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Há um par de aprendizagens interessantes que podemos fazer, a partir da nossa vivência da pandemia e do confinamento, relativas ao medo e à forma de nos defendermos dele.
Uma, é que os medos são mais determinantes para os nossos comportamentos, decisões e mesmo decisões politicas do que os contributos das ciências e das tecnologias. Embora seja da ciência que nós esperamos a cura, a solução, e seja nela que depositamos a fé e confiança e também a esperança que nos esclareça o que vai ser o futuro. Mesmo que ela não tenha solução para tudo, alimentamos a ilusão de que alguém vai tratar, proteger e resolver (que tem a obrigação de resolver!).
Sem medo do Medo: "Autonomia e medo da morte"
Um desses medos, talvez o mais importante, refere-se à ameaça da ideia de morte. Esta ideia de morte, não pensamos nela espontânea e conscientemente, na maior parte das situações. Embora ela esteja sempre a aflorar, por exemplo quando nos cruzamos com uma pessoa com uma deficiência notória ou alguém em grande sofrimento. Porque ambas as pessoas, ou situações, nos remetem para a degradação do corpo e da perda ou deterioração das capacidades. O que nos assusta e preferimos nem ter consciência do facto.
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Não admira que, na situação que vivemos, o medo inconsciente seja o tal factor-chave do nosso comportamento. E vemo-lo a agir: na corrida inicial à comida (medo relativo à sobrevivência) e ao papel higiénico (relativo à degradação) e, agora na busca de objetos de proteção (máscaras, viseiras e luvas) para nos proteger dos outros, quando servem, primeiro que nada, para proteger os outros de nós.
Assim, a consciência da morte é uma forma de sabermos que estamos vivos, é a consciência da nossa fragilidade, o que nos pode ajudar a dar sentido ao que fazemos e às nossas escolhas. Pior é agir o medo, especialmente o medo da morte, sem disso darmos conta ou termos consciência. Esse é sempre o perigo maior.
*Vítor Franco, Psicólogo, Psicólogo e professor da Universidade de Évora