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Logo no início do Relatório de Contas de 2017, o Conselho de Administração (presidido por José Berardo) agradece ao fundador (José Berardo) "pelo inestimável apoio que prestou à Fundação".
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Alegadamente, refere-se a adiantamentos que Berardo-empresário prestou a Berardo-fundador, no valor de quase 6 milhões de euros ao longo desse ano. Assim, Berardo-fundador agradece a Berado-empresário a "não cobrança de juros" por este adiantamento.
Apesar do tom animado da abertura, as conclusões são mais sombrias. À semelhança do que tem vindo a acontecer nos últimos anos, segundo os relatórios a que a TSF teve acesso, em 2017 as contas também foram aprovadas com reservas. A diferença é que os reparos são mais sérios que nunca.
A jornalista Dora Pires analisou o relatório de contas da Fundação José Berardo
Fundação em risco
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Grosso modo, é apresentado um gasto de cerca de um milhão de euros em despesas com o objetivo social da instituição, mas também há um passivo de 998.561.693,39 euros (quase mil milhões de euros). Muito perto do valor que a Caixa Geral de Depósitos, o Novo Banco e o BCP tentam, pela via judicial, recuperar em dívidas da Fundação José Berardo, mas também da Metalgest - uma sociedade gestora de participações sociais, com sede na Zona Franca da Madeira, que é em quase 50% detida pela Fundação José Berardo.
No emaranhado de empresas, associações e fundações por onde José Berardo move o seu capital e os seus investimentos há décadas, é difícil perceber onde acabam uns e começam outros.

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Quem perde
O problema não será tanto o valor do passivo - que até já tinha ultrapassado o atual montante em 2016 -, mas o facto de, segundo os revisores oficiais de contas, a Fundação "ter, nos últimos anos, acumulado prejuízos significativos".

O empresário Joe Berardo durante a audição perante a II Comissão Parlamentar de Inquérito à Recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e à Gestão do Banco, na Assembleia da República, em Lisboa, a 10 de maio de 2019
© António Cotrim/Lusa
E há mais: "a Fundação encontra-se numa situação de incumprimento perante as instituições financeiras" que, em 2017, ultrapassava já os 800 milhões de euros. O documento refere negociações em curso, que entretanto não avançaram, e conclui que "a continuidade das operações (da Fundação) está dependente de apoio financeiro do fundador."
Ou seja: se José Berardo não colocar mais dinheiro na fundação, esta deixa de ter meios para cumprir os seus objetivos - tanto os de financiamento da família, como os de solidariedade social. Certo é que, apesar de se saber ainda muito pouco sobre os negócios da Fundação, sabe-se muito menos sobre a atividade de cariz social que esta alegadamente desempenha.
Tudo indica que os bancos não conseguirão recuperar um cêntimo. A única hipótese parece estar, de facto, nas obras de arte à guarda do Centro Cultural de Belém - mas isso é outra história e outra Fundação. É já caso para a Fundação Coleção Berardo que, por sinal, tem José Berardo como Presidente Honorário vitalício, mas também como Presidente do Conselho de Administração e Presidente do Conselho de Curadores.