A fuga de João Rendeiro, uma "clara falha" da Justiça e o papel do Parlamento

Deve ser repensada a eficácia das leis e a forma como estão a ser aplicadas pelos tribunais? No Fórum TSF, debateu-se a credibilidade da Justiça, perante casos como o da fuga do ex-banqueiro João Rendeiro.

A juíza que condenou o ex-banqueiro João Rendeiro a dez anos de cadeia emitiu, esta quarta-feira, um despacho, com caráter de urgência, para a emissão de mandados internacionais de captura. O antigo presidente do Banco Privado Português (BPP) recusa-se a regressar a Portugal para comparecer em tribunal e encontra-se, nesta altura, em parte incerta.

O assunto subiu a debate, esta manhã, no Fórum TSF, com os intervenientes a discutirem como deve a Justiça proceder em casos deste género.

Ouvido no Fórum TSF, o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), Adão Carvalho, afirma que é preciso impedir que a sucessão de recursos judiciais, até chegar ao Tribunal Constitucional, impeça o cumprimento de penas.

Sem se referir em concreto ao caso de João Rendeiro, o procurador admitiu que são precisas mudanças na lei e que cabe aos deputados na Assembleia da República dar esse passo.

"Cabe ao Parlamento, que é a sede própria, decidir se, eventualmente, após uma decisão em primeira instância que condene um arguido a uma pena de prisão efetiva, se deverá, por exemplo, partir para o cumprimento antecipado de pena (como fazem alguns outros sistemas, em que o arguido passa imediatamente a cumprir pena, independentemente depois do resultado de um eventual recurso que venha a interpor) ou estabelecer como obrigatória a imposição desta medida de coação, designadamente a entrega do passaporte e a proibição de se ausentar do país logo após a decisão em primeira instância, ou, eventualmente, uma qualquer outra solução que seja no encontro deste equilíbrio entre aquilo que é a presunção da inocência e aquilo que são as exigências cautelares e aquilo que pode ser uma eventual tentativa de fuga à Justiça", indica Adão Carvalho.

Também sem querer comentar este caso em concreto, o bastonário da Ordem dos Advogados, Luís Menezes Leitão, lembra que a revisão periódica das medidas de coação já está prevista na lei e que poderia ter sido aplicada. Assim, poderia ter sido retirado o passaporte a João Rendeiro logo perante rumores sobre o perigo de fuga.

"Havia denúncias de risco de fuga. Ora, nestes casos, é necessário atuar. Se está previsto na lei que as medidas de coação devem ser reavaliadas, com certeza que essa reavaliação tem de ocorrer. E não há medida de coação mais simples e que não provoque nenhum dano ao arguido do que mandar entregar o passaporte", observa Menezes Leitão.

"Perante casos em que se colocam questões de decisões, pura e simplesmente não podemos dizer que não podemos alterar. Então porque é que está prevista a revisão periódica das medidas de coação?", questiona.

Também Susana Coroado, presidente da associação Transparência e Integridade, admite ter ficado surpreendida com a falta de ação da Justiça, tendo em conta os sinais de alarme.

"Fico surpreendida porque, na realidade, havia vários indícios de que isto podia acontecer. O BPP já tinha avisado os tribunais de que isto podia acontecer; Paulo Morais e João Paulo Batalha, antigos dirigentes da associação, também já tinham pedido esclarecimentos sobre esta matéria; João Rendeiro andava a passear-se, a ver até que ponto podia sair do país as vezes que quisesse sem o mínimo de controlo,... Portanto, houve aqui uma clara falha", declara Susana Coroado.

A dirigente da associação Transparência e Integridade lembra que o caso de João Rendeiro não é único e afirma que é urgente começar avaliações de risco ao comportamento de determinados arguidos.

O ex-banqueiro João Rendeiro já tinha sido condenado a cinco anos e oito meses de prisão num processo e, esta semana, foi condenado a mais três anos e seis meses de prisão por burla qualificada noutro caso. O antigo banqueiro afirma ter fugido "em legítima defesa" contra uma "Justiça injusta", e promete não se sujeitar sem resistência a decisões que considera uma "violência".

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