituir uma nova equipa.
Mais uma vez indiferente às análises e comentários na praça pública, António Costa recusa mexer em nomes desgastados por casos e polémicas. Sujeita-se à crítica de que não consegue recrutar personalidades fortes fora do círculo socialista, apesar do sinal dado com sangue novo nos escolhidos que sexta-feira tomam posse. E a dúvida é mesmo perceber se Mendonça Mendes terá capacidade para ultrapassar a evidente falta de interligação que tem minado este Governo.
Muitas destas questões só entusiasmam uma certa bolha mediática. Para os portugueses, interessa mais saber se a equipa governativa está a trabalhar, focada em dar resposta aos desafios de um ano que se afigura difícil. E capaz de aproveitar os milhões de Bruxelas, que correm o risco de escapar por incapacidade de execução. Pode prosseguir a especulação sobre as relações entre Belém e São Bento. Pode até dizer-se que o primeiro-ministro está cansado. Certo é que António Costa tem sete anos como chefe de Governo, mas soma 30 de vida política. Experiência não lhe falta e tentará transformar em oportunidade uma remodelação que sabe a pouco. Não será fácil antever uma crise que interrompa a legislatura.