- Comentar
"Bem-vindos a bordo ao NRP Sagres, o navio mais antigo ao serviço da Marinha Portuguesa. Faz hoje 60 anos que aqui foi içada, pela primeira vez, a bandeira nacional." É o primeiro-tenente Martins Morgado quem recebe os visitantes que, esta terça-feira, chegam no navio, para o Dia da Defesa Nacional. Muitos não saberão que estão perante uma relíquia histórica, um tesouro da Alemanha nazi de Hitler, que acabou nas mãos de Portugal.
Relacionados
A rádio dos espiões que viveu em Portugal durante quase meio século
Ouça aqui a reportagem no Navio-escola Sagres. Sonoplastia de Pedro Picoto
Construído em 1937, em estaleiros de Hamburgo, o navio era uma de quatro embarcações encomendadas pela Marinha Alemã. Com a derrota de Hitler na Segunda Guerra Mundial, as posses da Alemanha foram distribuídas pelos vencedores. Inicialmente, foram os Estados Unidos a ficar com o navio, mas, não encontrando uma instituição que pudesse abarcá-lo, acabou por ser cedido ao Brasil, como forma de reparação pelos danos causados pelos submarinos alemães aos navios brasileiros durante a guerra. Só depois foi comprado por Portugal, para substituir o anterior navio Sagres - que, curiosamente, também tinha sido uma "herança" da derrota da Alemanha na Primeira Guerra Mundial.
"Nós conseguimos comprar esta beleza por cerca de cem mil dólares", nota o primeiro-tenente Martins Morgado. "Os brasileiros agora estão um bocadinho tristes, mas, enfim, negócio é negócio."
Desde então, a Sagres tem cumprido a tarefa de formar os futuros navegadores portugueses. O comandante Mário Fonte Domingues, capitão do navio-escola, sublinha que "para se fazer um bom marinheiro é preciso muito tempo no mar", uma "tarimba" que tem de ser dada "nos primeiros anos da Escola Naval, onde se potencia a prática da navegação astronómica". Para isso, sublinha o capitão, a Sagres é, o navio-escola ideal, "uma vez que faz travessias oceânicas, a uma baixa velocidade, e essa permanência prolongada no mar ajuda à formação do espírito do marinheiro".
Subscrever newsletter
Subscreva a nossa newsletter e tenha as notícias no seu e-mail todos os dias
O primeiro-tenente Martins Morgado refere que o navio é capaz de embarcar "todo o curso de cadetes, à volta de 60 pessoas, incluindo cadetes femininos, com as suas próprias instalações". "Conseguimos pô-los todos juntos, num espaço confinado, com algumas exigências operacionais, mas também longe da família, no mar, focados", indica.
Em tempos, um desses jovens cadetes foi o atual capitão do navio. Mário Fonte Domingues recorda o período de aprendiz no navio-escola como uma experiência "fantástica".
"O navio fez uma ida ao Japão, uma viagem de nove meses. Os cadetes tiveram a felicidade de fazer um troço icónico da nossa expansão marítima. É um deslumbramento absoluto. Foi uma viagem que me marcou e, a partir daí, fiquei apaixonado pela Sagres", confessa o comandante.
Nestes 85 anos de existência, o navio já leva um tempo total de 7.237 dias de missão, o equivalente a quase 20 anos consecutivos. Só nas 60 décadas de bandeira portuguesa, navegou 664.722 milhas, o mesmo que mais de 25 voltas ao mundo, tendo visitado 564 portos e fundeadouros estrangeiros, contando atualmente com uma guarnição de 103 militares.
Por agora, a Sagres está na Base Naval de Lisboa, a fazer manutenção. Se tudo correr bem, volta a alto-mar dentro de alguns meses, numa viagem até ao Brasil, para assinalar o bicentenário da independência do país.