Verdes Hábitos

Agir é preciso! As mudanças de hábitos em tempos de emergência climática. As grandes questões, os desafios, os problemas relacionados com a sustentabilidade e o ambiente. "Verdes Hábitos" na TSF com Carolina Quaresma e a Associação Ambientalista Zero. Às segundas-feiras depois das 16h40 e sempre em tsf.pt.
(Até 2021 o programa foi da autoria de Sara Beatriz Monteiro e Inês André de Figueiredo).

"Ação", "perdas e danos" e "justiça climática". A COP27 no Egito

São duas semanas cheias de debates e negociações entre governos, organizações não-governamentais e outros membros da sociedade de civil, com as alterações climáticas e o aquecimento global como protagonistas. Francisco Ferreira, da associação ambientalista Zero, explica que a COP27 será a "conferência da implementação", onde se deverá "passar à ação". O progresso climático, tendo em conta o Acordo de Paris, alcançado em 2015, e as "perdas e danos" dos países que são afetados, por exemplo, por furacões, serão alguns dos temas em cima da mesa no Egito.

A Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, conhecida como COP, arrancou este domingo, no Egito. Esta é a vigésima sétima edição e, por isso, designa-se de COP27. Durante as próximas duas semanas, governos, organizações não-governamentais e membros da sociedade civil vão debater o aquecimento global e as consequências que se fazem sentir um pouco por todo o mundo. Segundo Francisco Ferreira, da associação ambientalista Zero, este é um "momento anual" em que "todos os países do mundo são obrigados discutir, a conversar e a perceber que estamos numa fase crítica em termos de emergência climática, com a temperatura a subir e países a serem altamente prejudicados por cheias, furacões e pela subida do nível do mar". "Estes custos para a humanidade são absolutamente dramáticos", afirma.

Mas como é que nasceu esta cimeira do clima? Francisco Ferreira conta um pouco da história: "Em 1992, numa célebre conferência chamada "Eco92" ou "Conferência do Rio", nasceu a convenção das Nações Unidas para as Alterações Climáticas. Foi uma conferência onde nasceram outras convenções, a do combate à desertificação e a da diversidade biológica. Isto porque nos anos anteriores estavam a surgir sinais de que, efetivamente, estávamos num processo de aquecimento global da nossa atmosfera e com consequentes alterações climáticas. Houve, aliás, em 1988, a criação do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas, com mais de três mil cientistas, cujo primeiro relatório é de 1990. Em 1992, temos esta convenção que começou, depois, a reunir e reúne anualmente nestas conferências das partes desde 1995."

Durante as próximas duas semanas, são vários os temas em cima da mesa, desde logo, esta segunda e terça-feira, com os chefes de Estado e de Governo de todo o mundo a fazerem um ponto de situação sobre "aquilo que estão a fazer" no que diz respeito ao progresso climático.

"São milhares de pessoas nesta conferência que vão estar a discutir como é que estamos em termos de progresso de redução de emissões, o que é necessário fazer em termos de financiamento e de quais são as prioridades que devem ser implementadas nos próximos anos. Há aqui uma ligação íntima entre a política, a ciência e a sociedade numa agenda que está muito atrasada em relação ao combate às alterações climáticas", explica Francisco Ferreira.

O Acordo de Paris e o progresso climático mundial

Em 2015, na COP21, em França, foi alcançado um dos grandes compromissos na área do ambiente e do clima, com o Acordo de Paris, que é "a base do progresso climático".

"O Acordo de Paris levou a que todos os países fixassem metas para 2030 de redução de emissões de gases de estufa que causam o aquecimento global, algo que tem muito a ver com o uso de combustíveis fosses, ou seja, o petróleo, o gás natural, o carvão", refere o especialista.

"O Acordo de Paris, em 2015, mostrou-nos que estávamos numa trajetória de aquecimento que atingiria 3,4 ºC ao longo das próximas décadas e o objetivo era garantir que não iríamos ultrapassar 1,5 ºC em relação à Era pré-industrial, revendo as metas de cinco em cinco anos. Foi isso que aconteceu com um ano de atraso, no ano passado, na COP26, em Glasgow." Além disso, este acordo também olha para a questão do financiamento: são cem mil milhões de dólares que "os países desenvolvidos devem dar aos países em desenvolvimento para eles lidarem com a adaptação climática e com a redução de emissões, nomeadamente através de investimento em eficiência energética e energias renováveis".

Sendo o Acordo de Paris a "definição da trajetória do combate às alterações climáticas", Francisco Ferreira considera que "não estamos tão bem quanto gostaríamos".

"O relatório das Nações Unidas mostrou-nos que estamos com 1,2 ºC em relação à Era pré-industrial, quando o nosso limite é 1,5 e a trajetória em que estamos é para 2,8 ºC. Se for cumprido tudo aquilo que os países prometeram, baixamos para 2,6 e, se pusermos umas medidas adicionais que muitos países também se comprometeram, vamos para 2,4. Mas 2,4 é praticamente um grau acima daquilo que é o objetivo de Paris. Isto significa consequências com as quais já estamos a lidar como a seca, cheias e países que desaparecem, literalmente, com a subida do nível do mar. Não estamos a conseguir ter políticas suficientes no sentido de acelerar este combate."

