"Crimes hediondos." Ornelas quer abusadores a "assumir consequências" e promete "tolerância zero"

A comissão independente identificou 4815 vítimas e está a elaborar uma lista dos abusadores que ainda se encontram no ativo para ser entregue à Igreja e ao Ministério Público. Siga aqui.

PorTSF
© Reinaldo Rodrigues/Global Imagens (arquivo)

Discutir abusos na JMJ?

A investigadora Ana Nunes de Almeida diz-se "chocada" com as declarações do padre Filipe Diniz, responsável pela pastoral juvenil, que disse que o relatório sobre os abusos sexuais não deveria afetar a Jornada Mundial da Juventude (JMJ). Esse é precisamente o local para discutir estas questões, defende.

Pedro Strecht afirma que as vítimas esperavam um perdão dos abusadores - o que é difícil porque as pessoas com esse perfil não tomariam essa atitude - ou da igreja como um todo.

Nas suas recomendações para a Igreja, a comissão defende que a instituição devia pedir perdão e até pode ser um gesto simbólico. "Não é preciso um memorial de cinco milhões ou 30% menos", comenta Pedro Strecht, numa alusão ao altar-palco da Jornada Mundial da Juventude.

"Abusos de menores são crimes hediondos." D. José Ornelas pede "perdão a todas as vítimas"

Começando por saudar os órgãos de comunicação social, que considerou terem um papel "muito importante" no caso dos abusos sexuais na igreja, D. José Ornelas, presidente da Conferência Episcopal, reconheceu que as conclusões do relatório da comissão pôs a descoberto uma "dolorosa realidade".

"Houve e há vítimas de abuso sexual provocadas por clérigos e outros agentes pastorais. Estimando-se em cerca de 4815 vítimas de abusos desde 1915 até ao presente. Assinala ainda varias consequências desses crimes que podem estar na origem de sofrimentos incomensuráveis que marcaram vidas inteiras", afirmou.

Além disso, pediu, em nome da Igreja, perdão a todas as vítimas.

"Nas vossas vidas atravessou-se a perversidade, onde nunca deveria ter estado. Os abusos de menores são "crimes hediondos", quem os comete tem de assumir as consequências dos seus atos e responsabilidades civis, criminais e morais daí consequentes", sublinhou.

"Não antecipo cenários sem saber do que é que se está a tratar"

O bispo José Ornelas explica que é preciso "conhecer o relatório na íntegra" para perceber quais as consequências que devem ser aplicadas aos alegados abusadores.

"Se há uma denúncia, deve haver uma investigação e depois esses casos são enviados para a Santa Sé", afirma.

"Não temos acesso a casos individuais, não antecipo cenários sem saber do que é que se está a tratar", sublinha.

"Não é um processo acabado, é um processo iniciado", refere.

Casos de abusos sexuais "devem ser comunicados a quem toma decisões sobre eles"

José Ornelas refere que "não se sente alheado" a esta realidade de abusos sexuais na igreja. Contudo, "muitas coisas não me chegaram e deveriam ter chegado."

"Certamente, uma das indicações que será necessário dar é que casos destes devem ser comunicados a quem toma decisões sobre eles", afirma.

O presidente da Conferência Episcopal refere ainda que "a realidade dos seminários hoje é bastante diferente", sublinhando, no entanto, que "ainda há muito para fazer".

Pedido de perdão? "Não pode simplesmente ser uma questão de palavras"

José Ornelas diz que o pedido de perdão às vítimas "não pode simplesmente ser uma questão de palavras", avançando que estão já em estudo "várias ideias" para o fazer.

O presidente da Conferência Episcopal considera que estes são "momentos dolorosos mas também libertadores e é importante que passemos por isso".

O bispo Ornelas afirma que é preciso que as vítimas "tenham dignidade e que saibam que não foram elas as culpadas disto".

Denúncias anónimas não levarão a abertura de processos

O bispo afirmou que, depois de consultarem a lista da comissão, o processo seguirá protocolos próprios. Lembrou também que a maioria das denúncias são anónimas e, por isso, não vão levar a abertura de processos.

"Cada caso é um caso. Isto não é uma lista de acusados, é uma lista de depoimentos. Alguns são denúncias anónimas. Não se identificando, não pode haver processo. Isso tem as suas normas", acrescentou José Ornelas.

