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1.
Maria do Céu Guerra fez 80 anos.
E é preciso (e necessário) que se diga que esta mulher fez 80 anos.
É fundamental gritar que uma das mais marcantes portuguesas está viva e celebrou ontem 80 anos de uma vida em que escolheu arriscar um caminho próprio e cheio de obstáculos que soube ultrapassar com talento e uma enormíssima coragem.
A Maria do Céu Guerra não está nem nunca esteve louca ou ultrapassada
2.
Ela é uma das mais extraordinárias atrizes portuguesas de sempre.
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Alguns dos seus personagens colaram-se à pele e nela ficaram: "Calamity Jane", "A Cantora Careca" ou a fabulosa "Rosa" de "Os Gatos não têm Vertigens", filme de grande sucesso de António Pedro Vasconcelos.
Mas Maria do Céu Guerra não é apenas uma grande atriz.
Ela foi ainda mais do que isso.
Ela é ainda mais do que isso.
Fundou "A Barraca" uma companhia de combate por um ideal artístico que é também político e ideológico.
A larga maioria dos que a acompanharam na aventura de uma revolução cultural e política foram seguindo por um outro caminho - não é uma crítica, antes uma constatação.
Mas ela encabeçou os que se mantiveram firmes na primeira linha de luta.
E fê-lo assumindo o risco de com isso perder oportunidades e papéis, assumindo o risco de comer o pão do Diabo sem capitular, assumindo o risco de a considerarem ultrapassada, fora do seu tempo, louca.
3.
É admirável que o tenha feito.
Teria sido mais fácil se tivesse capitulado como a maioria dos outros, mas seria desistir de si própria e do que criara, dos lugares que inventara, de cada centímetro de um palco que soube sonhar, de todos os miúdos que formou, de todas as pessoas que nela confiaram.
Fez 80 anos a Maria do Céu Guerra.
E continua na trincheira.
A ser inconveniente, a dizer o que lhe apetece dizer, mas com a inteligência e o pragmatismo necessários para manter "A Barraca" com a porta aberta.
E continua a fascinar-se por novos papéis, por novos textos, por novas oportunidades de criar, interpretar, especular e imaginar um novo mundo.
Continua a bater-se por uma nova oportunidade de procurar a verdade, mesmo que doa, mesmo que seja impossível não estar cansado depois de tanta queda, depois de tantas derrotas, de tantas desilusões.
4.
A Maria do Céu Guerra conheceu os meus pais.
Andou comigo ao colo.
Lembro-me de em criança ir ver espetáculos e ficar na régie de som.
Lembro-me do ambiente nos bastidores, da Maria do Céu absoluta e aos meus olhos uma estrela inalcançável, como todas as estrelas.
Mas confesso-te que passados mais de quarenta anos, continua a mesma.
Absoluta.
Enorme no talento.
Obstinada.
Apaixonada.
Uma estrela.
Talvez um pouco mais cínica em relação ao mundo e aos outros.
Mas viva.
Viva mesmo.
Com 80 anos e pronta para mais caminho, para mais desafios, para mais teatro, para mais livros, quadros, arte.
No fundo, a continuar a fazer o que sempre fez: procurar a verdade a partir do único lugar em que a verdade é possível, o palco.
Muitos parabéns, Maria do Céu Guerra.
Parabéns, "Calamity Jane".
Parabéns, querida "Rosa".
Parabéns, Exma. Sra. Atriz.