Alma Viva, de Cristèle Alves Meira: "Não podia ser outro filme para começar"
Cinema

Alma Viva, de Cristèle Alves Meira: "Não podia ser outro filme para começar"

Emigrou com os pais para França na década de 1970, voltou sempre à aldeia, e é a luz das paisagens e das gentes transmontanas que a realizadora luso-francesa faz brilhar na primeira longa-metragem. Com Alma Viva, Cristèle Alves Meira conquistou já a nomeação de candidato português aos Óscares.

A estreia nas salas portuguesas revela o olhar de Cristèle e "a força de um território, que é a minha origem". Lua Michel, a protagonista, filha da realizadora, descreve os três meses de rodagem na aldeia do Vimioso, como uma pequena aventura: "Não era um trabalho, era um jogo para mim." Cristéle Alves Meira e Lua Michel, em entrevista à TSF.

"Mais tarde ou mais cedo, todas as mulheres independentes serão acusadas de bruxaria."

"Eu sou a Salomé, tenho de matar as galinhas." Eis como Lua Michel descreve o barulho da claquete e o sentido da palavra "Acção". Não é uma cena à toa, a que fica registada na memória da filha da realizadora, recordando um dos momentos em que a protagonista "possuída pela alma da avó, avança sozinha pelo filme, com olhos de fogo e desejo de vingança", contextualiza Cristèle Alves Meira, ao falar da relação entre uma avó e uma neta, personagens que sustentam toda a história de Alma Viva.

"O filme abre uma reflexão sobre a figura da bruxa. O que é que fez com que os homens inventassem essa figura e pusessem de lado as mulheres que saíam do destino que os homens ou a sociedade queriam para elas. A história recupera as memórias que permitem questionar a nossa herança e as nossas mentalidades."

Um filme feminista? "É um filme feminista porque tenho fascínio por todas essas mulheres que têm essa força, e podemos ver que esta avó assume a sensualidade e o esoterismo que passa para a neta através de um lado mais obscuro, um ritual, e a menina fica possuída pela alma dela. A família pesa, mas é uma herança de amor, todo o filme está construído na teia destas contradições."

"Os vivos fecham os olhos aos mortos e os mortos abrem os olhos aos vivos."

"O ponto de partida foi mesmo o momento da morte da minha avó que me fez sentir a necessidade de contar, mas depois o filme não é nada autobiográfico, mesmo tendo marcas como a casa dela, onde filmámos. Rapidamente percebi que a ficção era mais forte." A casa da avó, na aldeia da Junqueira, em Vimioso, é a porta de entrada para a história de uma família dividida entre os que ficaram e os que partiram, "um pouco excessiva, que se ama com palavrões, que está na margem, mas cuja riqueza e energia eu quis mostrar", explica a realizadora, "personagens com uma certa brutalidade, que possam dizer o que lhes vem à cabeça".

E a figura do tio Dantas, cego de nascença, surge inspirada no mensageiro das tragédias gregas, "o mais sensível, o mais forte, o mais inteligente da família, é também uma forma de eu ver o mundo, e rasgar preconceitos, porque essa pessoa que é cega, vê melhor do que os outros".

Ana Padrão, Jacqueline Corado, Ester Catalão, Arthur Brigas, Duarte Pina e Catherine Salée são alguns dos actores e actrizes profissionais e não profissionais do elenco, uma escolha da realizadora já experimentada nas curtas-metragens anteriores "Sol Branco" (2015), "Campo de Víboras" (2016), "Invisível Herói" (2019) e "TCHAUTCHAU" (2021): "Por enquanto é a minha receita, e trabalhar com esta composição permite-me ser mais autêntica. A Ana Padrão e a Jaqueline Corado tiveram muita paciência e deram muita confiança aos actores não profissionais, a força delas trouxe esse equilíbrio."

E Lua Michel? "Sou uma menina normal, que gosta de jogar e de cantar," e que gostou muito de comer as galinhas mortas que foram parar ao tacho, e servidas a todo o elenco.

Alma Viva estreia hoje nas salas de cinema portuguesas.

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