Abusos sexuais debatidos na JMJ? "Não se faz nenhum evento sem que esta dimensão esteja presente"

O presidente da Conferência Episcopal não tem dúvidas de que o assunto estará presente na Jornada Mundial da Juventude.

"Não vivo para a imagem, para fazer um teatrinho não me punha com este trabalho todo. Isto cai como uma nódoa em pano limpo. Somos uma igreja que cometeu, comete e cometerá erros", assumiu José Ornelas.

"Há processos que têm de ser revistos"

O presidente da Conferência Episcopal adianta que aquilo que a Comissão Independente fez "não foi só identificar casos, foi rever processos".

"Há processos que têm de ser revistos", reforça José Ornelas.

"Já temos algo feito no terreno a funcionar, que é uma estrutura para toda a igreja. Isso vai continuar", garante.

"Abusadores de menores não podem ter cargos dentro do ministério"

José Ornelas recordou o que o Papa já tinha dito: "Abusadores de menores não podem ter cargos dentro do ministério." Se for provado que algum membro do clero é abusador, essa pessoa não terá lugar na igreja. Mas ainda não têm a lista de suspeitos.

"Não temos ainda essa lista, havemos de recebê-la e tratá-la convenientemente. Esses processos são tratados na via própria, com os princípios legais portugueses. Temos um processo na igreja, com uma investigação prévia para saber a plausividade. Uma vez que seja possível que isso tenha acontecido, tem de ser comunicado à santa sé e de lá virão as indicações e instauração de um processo, que não é assim tão demorado", sublinhou.

Conferência Episcopal investiu cerca de "200 mil euros" na comissão independente

O presidente da Conferência Episcopal revelou que tinham estimado investir cerca de "200 mil euros" na comissão independente.

"É natural que isso possa subir ou descer, não sei. Posso garantir que não faltámos à comissão com aquilo que era necessário. Isso está claro para todos. Nestas coisas vale bem a pena gastar uns tostões. É uma realidade que nos penaliza, não é fácil tratá-la, mas não podemos deixá-la como está, não nos resignamos nunca a isso", afirmou José Ornelas.

Questionado sobre se vão prolongar a comissão, o bispo respondeu que a Conferência Episcopal tem feito um caminho colegial e que tudo isso será certamente analisado.

"Uma coisa é certa: temos no terreno comissões diocesanas. Esta comissão tinha uma tarefa específica, que termina agora a sua função, mas não se esgota aqui. Há outras instituições do país com as quais vamos ter também de trabalhar em parceria", acrescentou José Ornelas.

Conferência Episcopal terá assembleia plenária extraordinária a 3 de março para debater relatório

D. José Ornelas anunciou que a Conferência Episcopal vai organizar uma assembleia plenária extraordinária, dia 3 de março, para debater as conclusões do relatório divulgado esta segunda-feira, nomeadamente as recomendações que contém para a igreja e toda a sociedade.

Deixou também um agradecimento a Pedro Strecht, que aceitou o desafio para coordenar o estudo.

"Agradeço o trabalho desenvolvido ao longo do último ano. Permitiram que chegassemos hoje a um conhecimento mais concreto da verdade histórica dos abusos sexuais de menores no seio da igreja em Portugal. Procurámos assegurar todas as condições materiais e disponibilizámos todos os meios para que o trabalho decorresse em confirmidade com as necessidades da comissão independente", afirmou o presidente da Conferência Episcopal.

D. José Ornelas reage ao relatório da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica.

“Não podemos de repente querer condenar pessoas num momento em que cai no domínio da prescrição. Não pode ser”, reforça o juiz-conselheiro jubilado Álvaro Laborinho Lúcio.

“Se enviássemos os 512 casos para o Ministério Público fazíamos um figurão”, já que depois teria de ser o MP que teria de assumir que não foi possível levar a investigação avante na grande maioria dos casos.

É a sociedade e a legislação que tem de mudar, considera.

Maioria das vítimas dizem que "não há reparação possível", mas esperam pedido de desculpa

Álvaro Laborinho Lúcio diz que poderá ser criada outra comissão no interior da igreja, constituída por membros exteriores à igreja, para "receber queixas, propor indemnizações ou ações a desenvolver junto dos eclesiásticos".