O perito afirma que "falta, acima de tudo, uma transição muito mais rápida, mas sustentável, para as fontes renováveis", bem como "proporcionar uma melhor qualidade de vida aos países em desenvolvimento".

COP27: "ação", "implementação", "perdas e danos" e "justiça climática"

Francisco Ferreira enumera os temas que estarão em cima da mesa nas próximas duas semanas. "Esta é uma conferência da implementação, ou seja, de passar à ação. É uma conferência dedicada a um dos temas cruciais que são chamadas "perdas e danos", que não tem a ver com a adaptação climática, mas sim com os furacões que destroem parte de um pais e é preciso garantir financiamento imediato para recuperar as infraestruturas. Esta é uma COP no Egito, em África, um dos continentes que já está a ser assolado pelas consequências das alterações climáticas de forma muito violenta e sem capacidade financeira para reagir."

Além da ação, da implementação e das "perdas e danos", também será debatido o "progresso e a preparação do próximo ano em que haverá um relatório à escala mundial de como é que estamos a avançar".

"Sem dúvida alguma que esta é a COP da justiça climática e é isso que as associações de ambiente também querem, porque temos países em que as pessoas são capazes de emitir por ano e por pessoa 20 toneladas de dióxido de carbono e temos países em que estamos com duas ou três toneladas. Uma injustiça muito grande do ponto de vista da riqueza, mas também do contributo para este problema."

A guerra da Ucrânia pode, no entanto, afetar esta discussão sobre o clima, principalmente, no que toca à possibilidade de os países chegarem a algum acordo, porque "o que está aqui em jogo é, acima de tudo, a diplomacia".

"Sabemos que há as relações com a Rússia, que é também um país com um peso importante em termos de emissões, e de outros que têm vindo a ser solidários com a Rússia na invasão da Ucrânia, mas temos também conflitos muito grandes entre países produtores de petróleo e de gás e a necessidade de reduzir fortemente o uso destes combustíveis fósseis", sublinha Francisco Ferreira.

A participação e contribuição dos cidadãos para o combate às alterações climáticas

Ao longo das duas semanas de conferência, normalmente, os cidadãos organizam manifestações para alertar para a urgência de travar as alterações climáticas. No entanto, "infelizmente", no Egito, "há um conjunto de restrições e do regime para se fazerem manifestações" e, por isso, "aquilo que é habitual, que é juntar dezenas de milhares de pessoas em manifestações não vai acontecer".

Mas essas manifestações serão possíveis em Lisboa, onde, no próximo sábado, dia 12 de novembro, há uma marcha pelo clima com a participação da Zero e outros movimentos. Trata-se da marcha "Unir contra o Fracasso Climático", que decorre às 14h00 no Campo Pequeno.

No Egito, além do primeiro-ministro, António Costa, o ministro de Ambiente, Duarte Cordeiro, e outros deputados da Assembleia da República, também a Zero estará presente nesta conferência. "Queremos que essa participarão seja tão forte e aberta quanto possível para que todos possam acompanhar."

Reduzir as emissões de gases de efeito de estufa "diz respeito às políticas de cada um dos governos e nós queremos que Portugal não perca esta ambição climática. A Europa está na linha da frente, mas ainda não suficientemente à frente como seria necessário para estar compatível com o Acordo de Paris".

"A Europa comprometeu-se em reduzir as suas emissões em 55% entre 1990 e 2030 e desejavelmente deveria reduzir em 66%. Portugal tem uma Lei de Bases do Clima, que é um instrumento extremamente importante e dos mais relevantes dos últimos anos em relação a estas questões, mas que está a ficar atrasado e que diz respeito a cada um de nós. No Orçamento do Estado, por exemplo, está lá já um orçamento verde e a Lei de Bases do Clima prevê um IRS verde. O governo tem que ser consistente e não pode perder a ambição. Infelizmente, à escala europeia, Portugal está fora dos países mais ambiciosos. Portugal não pode perder esse comboio", frisa Francisco Ferreira.

Parte da responsabilidade está do lado dos líderes políticos, mas todas as pessoas podem ajudar no combate às alterações climáticas e na redução das emissões, diminuindo o consumo de combustíveis fósseis e investindo, se houver possibilidade, em energia solar para o aquecimento da água e produção de eletricidade.

"Nós temos mais de três mil horas de sol e um painel fotovoltaico numa varada ou no telhado pode fazer a diferença. Reduzir o consumo, sermos mais eficientes e não usarmos tanto petróleo e gás natural é o nosso melhor contributo para a aposta certa de um país que não tem extração de combustíveis fosseis, mas que tem, por razoes económicas, ambientais e climáticas, uma oportunidade enorme de fazer uma aposta a bem do clima", conclui.

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