Instituto Goethe vai mapear as marcas do colonialismo

Da Casa dos Estudantes do Império ao Padrão dos Descobrimentos. Marcas mais ou menos visíveis da história colonial no espaço urbano que vão ser assinaladas e contextualizadas no projeto ReMapping Memories Lisboa - Hamburgo promovido pelo instituto alemão. Para refletir sem apagar a história.

ReMapping Memories Lisboa - Hamburgo é lançado hoje com um ciclo de debates e nos próximos dois anos vai reunir reportagens, testemunhos, imagens de arquivo e imagens de hoje que vão ficar guardadas num site que vai ser lançado em data ainda a determinar.

Porquê Lisboa e Hamburgo? Porque são duas cidades portuárias com um passado colonial e o projeto quer fazer pontes. O objetivo é identificar lugares com ligação ao colonialismo, provocar o debate e a reflexão num exercício de democracia madura.

Em Lisboa, o projeto é coordenado pela editora e investigadora Marta Lança que explica que foi pedido o contributo a pessoas de várias áreas. "Muita gente que já pensa Lisboa da perspetiva das ciências sociais ou da literatura, várias linguagens e formatos sobre os lugares", explica. "Essa ideia de lugar da memória não é necessariamente um lugar que seja muito óbvio, há também lugares que mostram as várias fases da relação colonial na cidade, daquilo que ficou visível e também daquilo que foi omisso na história pública, naquilo que está nas marcas do tecido urbano."

O Padrão dos Descobrimentos é um dos lugares da história colonial da cidade de Lisboa já assinalados no mapa da geografia colonial, mas há exemplos menos óbvios.

"A Casa dos Estudantes do Império que é um marco da luta anticolonial dos anos 50 e 60 em Lisboa, já não existem muito vestígios do que era a casa, das sessões de poesia, de toda a conspiração independentista que existiu ali e das figuras africanas que por lá passaram, mas é um marco", sublinha Marta Lança que fala também da própria toponímia da cidade. "Que figuras foram heroificadas e, algumas, até praticaram atos bem violentos de ocupação das colónias e ainda são vistos como heróis. Ainda temos toda uma toponímia desde os navegadores aos militares das campanhas de pacificação da ocupação do início do século XX."

Com ReMapping Memories Lisboa - Hamburgo, o que se quer é recuperar lugares de memória, inscrever algumas histórias invisibilizadas e lembrar a violência do passado colonial e esclavagista. "E pretende-se assim contribuir para o não apagamento da história, da memória colonial defendendo sempre uma ideia de igualdade, de pertença à cidade", explica Marta Lança que quer também que este trabalho ajude "a pensar a luta antirracista e a ideia de inclusão numa cidade na qual nem toda a gente se sente representada".

Não querendo colar-se às declarações do Presidente da República no discurso que fez no 25 de abril, Marta Lança considera que é uma obrigação de Portugal reconhecer e debater a questão colonial. "Tem que estar presente que não temos que ter nenhum problema em lidar com os episódios mais tenebrosos da nossa história porque isso até é sinal que temos uma democracia madura", sublinha.

O lançamento do projeto do Goethe Institute acontece esta quarta-feira (5 de maio) com a realização dos primeiros debates do ciclo "Memorializar e Descolonalizar a Cidade (Pós)Colonial". Até dia 7 de maio, todos os dias, entre as 18h00 e as 20h00, há debates online.

No primeiro dia, Isabel Castro Henriques abre o painel dedicado às "Marcas coloniais na cidade e no corpo", seguindo "percursos históricos dos Africanos em Lisboa", desde o século XV. Mamadou Ba, militante antirracista, doutorando em Sociologia e especialista em Língua e Cultura Portuguesas, vai refletir sobre como "a geografia racial estrutura a relação entre estar na cidade e ser da cidade. E António Brito Guterres abordará "a forma (pós) colonial da Metrópole", com a Área Metropolitana de Lisboa, como lugar das memórias coloniais.

O segundo dia (6 de maio) vai ser dedicado à "Inscrição de uma Afro-Lisboa", a atriz Nádia Yracema, que no ano passado pôs em cena "As Palavras do Corpo", a partir de poemas de Maria Teresa Horta e vai falar do "artista mo(nu)mento", que "invoca vozes de um passado silenciado". Segue-se Kalaf Epalanga que defenderá "a importância de [se] criar um Museu da Kizomba" e José Baessa de Pina, vice-presidente da associação de Cavaleiros de São Brás, que vai expor a sua experiência sobre como "Construir comunidade nos subúrbios de Lisboa", a nível educacional, social e cultural.

O terceiro e último dia do primeiro ciclo de debates é dedicado a "estratégias para descolonizar a cidade", e conta com moderação do diretor do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, António Sousa Ribeiro e tem como convidados: os antropólogos Miguel Vale de Almeida e Maria Paula Meneses e uma especialista em estudos urbanos, Noa K. Ha, responsável pelo Centro de Investigação para a Integração, da Universidade Técnica de Dresden.

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