Pedro Strecht adianta que a maior parte das vítimas que contactou a comissão "dizem que não há reparação possível". "A grande maioria espera um pedido de desculpa ou perdão do abusador em si ou da instituição como um todo."

Apelo aos bispos e sacerdotes: "Que tomem a palavra"

A investigadora Ana Nunes de Almeida faz um apelo aos bispos e sacerdotes: "Que tomem a palavra para falar deste problema."

Já Daniel Sampaio pede que a Igreja "assuma o tratamento psicológico das vítimas", através de uma articulação com o SNS.

Nenhuma vítima pediu indemnização

Pedro Strecht afirma que nenhuma vítima pediu indemnização, "mas estão no seu direito". "Muitas vítimas revelaram necessidade de continuidade do apoio psicológico."

"Extinguimo-nos hoje, mas pode ser criada outra comissão capaz de recolher mais dados, para continuar a debater o assunto e articular estes casos com a Igreja Católica", refere o coordenador.

Pedro Strecht refere que em muitas épocas, "ir para o seminário era uma hipótese de estudar e ter uma casa".

Sobre os alegados abusadores que ainda estão no ativo, Pedro Strecht diz que "não chega retiros espirituais". "Não há milagres, por mim afastava-os."

Condenações serão muito difíceis

“Não podemos esperar grande resultados do ponto de vista da punição criminal”, já que a grande maioria dos casos prescreveu, reconhece Álvaro Laborinho Lúcio.

Dos 25 casos enviados ao Ministério Público, “presumimos que algumas acusações foram formuladas”, ainda que o mais provável é que faltem provas para levar a julgamento todos os casos.

"Vai ser desprezível o número de condenados."

Comissão elabora lista de abusadores no ativo

Há três tipos de casos, entre os 25 enviados para o Ministério Público, aponta Álvaro Laborinho Lúcio: alguns serão muito simples de investigar e condenar, outros serão mais complexos, outros serão praticamente impossíveis de fechar.

Além disso, comissão independente está a elaborar uma lista dos abusadores que ainda se encontram no ativo que será entregue à Igreja e ao Ministério Público.

Há quem queira manter "cultura de ocultação"

“Houve evidentemente ocultação destes abusos sexuais”, acrescenta juiz-conselheiro jubilado Álvaro Laborinho Lúcio. Acreditamos que se iniciou um “caminho de desocultação”, que a Igreja também está disponível para trilhar.

Não interessa saber quem foi o elemento concreto que ocultou, o que interessa é a “atitude global” da própria Igreja, defende. Não temos interesse em que as pessoas possam ir atrás “de meia dúzia de ocultadores” e esquecer a prática global.

À época, a ocultação era um ato generalizado. Atualmente, pode haver desejo de voltar a essa "cultura de ocultação" por parte de vários membros da Igreja, mas genericamente a instituilção está aberta ao apuramento da verdade, considera.

Denúncias podem ter sido apagadas dos arquivos

Em resposta às questões dos jornalistas, Pedro Strecht garante que não existe nos arquivos indicação de casos que tenham sido denunciados à hierarquia. Podem nunca ter sido transmitidos, mas também ter sido destruídos, admite.

Sobre a eventual condenação dos agressores, Pedro Strecht lembra que esse papel cabe às autoridades. “Passamos a bola à justiça e isso tem muito que se lhe diga”.

Recomendações para a sociedade civil

- Realização de um estudo nacional sobre abusos sexuais de crianças nos seus vários espaços de socialização;

- Reconhecimento inequívoco dos Direitos da Criança;

- Empoderamento das crianças e famílias sobre o tema: o papel da Escola;

- Aumento da idade da vítima para efeitos de prescrição de crimes;

- Celeridade da avaliação e resposta do sistema de justiça;

- Reforço do papel da comunicação social na investigação e tratamento do tema;

- Aumento da literacia emocional sobre as verdadeiras necessidades do desenvolvimento infantojuvenil, sobretudo no campo afetivo e sexual.

