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A companhia de teatro Filandorra estreia, este sábado, no Centro Cultural de Vila Flor, no distrito de Bragança, uma versão arrojada de "O Velho da Horta". O texto de Gil Vicente tem mais de 500 anos, mas descreve situações que poderiam muito bem passar-se hoje. É o caso da paixão não correspondida do velho pela menina ou das burlonas que lhe prometeram vigor sexual e ainda o deixaram sem dinheiro.
A TSF assistiu ao ensaio de uma história que mete música pimba. "Ele planta os tomates, lá no seu quintal, depois rega o pepino sem nunca perder o tino, porque pode fazer mal"... Assim canta Belly Flor, personagem interpretada pela atriz Débora Ribeiro.
Ouça aqui a reportagem da TSF
A estrela do palco chega de França, onde está emigrada, para animar as aldeias com as suas canções populares. Belly Flor tem 20 anos e durante uma atuação desperta a atenção do velho Fenandeanes, que tem a alcunha "O da Bota", porque tinha a mania de calçar botas diferentes. "Ele apaixona-se fatalmente por esta jovem, que no início dá a entender que gosta do que ele lhe diz, mas depois vai-lhe dando para trás", resume Débora. A artista "acaba por ir embora com outro rapaz do conjunto musical e o velho fica sozinho, desolado, levando o público a imaginar o final, que pode ser trágico".
O velho Fenandeanes é interpretado pelo ator Silvano Magalhães. A alma é jovem, ao ponto de adquirir equipamentos tecnológicos da moda e de se deslocar em hoverboard (mecanismo com rodas e bateria elétrica) para todo o lado. O problema é que este "velho do século XXI" apaixona-se por uma jovem.
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"É um amor platónico, pois é praticamente impossível", salienta o ator. Apesar disso, recorre a duas mulheres "para o ajudarem com mezinhas a atrair a Belly Flor e recuperar a sua virilidade para a não desiludir". Porém, mais não consegue do que ser burlado, ao ponto de ficar sem as poupanças que guarda num tronco do jardim. "Mais uma vez acaba sozinho, sem a Belly Flor e sem dinheiro. É o fim, perde a vontade de viver", conclui Silvano.
Texto fiel ao original
A versão moderna de "O Velho da Horta" é encenada pelo diretor artístico da Filandorra, David Carvalho. Explica que é uma peça com cinco séculos, mas que está muito atual, pois "retrata o amor dos velhos por coisas viçosas". Mas, frisa, "estas paixões doem, não é?"
A peça foi adaptada para o público atual a entender à primeira, apesar de o texto ser fiel ao original de há 510 anos. "É uma forma de fazer um "Velho da Horta" divertido, mas que não perde valor intrínseco literário da memória cultural, que é a escrita dramática que Gil Vicente representou para o rei D. Manuel I", nota David Carvalho.
A residência artística da companhia e a estreia da peça em Vila Flor são apostas do presidente da Câmara, Pedro Lima, porque quer uma "vila feliz". O autarca explica que, desde que tomou posse do cargo, em outubro de 2021, o executivo que lidera começou a desenvolver o conceito. Este "conjuga a identidade Vila Flor com a Flor de Lis, símbolo do concelho". Ora, o conceito, sublinha o autarca, engloba "uma vida com cultura e, nomeadamente, com teatro".
O diretor da Filandorra, David Carvalho, refere que esta peça e a sua estreia em Vila Flor é a prova de que no interior se fazem trabalhos com dimensão nacional. "A cultura não é só de Lisboa e do Porto, é para todos, ricos e pobres, letrados e não letrados", vinca.
A 79.ª produção da Filandorra - Teatro do Nordeste, com sede em Vila Real, tem estreia nacional marcada para este sábado, às 21h30, no Auditório Adelina Campos do Centro Cultural de Vila Flor, concelho do distrito de Bragança. Depois, a nova versão de "O Velho de Horta", de Gil Vicente, há de ser levado a outros palcos nacionais e mesmo a largos de aldeias e vilas.
"O Velho da Horta" conta no elenco com os atores Anita Pizarro, Bibiana Mota, Débora Ribeiro, Helena Vital, Sofia Duarte, Bruno Teixeira, Luís Filipe e Silvano Magalhães. Tem a colaboração de estudantes do Curso de Teatro e Artes Performativas da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, que estão a realizar estágio profissional na Filandorra: Daniela Azevedo, Vera Rodrigues e Raquel Roque. A equipa artística inclui ainda Pedro Carlos (música/som) e Carlos Carvalho (Luz).
A nova produção conta com o apoio da Direção-Geral das Artes no âmbito do projeto "Reportórios, Territórios e Identidades".