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Marcelo Rebelo de Sousa vetou, esta quarta-feira, o diploma que altera a Lei do Cibercrime, depois do Tribunal Constitucional (TC) ter declarado há dois dias, por unanimidade, a inconstitucionalidade de normas que previam o acesso a e-mails sem ordem de um juiz.
"Na sequência do Acórdão do Tribunal Constitucional, que considerou inconstitucionais normas do diploma que submeteu a fiscalização preventiva da constitucionalidade, o Presidente da República devolveu à Assembleia da República, sem promulgação, nos termos do artigo 279.º, 1. da Constituição, o Decreto que alterou a Lei do Cibercrime (Decreto n.º 167/XIV, da Assembleia da República, na parte em que altera o artigo 17.º da Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro, conhecida como Lei do Cibercrime)", pode ler-se numa nota publicada no site oficial da Presidência da República.
Num comunicado lido pelo presidente do TC, João Caupers, os juízes entenderam que as normas resultariam numa "restrição dos direitos fundamentais à inviolabilidade da correspondência e das comunicações e à proteção dos dados pessoais no âmbito da utilização da informática, enquanto manifestações específicas do direito à reserva de intimidade da vida privada, em termos lesivos do princípio da personalidade".
Paralelamente, a decisão, elaborada pela conselheira Mariana Canotilho e tomada pelos sete juízes que integram o primeiro turno em período de férias judiciais, indicou ainda estar em causa uma "violação do princípio da reserva de juiz e das garantias constitucionais de defesa" na esfera do processo penal.
O diploma agora vetado teve como base uma proposta de lei do Governo, da qual resultou um texto final apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, aprovado em votação final global em 20 de julho, com votos a favor de PS, PSD, BE, PAN, PEV, Chega e das deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, com abstenções de PCP, CDS-PP e Iniciativa Liberal.
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No pedido de fiscalização preventiva que enviou ao Tribunal Constitucional, a 4 de agosto, o chefe de Estado assinalou que, além de proceder à transposição de uma diretiva europeia sobre combate à fraude e à contrafação de meios de pagamento que não em numerário, o legislador aproveitou para alterar também o artigo 17.º da Lei do Cibercrime.
O Presidente da República enquadrou a alteração a este artigo como "uma mudança substancial no paradigma de acesso ao conteúdo das comunicações eletrónicas", em que se admite "que esse acesso caiba, em primeira linha, ao Ministério Público, que só posteriormente o apresenta ao juiz".
Este é o terceiro diploma que Marcelo Rebelo de Sousa veta devido a inconstitucionalidades declaradas pelo Tribunal Constitucional.
Os anteriores vetos por inconstitucionalidades foram ao decreto do parlamento sobre a morte medicamente assistida, em março deste ano, e a alterações à lei da procriação medicamente assistida (PMA), em setembro de 2019, na sequência de acórdãos do Tribunal Constitucional em resposta a pedidos seus de fiscalização preventiva.