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Médica pneumologista, especialista em tuberculose e doenças do pulmão, trabalha com frequência no aconselhamento da Direção-Geral da Saúde. Foi uma das peritas ouvidas nas reuniões do Infarmed para traçar as medidas de contenção da pandemia. Foi secretária de Estado da Saúde. Hoje exerce no Hospital Gaia Espinho e é investigadora do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto e professora do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar. Raquel Duarte, 54 anos, nasceu no Porto.
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É falta de voz do Estado, seja do governo ou autoridades de saúde, que está a fazer subir os casos de infeção ou esta sexta vaga deve-se à falta de vontade das pessoas de cumprir regras de proteção?
Diria que é multifatorial, nós estamos perante uma variante com um poder de transmissão muito grande numa população que estava cansada das medidas de isolamento, de cumprir as medidas restritivas, que tinha perceção de risco baixa e uma série de eventos que são potencialmente de grande transmissão. Tudo isso foram os ingredientes necessários para chegarmos a esta onda, aliados a uma população com alta taxa de cobertura vacinal o que permite reduzir o efeito desta transmissão.
Avaliando as medidas que usámos nos últimos dois anos, devemos continuar a usar máscara?
Nunca deixou de ser recomendada. Deixou de ser obrigatória em determinados espaços, mas continua a ser uma das medidas mais eficazes. É preciso ter perceção de risco, se tivermos num local com muita gente, sem distanciamento, mal ventilado, com pessoas com sintomas, devemos utilizar a máscara a par das outras medidas como a vacinação.
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Distanciamento é recomendável?
É. Bem como melhorar a ventilação de espaços interiores e vacinação. Quando verificamos os dados epidemiológicos atuais verificamos que temos a mais alta taxa de incidência entre populações mais velhas. Numa fase inicial, protegemos muito as populações mais vulneráveis, mas a verdade é que, nesta fase, temos muita gente infetada acima dos 80 anos, nunca tivemos tanta gente infetada acima dos 80 anos. O que é que poderá ter acontecido? Por um lado, as pessoas acima dos 80 anos, já cansadas das medidas, relaxaram na proteção e as mais jovens também não têm tido os mesmos cuidados de proteção dos mais vulneráveis. É fundamental manter esses cuidados no sentido de protegermos as pessoas com maior risco de ter formas graves da doença ou até de morrer.
Lavar as mãos e higienizar espaços regularmente é para manter?
Lavagem das mãos é o nosso quotidiano. É fundamental e é para ser mantida, independentemente da pandemia. Nos espaços também, bem como reduzir contactos sociais quando há sintomas. Aquilo que acontecia no passado de estarmos com tosse, febre e ir ter com amigos, colegas de trabalho, avós os pais não pode voltar a acontecer. Há uma série de práticas que aconteciam no passado que não devem ser replicadas e isso não pode ser esquecido. Não devemos voltar ao passado, tivemos dois anos de aprendizagem que funcionaram bem no sentido de controlar os piores cenários várias vezes e, nesta altura, nós não estamos a proteger as populações mais vulneráveis. Isso passa precisamente pela nossa perceção de risco, pela avaliação dos sintomas, como nos protegemos a nós e aos mais vulneráveis, isso aliado ao incentivar forte de todo o processo vacinal que é, claramente, o pilar fundamental, mas sem esquecer o resto.
A evidência científica mantém a necessidade dos isolamentos dos infetados e dos contactos de risco?
O isolamento da pessoa infetada faz parte das medidas de controlo da infeção. Permite cortar a cadeia de transmissão e isso continua a ser uma das medidas que é aplicada não só à covid-19, mas noutros contextos de doença de transmissão inalada.
Começam a surgir dúvidas se são necessários sete dias ou apenas cinco. Há evidência quanto a isso?
Vamos aprendendo. Quantos dias são necessários para reduzir o risco e quantos dias estamos dispostos a reduzir, mesmo com risco residual de transmissão, vamos aprendendo.
O melhor é manter os sete dias?
O melhor, para já, é manter os sete dias até termos evidência necessária e suficiente para ir reduzindo.
Os casos da nova variante, da sexta vaga, representam 21% do total de casos da pandemia e 6% das mortes desde início da pandemia. O que é que isto quer dizer?