Recomendações para a Igreja

No relatório final, a Comissão independente deixa uma série de recomendações à Igreja:

Criação de uma nova Comissão para continuidade do estudo e acompanhamento do tema (multidisciplinar, membros internos e externos à Igreja);

- Reconhecimento, pela Igreja, da existência e extensão do problema e compromisso na sua adequada prevenção futura;

- Cumprimento do conceito de “tolerância zero” proposto pelo Papa Francisco;

- Dever moral de denúncia, por parte da Igreja, e colaboração com o Ministério Público em casos de alegados crimes de abuso sexual;

- Pedido efetivo de perdão sobre as situações que aconteceram no passado e sua materialização;

- Formação e supervisão continuada e externa de membros da Igreja, nomeadamente na área da sexualidade (sua e das crianças e adolescentes);

- Cessação de espaços físicos fechados, individuais, enquanto locais de encontro e prática religiosa;

- Medidas preventivas eficazes, incluindo “manuais de boas práticas” e “locais de apoio ao testemunho e acompanhamento das vítimas e familiares”;

- Apoio psicológico continuado às vítimas do passado, atuais e futuras (responsabilidade da Igreja e articulação com o Serviço Nacional de Saúde).

"Verdadeiro sismo dentro da igreja." Relatório sobre abusos sexuais na igreja é "uma tragédia"

"Desolado", o padre Anselmo Borges considera que o relatório apresentado, esta segunda-feira, pela Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica "é uma tragédia".

"Como é que é possível na igreja ter acontecido tudo isto, nomeadamente, com padres, com o chamado clero?", questiona Anselmo Borges, em declarações à TSF, considerando que "é preciso renovar completamente a igreja".

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Bispo José Ornelas fala "numa situação dramática"

O presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, José Ornelas, conclui que o relatório da comissão independente que investigou os abusos sexuais retrata "uma situação dramática".

"Depois disto, uma lembrança para as vítimas, que foi por elas que fizemos tudo isto", agradecendo o trabalho da comissão.

Ornelas não se quis alongar e responder às perguntas do jornalistas, dizendo que a Conferência Episcopal Portuguesa irá agora analisar o relatório entregue pela comissão. Esta tarde, irá anunciar em conferência de imprensa as conclusões dessa análise.

Um apelo: "Falem, falem. Pela verdade"

“Chegamos ao fim deste longo e doloroso trabalho com a sensação do dever cumprido, mas também com a ideia certa que este não é bem um final. Mesmo tendo sido aberto algumas portas” que contribuam para a abertura em relação ao tema dos abusos sexuais de crianças no seu todo, conclui Pedro Strecht. “Este trabalho apenas deitou à terra pequenas sementes que, espero que germinem.”

“A noite abriu os meus olhos”, como escreveu Tolentino Mendonça. “E os nossos também”. “A dor da verdade doi, mas só ela liberta”, reforça Pedro Strecht, com um apelo: “falem, falem, vamos juntos pela verdade”.

É relatado um caso específico de um padre condenado num país estrangeiro por abuso sexual de menores, afastado da diocese, obrigado a indminizar as vítimas, sujeito a terapias para pedófilos e proibido de exercer, mas que pode "refazer" sua vida em Portugal e voltar a conduzir uma paróquia sem quaisquer constrangimentos.

As vítimas contam como os agressores forçavam os abusos sob a forma de ordens e regras a que as vítimas não podiam fugir. Depois, era-lhes exigido segredo, com chantagens caso contassem e até ameaças de morte.

Outros agiam como se tudo fosse normal, contando com a complacência da família. E outros ainda elogiavam o ato como algo positivo - "Deus está orgulhoso de ti".

Apenas uma minoria da amostra refere recompensas ou castigos associados ao crime. Alguns recebiam "uns dinheiritos" (a pobreza era muita), doces, artigos religiosos.

"Apenas uma parte residual dos testemunhos demonstra algum tipo de arrependimento ou pedido de desculpa por parte da pessoa abusadora", e mesmo nesses casos as justificações apresentadas imputavam a culpa às criança, pela "tentação" ou sentimentos que despertavam.

A patologia clínica mais associada ao abuso sexual é "stress pós-traumático", diz Daniel Sampaio, que enumera muitos dos problemas de saúde identificados em vítimas de abusos durante a infância, desde ansiedade, depressão, entre outros.

"Há uma correlação com o abuso de álcool, drogas e esquizofrenia", sublinha.

