TSF à Mesa

Portugal fora, as fronteiras entre regiões são traçadas pelas paisagens e pela mesa. Das cidades às serras ou na imensidão das planícies, da melhor tradição portuguesa ao vanguardismo mais ousado. António Catarino sugere um país gastronómico que vale a pena apreciar.

O Lagar do Nicolau

Na Rota da Terra Fria, entre Vimioso e Mogadouro, a outrora vila de Azinhoso, sede de concelho entre os séculos XIV e XIX, com hospital e misericórdia, é detentora de um valioso ex-líbris monumental: a igreja românica de St.ª Maria.

Vai longe o ano de 1287, quando D. Dinis instituiu uma feira naquele território rural, moldado por ancestrais práticas agrícolas. Uma agricultura de subsistência, apoiada por um lagar de varas e moagem; um espaço tradicional, com história na aldeia, hoje recuperado de modo admirável.

O boi que fazia movimentar as mós para obter farinha, já deixou há muito de andar, pachorrento, às voltas no espaço circular, hoje sala de restaurante; no lagar, meia dúzia de degraus abaixo, dos capachos encaixados na prensa, o azeite a escorrer ganhou a forma de miragem.

Ficou a recordação desses tempos, preservada no Lagar do Nicolau, transformado em restaurante em 2016, com decoração rústica e cujo nome é um tributo à memória do patriarca da família.

Os filhos limparam o pó do degredo e do abandono às máquinas e utensílios, que brilham, como novos, no admirável espaço onde se respira tradição e a lareira é tão aconchegante, quanto preciosa, para receber a grelha, sobre a qual são colocadas as carnes de um saboroso manjar transmontano.

O vaivém, despertando a gula, começa com placas de ardósia pejadas de fofos enroladinhos de alheira; cogumelos com orégãos e torradinhas do excelente pão regional. Comum a ambas, o azeite de muito boa qualidade.

A octogenária D. Arminda, "a Narcisa", como é conhecida, junta à elaboração de licores o gosto por ajudar filha e filho, que giram sem parar entre a cozinha e as mesas.

O misto de carnes, pela variedade, obriga a esse movimento pendular, de modo a que o frio não leve a melhor: chichos, bodião, cordeiro e espetada de vitela em pau de louro contribuem para um festim de carne muito macia, saborosa, grelhada no ponto.

Para acompanhar, cogumelos com castanhas, numa mistura saborosa, com um toque picante.

Em complemento, salada de merujes - planta bravia semelhante ao agrião -- tomate e alface.

Outra opção é o galo no pote, um estufado bem confecionado e guloso, que figura entre as especialidades enunciadas na lista, necessariamente curta.

No rol dos estufados, javali, cabra e feijão verde são alternativas graças à qualidade pela qualidade da matéria-prima e culinária competente.

Em bom nível apresentou-se o cabrito assado, fazendo jus á fama conquistada.

Com sabor mais regional, o butelo no pote com cascas, confecionado com a vagem seca do feijão, pernil, chouriça, orelheira e pés do reco afirma-se pelo teor calórico, que caracteriza os cozinhados do tempo frio.

A feijoada à transmontana é outra das sugestões a equacionar.

Para sobremesa, a mousse de dióspiro surpreendeu -- não é excessivamente doce -- e a tábua de queijos regionais com compotas de fabrico caseiro, colocaram apoteótico ponto final em refeição surpreendente: pratos regionais, boa matéria-prima; ingredientes de qualidade; cozinha sólida neste restaurante com serviço muito simpático, que funciona mediante marcação para almoços e jantares; é taberna com petiscos diários e espaço museológico, onde é recordada a história da casa.

O Lagar do Nicolau, em Azinhoso, a uma dezena de quilómetros de Mogadouro.

Localização. Azinhoso (Mogadouro)

Contacto: 916 154 923 ; 936 271 840

GPS: 41.38263 N ; -6.68650 W

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