É muito preocupante o nível de transmissão. Eu até acredito que o nível de transmissão é muito maior do que nos é dado a ver pelos números, porque temos nesta altura uma forma de doença que é, na grande maioria dos casos, benigna, com poucos sintomas. Há alguns dados de estudos de análises a águas residuais que apontam que há uma transmissão provavelmente maior do que aquela que nos é dada a ver pelos números. Temos uma grande transmissão na comunidade. Sugere que a população, ávida de grandes eventos e ávida de alguma liberdade, assumiu que já não há pandemia. E há outro dado: o facto de haver tantas pessoas mais velhas infetadas sugere que não estamos a protegê-las de forma adequada, isto é há transmissão a decorrer na comunidade e não há uma barreira dessa população para as populações mais velhas, portanto nós estamos a falhar na proteção das populações mais velhas. Como é que as podemos proteger? Vacinando-as, a vacina tem funcionado, mas é preciso lembrar que vai perdendo o poder ao longo do tempo e estas populações, acima de 80 anos, foram as primeiras a ser vacinadas, estão na fase de perder a capacidade de proteção e precisam de ser revacinadas.
Temos agora um planalto, já estávamos a reduzir a incidência, mas estamos ter alguns travões da descida que está a ser mais lento do que aquilo que seria previsível e muito provavelmente fruto de uma série de eventos de supertransmissão que têm vindo a ocorrer e confesso que olho com alguma preocupação para os dados epidemiológicos da Covid-19 porque nos próximos tempos continuarão a ocorrer uma série de eventos que serão propícios a transmissão, como as festas populares que irão decorrer em breve e um fim de semana prolongado, que já no passado recente deu azo a grande transmissão e mobilidade da população pelo país. Precisamos de ter a noção de que temos conseguido ter a nossa vida normal, mas para que isso aconteça precisamos de começar a reduzir a transmissão e isso passa pelos comportamentos.
Perante isto a máscara deve voltar a ser obrigatória?
As medidas têm de ser proporcionais ao contexto epidemiológico. Se houver um agravamento da transmissão, e sobretudo das consequências, as medidas têm de ser proporcionais. Nesta fase não há muita justificação para que haja medidas obrigatórias. Há uma série de medidas que podem ser tomadas a nível individual sem que sejam obrigatórias.
Se nós não estamos a conseguir conter a transmissão e não estamos a conseguir proteger as populações mais vulneráveis, nós estamos a cometer uma falha como população, como comunidade, não nos estando a proteger a nós próprios com medidas que já conhecemos.
A Organização Mundial de Saúde disse, esta semana, que a evidência global mostra que a imunidade adquirida pelo contágio, somada à vacina, é mais protetora que, que cada uma dessas imunidades, de forma isolada. E que a variante ómicron não gera uma imunidade tão eficaz com as variantes originais. Ou seja, que a vacina, é mais interessante que a doença, para imunizar. É necessário, traçar um plano de vacinação permanente?
Vamos precisar de ser vacinados várias vezes, já tivemos cinco variantes. Se fizermos um paralelismo com a gripe, acabamos por ter uma vacina e uma variante anual, e nesta altura a vacina tem sido eficaz para as diferentes variantes que têm surgido. Perante o passado recente, perante o que temos aprendido, vamos precisar de ter um plano vacinal, efetivamente. Qual é esse plano e a frequência da vacinação? Isso teremos de aprender e teremos de ver exatamente aquilo que está a acontecer. Aquilo que se percebe até agora é que com o tempo há uma perda da imunidade, há uma perda dessa capacidade protetora, portanto, vamos ter de repetir o processo vacinal, vamos ter de ir ajustando a vacina ao longo do tempo. Embora, e apesar de tudo, ainda estejamos com a vacina original e que ainda mantém algum fator de proteção perante as variantes que têm vindo a decorrer. Portanto, sim, a vacina veio para ficar e continuar e, provavelmente, vamos precisar de nos continuar a vacinar ao longo do tempo com uma periodicidade a definir.
No outono teremos todos de ser vacinados? Só os mais vulneráveis?
Aquilo que sabemos de certeza é que temos de preparar o outono e o inverno. Esta preparação vai ter de ser com a vacinação, a vacina será fundamental mais uma vez, sendo prioritário a vacinação das populações mais vulneráveis, as que têm mais consequências e possibilidade de formas graves e de morte. Mas não nos podemos esquecer que, além da vacinação, vamos ter de preparar o inverno melhorando de forma eficaz a ventilação dos espaços interiores.