Numa análise ao perfil dos abusadores, Daniel Sampaio explica que "a maioria destas pessoas não tem capacidade de controlar os seus impulsos".

Daniel Sampaio termina a intervenção, defendendo que o tratamento mais importante é ter uma justiça célere e eficaz.

"A ideia de que nós precisamos de uma denúncia destas situações para que a justiça possa atuar é fundamental. É importante que a justiça funcione."

"Para estas pessoas pessoas, não basta o acompanhamento espiritual. Obviamente que o acompanhamento espiritual é fundamental no seio da igreja, mas estas pessoas têm de ser tratadas do ponto de vista psiquiátrico e psicológico", conclui Daniel Sampaio.

O psiquiatra Daniel Sampaio, membro da comissão independente, revela que os resultados da análise aos estudos independentes sobre o abuso sexual mostram que há uma prevalência de casos, não só no seio da igreja católica, mas também no resto da sociedade.

O especialista sublinha que os números são muito inquietantes", afirmando que a prevalência é maior contra raparigas do que com rapazes. Já a grande maioria dos abusadores, mais de 80%, são homens.

"É um alerta para realizarmos um estudo a nível nacional", sugere.

Há casos em todos os distritos (sobretudo Lisboa, Porto, Braga, Santarém e Leiria), a maioria das vítimas são homens (52,7%), enquanto 47,2% são mulheres.

A idade média das vítimas é atualmente de 52 anos, mais baixa do nos outros países onde decorrem investigações aos abusos sexuais na Igreja. Seriam alunos do primeiro ou segundo ciclos quando foram alvo de abusos sexuais. 20,2% das pessoas que denunciaram abusos têm menos de 40 anos de idade.

Dos abusados, 53% continuam a afirmar-se católicos e 25,8% são católicos praticantes.

A percentagem de licenciados é de 32,4%.

A maior parte dos abusos aconteceu quando as vítimas tinham entre 10 e 14 anos de idade (a média foi de 11,2 anos).

Quase 60% dos abusos aconteceram nas décadas de 60, 70 e 80, aponta Ana Nunes de Almeida, podendo concluir-se que o 25 de Abril "não teve impacto nenhum".

Há um pico de abusos nos anos 60.

As maioria das vítimas nunca contou a ninguém o que sofreu - 48% só falam sobre o abuso pela primeira vez com comissão independente.

Entre as que contaram, as vítimas do sexo masculino confidenciaram os abusos aos cônjuges ou amigos, enquanto as vítimas do sexo feminino contaram à mãe. Dessas, 56,2% dizem que acreditaram no seu relato.

77% nunca apresentou queixa à Igreja quando o abuso aconteceu e apenas em 4% dos casos houve queixa às autoridades.

Mais de 27% dos casos de abusos sexuais ligados à Igreja católica ocorreram durante períodos superiores a um ano.

O que levou as vítimas a denunciar o seu caso, tanto tempo depois de o abuso ocorrer?

A criação desta comissão independente é, segundo os relatos, o principal motivo, mas também as notícias sobre as denúncias noutros países, perceber que não era a única vítima, para ajudar os outros, “um imperativo ético”, a morte da pessoa abusadora ou de um membro da família.

As vítimas sofreram depressão, perturbações de ansiedade e humor, stress pós-traumático, complexos de culpa e pecado, complexos de inferioridade, medos de perda de identidade masculina, sentimentos de medo, culpa, e humilhação, culpabilidade em relação ao sexo, inúmeros problemas nas suas relações pessoais, ódio em relação à Igreja e a pessoas a ela ligadas.

Outras reportaram lesões físicas, que esconderam.

Pelo menos sete vítimas de abusos sexuais cometeram suicídio.

Identificadas 4815 vítimas

Foram recebidos 564 denúncias no total, resultando em 512 testemunhos validados, revela Pedro Strecht, um número maior do que o obtido nas comissões de outros países, considerando o tempo de estudo.

Com estas denúncias foi possível identificar "um número mínimo" de 4815 vítimas.

Não é possível quantificar a quantidade dos crimes "porque a maioria das crianças foi abusada mais do que uma vez" (52,7%).

“Por detrás de cada número há uma vida e uma experiência concreta.” A comissão independente revela agora testemunhos reais de abusos sexuais, avisando que serão relatos chocantes.

