"Socialismo", "fascista" e "25 de Novembro": maioria rejeita mexer no preâmbulo da Constituição

Chega e Iniciativa Liberal ficaram isolados na defesa de mudanças no preâmbulo do texto constitucional e ouviram críticas de tentativas de "reescrever a história."

Tem o preâmbulo da Constituição um valor de lei? Ou serve apenas como uma espécie de prefácio que espelha a data em que foi escrito? A dúvida dividiu, por um lado, o Chega e a Iniciativa Liberal, que defendem mudanças para atualizar o preâmbulo, e todos os outros partidos que consideram que não devem existir alterações.

André Ventura, do Chega, defendeu que o texto deve ser neutro, deixando cair, por exemplo, a referência ao caminho para "uma sociedade socialista".

"Não faz nenhum sentido que uma Constituição plural e pluralista indique ao país o caminho que quer seguir, seja ele um caminho de socialismo, de liberalismo, de conservadorismo, ou de qualquer outro ismo que o partido que o país queira trilhar," considerou o líder do Chega, defendendo ainda uma alteração de regime "fascista" para "vigente," porque "o regime anterior não era um regime fascista era um regime totalitário e uma ditadura, mas que não se enquadra, do ponto de vista da sua categoria, naquilo que é a designação de fascismo."

Já a Iniciativa Liberal avançou com três alterações, nos cinco parágrafos, entre elas, a inclusão da expressão "democracia liberal" e da importância do 25 de Novembro, como lembrou João Cotrim de Figueiredo.

"Dias antes do 25 de Novembro, esta casa onde estamos hoje sentados, esteve cercada. Os deputados passaram cá a noite não podendo sair e tivesse tido sucesso esse movimento que então estava no seu auge, se não tivesse havido o 25 de Novembro, era muito pouco provável que tivéssemos chegado ao fim do processo constituinte e tivéssemos outorgado a Constituição de 1976." sublinhou o deputado liberal.

Mas o deputado e historiador Rui Tavares do Livre, registou que foi uma opção dos constituintes deixar de fora essa referência e, folheando uma edição miniatura da Constituição, imaginou uma versão alterada, nas mãos de uma criança.

"Aí, ele ou ela vai ler e diz: Ah! Então, mas em 2 de abril de 1976 diziam isto? Democracia liberal? Pensava que não era... O regime anterior não lhe chamavam fascismo? Nós não podemos falsificar um documento," conclui Rui Tavares.

Tanto o PS, como o PSD defendem que o preâmbulo é um texto "datado" e sem valor de lei e que "mais vale deixá-lo descansado", como considerou o deputado Pedro Delgado Alves.

"Não é um texto em que faça sentido abrir ou reabrir fraturas históricas que os decisores do passado tiveram o bom senso de deixar encerradas em determinado momento," avisou o socialista.

E o social-democrata André Coelho Lima, na mesma linha, acrescentou que "alterar um escrito de 1974 com terminologia de 2023 é tirar-lhe o sentido e para isso seria mais coerente propor a eliminação do preâmbulo."

"Se tivéssemos que adaptar, então hoje, como toda a gente diz que é social democrata, desde o Bloco de Esquerda, até ao próprio PS, ponhamos aqui "abrir o caminho para uma sociedade social democrata" e assim ficávamos todos ficamos todos satisfeitos, nós pelo menos ficaríamos," afirmou num tom bem-humorado.

À esquerda registou-se a total oposição a mudanças, como deixou claro, Alma Rivera do PCP ao defender que "não devemos ir por esse caminho, que de certa forma é o velho caminho do acerto de contas com a revolução de abril."

Já Pedro Filipe Soares, do Bloco de Esquerda, acusou o Chega de pretender "politicamente limpar a história, para ser ele próprio limpável."

Inês Sousa Real concorda que o preâmbulo não tem força jurídica, apesar de André Ventura ter invocado acórdãos do Tribunal Constitucional (TC), na década de oitenta, que o citavam e João Cotrim de Figueiredo sugeriu que, nesse caso, deveria ser clarificado o valor simbólico do preâmbulo, assegurando que não sirva para fundamentar futuras decisões do TC.

Este foi apenas o preâmbulo de uma maratona constitucional. Ao longo dos próximos meses, há 186 artigos e quase 400 propostas de alteração para analisar.

Mais Notícias

Outros Conteúdos GMG

Patrocinado

Apoio de