Antes de chegarmos ao outono-inverno temos de garantir que as populações que ainda não foram vacinadas ou as que estão ainda a fazer a segunda dose de reforço, que façam a vacina para se protegerem. Quando chegar à altura do inverno, as populações que forem definidas com maior risco, façam a vacina para se protegerem.
Quais os efeitos secundários mais duradouros da pandemia?
Há claramente o efeito da saúde mental, o efeito do lockdown, do isolamento, da violência, das alterações da forma como nos comportamos socialmente. Isto vai ter consequências a nível da saúde mental e temos de nos preocupar nos próximos tempos em permitir um diagnóstico e uma ação célere nessa situação. Por outro lado, diria que as consequências imediatas terão a ver com uma série de doenças que terão visto o seu diagnóstico atrasado por uma dificuldade no acesso aos diagnósticos. Houve uma redução dos rastreios, houve uma redução no diagnóstico de uma série de doenças infeciosas, nomeadamente a tuberculose e o VIH, e elas não desapareceram por decreto, simplesmente estiveram camufladas e não foram diagnosticadas. Provavelmente vamos ter algumas alterações em termos de epidemiologia de uma série de doenças e não nos esqueçamos também das consequências do long covid. O long Covid existe, penso que ainda não sabemos todas as suas consequências, aquilo que parece é que o long covid foi muito mais frequente e sério com as primeiras variantes, mas penso que ainda teremos muito para aprender sobre as consequências da Covid no ser humano. Confesso que são as principais preocupações que tenho quando penso em termos de carga de saúde da população, em consequência da Covid-19.
A propósito do long covid, quer dar-nos detalhes?
Mesmo em pessoas que têm formas ligeiras de Covid-19, surgem uma série de manifestações clínicas que podem ir do foro respiratório até ao neurológico, e que se manifestam muito além do término da doença aguda. Ainda não se sabe muita coisa sobre o long covid, nomeadamente a sua génese, porque é que acontece, quanto tempo é que dura. Aquilo que sabemos, apesar de tudo, é que era muito mais frequente numa fase inicial da pandemia do que é agora, mas ainda vamos ter muito para saber.
A doença acentua a desigualdade?
A doença acentua a desigualdade, há determinantes sociais e económicos que vão ditar a forma como vivemos, trabalhamos, nos comportamos, os hábitos que temos. Tudo isso vai influenciar bastante a exposição a determinados agentes, quer infeciosos, quer poluentes. Vão aumentar também o risco de determinadas doenças e essas doenças per si, poderão também fazer com que haja um agravamento desses determinantes sociais e económicos. Nomeadamente a Covid, em relação às pessoas que vivem e trabalham em sítios de grande densidade populacional, que não puderam ficar em casa isolados. Mesmo nas respostas em saúde, de certa forma, porque houve um grande investimento na tecnologia digital (teleconsulta e telemonitorização) não terá sido completamente medido o efeito que essas tecnologias digitais poderão ter tido no agravar de alguma iniquidade nas populações desfavorecidas. Devemos olhar com atenção, no sentido de não deixar ninguém para trás.
Mas uma das missões do Serviço Nacional de Saúde, como direito universal, não é precisamente anular essa desigualdade?
Exatamente. E tem de haver ou continuar a haver, têm de ser pensadas alternativas, para que o próprio desenvolvimento da tecnologia digital não seja uma fonte geradora de iniquidade.
Um dia, demitiu-se de uma posição de chefia por falta de condições para fazer o que lhe era pedido. Do conhecimento que tem dos funcionários das unidades de saúde, esse problema mantém-se, agravou-se, é hoje outro ou, pelo contrário, está tudo muito melhor?