As vítimas de abuso por membros da igreja sofreram as agressões em vários espaços sociais, sobretudo em colégios católicos, seminários, na catequese e até em confessionários, revelam os responsáveis.

Os locais onde decorriam estes abusos eram, por ordem de prevalência: seminários, colégios internos geridos pela Igreja, confessionários, sacristias, casas do pároco. Nos anos 90 há relatos também de agressões sexuais em agrupamento de escuteiuros.

Os agressores na grande maioria (96%) do sexo masculino e 77% padres.

O juiz-conselheiro jubilado Álvaro Laborinho Lúcio lembra que o abuso sexual sobre crianças tem "um efeito absolutamente nefasto" no seu desenvolvimento.

Independentemente do enquaddramento jurídico, existe sobre os membros do clero um "dever moral" de denúncia deste tipo de crimes, apela.

Álvaro Laborinho Lúcio sugere ainda alteração à lei da prescrição dos crimes de abuso sexual, considerando que só devem prescrever depois de vítimas fazerem 30 anos.

Filipe Tavares, assistente social e membro da comissão indepentende, explica a metodologia usada para a recolha de informação.

25 casos enviados para o MP

Foram enviados para o Ministério Público 25 casos, uma vez que a maioria já prescreveu ou está sujeito a anonimato.

Pedro Strecht lê algumas transcirições de denúncias de vítimas, que relatam como decorriam os abusos e como o trauma dos abusos sexuais afetaram o resto da sua vida.

O coordenador da comissão independente, Pedro Strecht, começa a apresentação do relatório com uma palavra de agradecimento às vítimas que quiseram "dar voz ao seu silêncio".

O pedopsiquiatra cita algumas frases das vítimas que quiseram denunciar os abusos.

Ao lado do coordenador, estão os restantes membros desta comissão criada pela conferência Episcopal Portuguesa.

Prejuízo para Igreja com caso dos abusos "não se compara com sofrimento" das vítimas

O bispo auxiliar de Lisboa afirmou este domingo que o "prejuízo colateral" da Igreja portuguesa com as revelações dos abusos sexuais "não se compara com o sofrimento" de uma pessoa que tenha sido abusada.

Na véspera da apresentação do relatório da comissão independente que investigou os abusos sexuais na Igreja Católica em Portugal, Américo Aguiar disse que "a dor não prescreve".

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A Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica divulga esta manhã as conclusões do trabalho realizado ao longo de 2022 e que resultou na recolha de centenas de testemunhos de vítimas. Acompanhe aqui ao minuto.

Centenas de denúncias

O relatório da Comissão Independente começou a ganhar corpo a partir de 11 de janeiro do ano passado, quando começou a receber testemunhos, e em menos de uma semana foram validadas 102 denúncias.

Sem querer adiantar números finais até à apresentação do relatório final, a Comissão Independente divulgou no seu último balanço público, em outubro, que já tinha registado 424 testemunhos validados, compreendendo casos de abusos ocorridos desde 1950 e vítimas entre os 15 e os 88 anos.

Conferência Episcopal recebeu relatório final

O relatório já é do conhecimento da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), que recebeu no domingo o documento da parte da Comissão Independente, coordenada pelo pedopsiquiatra Pedro Strecht.

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O relatório da Comissão Independente começou a ganhar corpo a partir de 11 de janeiro do ano passado, quando começou a receber testemunhos, e em menos de uma semana foram validadas 102 denúncias.

Os membros da comissão esclareceram logo à partida que não estava em causa uma investigação criminal, mas adiantaram que as denúncias de crimes que não tivessem prescrito seriam encaminhadas para a Justiça, o que veio a confirmar-se até junho com o envio de 17 denúncias para o Ministério Público (MP), mas em outubro foi assumido pela Procuradoria-Geral da República que dos 10 inquéritos instaurados, mais de metade (seis) já tinha sido arquivada.

Liderada pelo pedopsiquiatra Pedro Strecht, a comissão independente é ainda constituída pelo psiquiatra Daniel Sampaio, pelo antigo ministro da Justiça e juiz conselheiro jubilado Álvaro Laborinho Lúcio, pela socióloga e investigadora Ana Nunes de Almeida, pela assistente social e terapeuta familiar Filipa Tavares e pela cineasta Catarina Vasconcelos.

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