Mapa Mundo

A análise dos principais acontecimentos internacionais. Uma parceria com o Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI).
À terça-feira, às 13h20, com repetição às 23h15 e 03h15

Para aprovar o acordo do Brexit… tempo precisa-se!

O Brexit arrasta-se há anos mas no parlamento britânico luta-se contra o relógio. Pode não haver votação do acordo de saída da UE antes de 5º feira. Dois especialistas em relações internacionais, Nuno Severiano Teixeira e Bernardo Ivo Cruz, estiveram na TSF a debater o tema do momento no programa Mapa Mundo, uma parceria com o Instituto Português de Relações Internacionais.

O tempo é mais do que curto. "Há três dias para fazer todo o processo legislativo que passa pelas duas câmaras do parlamento", afirma Bernardo Ivo Cruz, doutorado em ciência política pela Universidade de Bristol, que durante vários anos viveu no Reino Unido e que atualmente edita o London Brexit Monthly Digest. Como termo de comparação, recorda que "quando foi aprovado o Tratado de Maastricht, o parlamento levou quarenta dias para chegar à conclusão do processo". Basta haver propostas de alteração "que o parlamento pode fazer, ou os Lordes apresentarem propostas de alteração" para todo o processo complicar. Todas as propostas de alteração têm de ser discutidas e votadas até quinta-feira, sendo que "o que está previsto é haver uma agenda non-stop até lá, e vamos hoje saber se isso vai ser possível ou não; ou seja, mais do que aprovação do acordo de saída, interessa-nos ver se a agenda de trabalhos do parlamento até ao fim da semana vai ser aprovada ou não".

Nuno Severiano Teixeira, diretor do Instituto Português de Relações Internacionais não vê possibilidade de a União Europeia vir a aceitar "mais alterações do que aquelas que já foram feitas". Portanto, do ponto de vista europeu, o acordo conseguido na semana passada entre as duas equipas negociais e anunciado por Jean-Claude Juncker e Boris Johnson é "o melhor possível".

Bernardo Ivo Cruz afirma que "dos votos que Boris Johnson precisará logo à noite, talvez os mais difíceis sejam os dez votos dos unionistas da Irlanda do Norte (do partido DUP), outro grupo que poderia votar contra seriam os conservadores radicais, a favor do Brexit, precisamente pela questão da Irlanda do Norte, mas o Boris Johnson vem daí, desse grupo, portanto tem alguma ascendência para fazer com que este grupo de oitenta deputados, mas os mais radicais serão cerca de trinta, o acompanhem nesta decisão. Mas também vai precisar de votos que venham dos trabalhistas. Portanto, é possível que ele consiga aprovar o acordo, mais difícil é que ele consiga aprovar o acordo e toda a legislação subsequente até quinta-feira. Isso é muito otimista".

Pode ouvir aqui o Mapa Mundo na TSF com edição de Ricardo Alexandre

Num processo difícil e "onde é difícil encontrar a lógica", como reconhece Severiano Teixeira, "e onde a tática parece sobrepor-se aos objetivos estratégicos", o referendo deu ao Reino Unido um mandato para sair da EU "mas nada nesse mandato é definido e tudo fica em aberto; há uma clivagem clara na sociedade britânica e uma clivagem entre as instituições que pode explicar todo o processo e peripécias a que estamos a assistir: de um lado o voto popular expresso no referendo, a democracia direta, que diz para sair mas não diz como sair e, do outro lado, fica a democracia representativa que está institucionalizada no parlamento e que tem a obrigação de levar à prática esse mandato e de o tornar concreto do ponto de vista institucional, e, acima, de tudo, prefigurar aquilo que vai ser a relação futura com a União Europeia". Porque o Brexit é um processo e esta apenas a primeira fase. Severiano Teixeira afirma que "o governo, de uma forma mais moderada com Theresa May e de uma forma mais radical com Boris Johnson, assumiu o lado da democracia direta, o lado do voto popular e está a querer levá-lo até às últimas consequências, com a saída até 31 de Outubro". O diretor do IPRI entende que o que está em causa na forma como todo o processo foi conduzido por aqueles que defendem a saída do reino Unido da União Europeia "é a exploração do medo".

Para Ivo Cruz, sendo o Reino Unido "a grande potência atlântica da EU, o Brexit vai levar a uma continentalização da União Europeia. Os orçamentos, as políticas, as preocupações, vão voltar-se mais para o interior do continente e menos para o Atlântico. Se quisermos usar uma imagem geográfica, quando entrámos na UE o centro da Europa estava entre a França e a Alemanha, com o alargamento a Leste o centro da Europa passou a estar em Berlim e a avançar em relação à Polónia e a saída do Reino Unido leva a um reforço dessa continentalização". Para Portugal, entende o cientista político, tal representa "um problema porque vamos ficando cada vez mais longe do centro de decisão", o que obriga a ter "uma política integrada de reforço da importância do Atlântico e da língua portuguesa", recordando o "triângulo virtuoso" de que falava Ernâni Lopes: a Europa, a língua portuguesa e o Atlântico. Severiano Teixeira conclui dizendo que a saída do Reino Unido "fecha a União Europeia sobre si própria, com menor capacidade de abertura ao mundo e isso é de facto preocupante e Portugal deve ter uma atenção particular; primeiro, para não se deixar periferizar excessivamente, e depois, para manter a abertura da UE para as suas relações internacionais".

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