É uma boa pergunta. Diria que estamos permanentemente a trabalhar numa situação de recursos limitados e, particularmente numa fase pandémica, com recursos limitados e cansados. Preparamo-nos sistematicamente para as situações, e até para a pandemia, de uma forma muito estanque, pensamos sempre naquilo que chamamos os quatro S: staff, stuff, space e system. Portanto, os recursos humanos, os recursos técnicos, os espaços e os sistemas e como é que eles funcionam. Acabamos por nos preparar só olhando para essas quatro funções, não temos organizações resilientes, as nossas organizações não têm sido capazes de se adaptar rapidamente. Conseguimos adaptar-nos na pandemia, conseguimos encontrar estruturas de integração entre o serviço público, o serviço privado e o serviço social, e isso foi fundamental para conseguirmos dar a resposta necessária. Se bem se lembram, numa fase inicial, não tínhamos gente, não tínhamos ventiladores, não tínhamos espaço, e foi esta integração que nos permitiu dar resposta. Mas mesmo dentro de um hospital ou dentro de uma unidade de saúde, os serviços trabalham de uma forma muito estanque e, durante a pandemia, conseguiram trabalhar em integração e em interligação. É preciso que esta adaptação, isto que aprendemos durante a pandemia, que foi que tivemos capacidade de nos adaptar em resposta a este desafio, o que permitiu atenuar o efeito desta ameaça e que conseguíssemos recuperar mais rapidamente, esta aprendizagem deverá manter-se no futuro. Se vamos ter novas ameaças no futuro? Vamos ter efetivamente, quer sejam de índole infecciosa, de alterações climáticas ou de uma guerra, mas vamos ter novas ameaças no futuro. Não vamos ter recursos humanos a pensar que vamos ter uma catástrofe a seguir, não vamos ter máscaras ou ventiladores a pensar que todas as ameaças serão de índole respiratória, mas temos de ser capazes de ter uma resposta de organização capaz de se adaptar às ameaças que surgirem. E esta adaptação vai ter de funcionar por forma de colaboração entre os diferentes serviços, uma colaboração entre os diferentes setores de atividade da área da saúde.
Qual é a melhor resposta, qual é a melhor organização?
Não tenho uma resposta para si, aliás, não sou a única que não tem uma resposta para si. Há quem já esteja, neste momento, a tentar perceber quais são as características ou as respostas e estratégias das estruturas de saúde, que permita que estas organizações sejam mais resilientes.
E os políticos que estão no poder podem ignorar as recomendações científicas com base em argumentos que são sociais e económicos?
Diria que uma coisa que aprendemos nesta pandemia foi a importância da articulação entre a ciência, a comunidade e o poder político. E conseguimos ver isso a acontecer nas reuniões do Infarmed em que cientistas das várias áreas do saber partilhavam o seu conhecimento com a comunidade e o poder político. Tudo isso era escrutinado e discutido e depois, obviamente, o poder político ouve os cientistas e ainda vai ter de ouvir os seus diferentes parceiros comunitários, sociais, e vai ter de tomar a decisão. A decisão é do poder político, mas é importante que oiçam a comunidade científica e a comunidade em geral. Uma das coisas que acho que foi importante, particularmente no nosso trabalho, foi auscultarmos peritos de diferentes áreas, mas auscultámos também pontos comunitários focais em que incluíamos pessoas mais vulneráveis. Isto para conseguirmos perceber de forma mais real, o efeito que a pandemia estava a ter na comunidade, mas também o efeito que as diferentes medidas tinham. Tínhamos de equilibrar o efeito da pandemia e o efeito das medidas que iam sendo aplicadas ou levantadas nas propostas de desconfinamento. Essa auscultação da comunidade é fundamental, é esta tríade que acho que será de sucesso em termos de compreensão real do que está a acontecer e do impacto das medidas que podem ser tomadas.
Fez parte do grupo de peritos responsável pela proposta de estratégia de desconfinamento do país e lançou um livro, em coautoria, com o título Covid-19 em Portugal: a estratégia. Olhando para trás, teria afinado alguns dos pontos dessa estratégia de forma diferente?
Estou a pensar na sua pergunta. Decidimos escrever o livro, precisamente para uma memória futura. Há dois anos, surge-nos um vírus que não conhecíamos, ninguém no mundo estava preparado para ele, e foram tomadas uma série de decisões com base naquilo que se sabia. Avidamente procurávamos tudo o que era publicado sobre o vírus, sobre tudo o que estava a ser feito em termos de vacinas e de tratamentos, sobre diagnósticos, sobre os efeitos das diferentes medidas nos diferentes países. Como sabem, muita coisa publicada que não tinha grande qualidade científica, como foi demonstrado por alguns artigos pseudocientíficos sobre alguns fármacos que não tinham utilidade. Muita coisa não se sabia e foi-se sabendo com o tempo e as decisões iniciais eram baseadas nesse pouco que se sabia e naquilo que estava a acontecer no resto do mundo. Penso que uma das grandes lições foi a nossa humildade em tentar incluir pessoas de várias competências de forma a olhar de maneiras diferentes para o mesmo problema. Penso que isso foi bom, termos no nosso grupo pneumologia, saúde pública, matemática, psicologia, ciências da educação, jornalista, tínhamos vários olhares. Auscultámos pessoas das várias áreas do saber e auscultámos também a comunidade e penso que olharmos para a pandemia em todas as suas facetas, não só na área da saúde, mas também nas suas consequências económicas, sociais, familiares e de saúde mental, foi importante nas propostas que fizemos, sempre na medida da evidência disponível e dos saberes disponíveis. Muitas decisões foram tomadas antes de surgir uma nova variante que era muito mais transmissível, fomos sendo surpreendidos por novas variantes, e isso também tem de servir de aprendizagem. Devemos, de certa forma, olhar o passado e perceber o que correu bem e o que correu mal, e vamos ter de planear o futuro.
E afinaria algumas estratégias?
Diria que precisamos de trabalhar muito bem a comunicação. A comunicação com a população é fundamental, precisamos de ter a população a perceber o que está a acontecer. Foi muito bom ocorrerem as reuniões do Infarmed, porque permitiu que a população percebesse o racional por de trás das decisões, foi muito importante. Era importante também que essa comunicação não tivesse desaparecido com a cessação das reuniões do Infarmed.
E desapareceu?
De certa maneira sim, mas não foi apenas por terem desaparecido as reuniões do Infarmed, a guerra na Ucrânia também passou a ser o assunto de maior relevo.
Com a sexta vaga deveria voltar essa comunicação?
É importante que a comunicação voltasse. Porque o desaparecimento da obrigatoriedade da máscara, que não é igual à cessação da responsabilização e da recomendação de utilização da máscara. Provavelmente, com a grande vontade de largar todas as medidas e o cansaço associado à pandemia, mas houve aqui uma falsa de noção de que deixar de ser obrigatório poderia ser igual à não recomendação, e não é de todo. A pandemia continua, continuamos a ter transmissão comunitária e, portanto, as medidas continuam a ser recomendadas e as pessoas devem ter essa recomendação de utilizar a máscara perante a perceção de risco. Uma coisa que é interessante é que uma das coisas que também fizemos durante estes dois anos, foi estar atentos a uma série de ferramentas, e algumas delas mediam a perceção de risco da população. É interessante perceber que a população percebia bem quando o risco era maior e quando era menor e a resposta a essa perceção de risco traduzia-se, precisamente, na utilização das medidas de proteção individual. Creio que a mensagem em termos desta sexta vaga, desta transmissão, for eficaz como foi no passado, a população facilmente percebe que precisa de usar as medidas de proteção individual. Portanto, esse trabalho, particularmente com a comunicação social, que foi tão importante durante o período da pandemia, e foi extraordinário, porque a noção que tenho é que a comunicação social chamou a si a missão de informar e de apostar na literacia da população. E, de repente, como a Covid-19 deixou de ser assunto, penso que terá contribuído para que houvesse este dissociar da perceção de risco face à realidade epidemiológica, coisa que não tinha acontecido no passado. A perceção de risco era muito adequada, a nossa população tinha uma perceção de risco muito adequada e uma adesão às medidas de proteção individual muito adequada. Penso que houve aqui uma quebra da comunicação e, obviamente, essa quebra aliada ao cansaço associado às medidas.
É a DGS que deve voltar a comunicar melhor com a população?
Diria que todos nós temos a responsabilidade de comunicar. Existem produtos de comunicação, mas a comunicação do que está a acontecer, a comunicação de quais são as medidas adequadas, diria que é função de todos nós. É função minha como médica na minha atividade clínica, é função minha como professora na minha atividade letiva, é minha também aqui quando estou a falar convosco, mas é vossa também no dia a dia. Diria que a Direção-Geral de Saúde, obviamente, tem a missão de comunicar e de aumentar a literacia da população, mas além da DGS, todos nós temos esse papel no nosso dia a dia, de comunicar e de fazer passar a mensagem mais adequada.
Se fosse chamada de novo a uma missão política aceitaria?
Sou técnica, não sei exatamente o que o futuro me dirá, mas sou técnica, sou médica, sou professora, e estou aqui para trabalhar e para aquilo que for preciso fazer. Nesta altura tenho uma atividade bem preenchida, mas não sei o que o futuro me dirá.