Verdes Hábitos

Agir é preciso! As mudanças de hábitos em tempos de emergência climática. As grandes questões, os desafios, os problemas relacionados com a sustentabilidade e o ambiente. "Verdes Hábitos" na TSF com Carolina Quaresma e a Associação Ambientalista Zero. Às segundas-feiras depois das 16h40 e sempre em tsf.pt.
(Até 2021 o programa foi da autoria de Sara Beatriz Monteiro e Inês André de Figueiredo).

Água, "um recurso fundamental": o que causa a sua degradação e como a proteger

A 22 de março assinala-se o Dia Mundial da Água. No Verdes Hábitos desta semana, Susana Fonseca, da associação ambientalista Zero, refere que as alterações climáticas, a poluição e a ação do Homem são os principais fatores que contribuem para a menor qualidade das massas de água. Desta forma, é fundamental implementar projetos que garantam o acesso a água potável e o tratamento das águas residuais. A Agenda de Ação da Água é um dos instrumentos da ONU que poderá ajudar a trilhar esse caminho.

Os ecossistemas aquáticos estão a degradar-se a um ritmo sem precedentes e, nos últimos 300 anos, mais de 85 por cento das zonas húmidas do planeta desapareceram. O alerta é das Nações Unidas, que, no Dia Mundial da Água, que se assinala a 22 de março, destaca a importância de acelerar a mudança para resolver a crise da água e saneamento. Susana Fonseca, da associação ambientalista Zero, destaca que a água é "um recurso fundamental à vida".

"Não teríamos vida se não tivéssemos água neste planeta, é um recurso que temos que cuidar com grande atenção. Não devemos esquecer que, de toda a água que existe no planeta, apenas uma pequena parte é água doce (à volta de 3%) e grande parte dessa água doce também está sob a forma de gelo, ou seja, não está facilmente acessível à população e a todas as outras espécies. É um recurso fundamental, é também por isso que as Nações Unidas assinalam todos os anos este Dia Mundial da Água, para relembrar a importância de cuidarmos deste recurso fundamental à nossa existência", considera a especialista.

A "abundância" na UE e as diferenças entre países

Na Europa, os recursos hídricos são "abundantes": por pessoa, há, em média, 4560 metros cúbicos (m3) de água. Contudo, "dentro da própria Europa há grandes diferenças", avisa Susana Fonseca. "No caso europeu, em Malta, as disponibilidades hídricas são de cerca de 120 m3 por pessoa, ao passo que, na Noruega, são 70.000 m3. São diferenças abissais que têm a ver com as características do próprio país e do seu clima."

Relativamente ao uso que é feito da água, o setor principal é a agricultura. "Na União Europeia, calcula-se que a agricultura absorva cerca de 58% da água, no caso português chega aos 70%. A seguir, no caso europeu, temos a área da produção de energia, com cerca de 18%, e a mineração com 11% e os agregados familiares com 10%. Em Portugal, é um pouco diferente, porque a seguir à agricultura, que tem 70%, vem o consumo urbano com 13%, o setor termoelétrico com 9% e a indústria com 6%. Estes dados indicam-nos, se nós queremos ser um país e uma região resiliente do ponto de vista dos seus recursos hídricos, dá para perceber qual o setor onde temos de trabalhar com mais atenção, nomeadamente a questão da agricultura, porque é o setor que mais absorve em termos de consumo de água", explica.

Susana Fonseca aponta ainda as diferenças entre o Norte e o Sul de Portugal, que são "muito significativas". "No Norte, as regiões hidrográficas têm maior disponibilidade hídrica, no Sul há alguns problemas bastante graves e prevê-se que, no futuro, tenham a tendência para se agravar."

Degradação da qualidade da água: o clima, a poluição e a ação do Homem

As alterações climáticas e a poluição são dois dos fatores que contribuem para a degradação da qualidade da água. Segundo a associação ambientalista Zero, em termos de água potável, em Portugal, "há muito bons resultados, uma percentagem de água segura muito próxima de 100%".

No entanto, no que toca às massas de água, isto é, as águas subterrâneas ou superficiais, a tendência inverte-se.

"Quando olhamos para o segundo e terceiro ciclo de planeamento dos planos de gestão da região hidrográfica, há uma redução em termos da percentagem das massas de água superficiais em bom estado, de 64% para 49%. Temos que trabalhar para que, cada vez mais, as nossas massas de água tenham cada vez melhor qualidade e isso não tem acontecido. É o resultado, essencialmente, da poluição de origem difusa, agravado por efeitos das alterações climáticas, nomeadamente as cheias e secas", sustenta Susana Fonseca.

Além das alterações climáticas e da poluição, também a ação do Homem contribui para a degradação dos sistemas aquáticos do planeta. Segundo a especialista, as principais fontes de poluição das águas são os esgotos, as águas residuais, as práticas agrícolas ou a extração excessiva da água. "Quando estamos em situações de escassez, se imaginarmos um rio que, numa dada altura do ano tem um caudal muito menor, se mantivermos os mesmos 'inputs' em termos de esgotos que entram, a própria concentração de poluentes será maior", exemplifica.

O que tem feito a UE para proteger este recurso?

Em termos de política na União Europeia, há um "quadro jurídico bastante bem estruturado e de longo prazo, com o objetivo de proteger e gerir os recursos hídricos".

"A diretiva-quadro da água é o documento enquadrador desta área que visa prevenir e reduzir a poluição, promover um consumo de água sustentável, proteger e melhorar o ambiente aquático, atenuar eventuais efeitos de fenómenos extremos", afirma Susana Fonseca. Esta diretiva é complementada pela diretiva da água potável e a diretiva de águas balneares.

"No âmbito desta diretiva, os Estados-membros são chamados a elaborar planos de gestão da região hidrográfica para ter uma noção clara de quais são as disponibilidades que têm e estes planos são fundamentais para que sejam previstas as medidas para atingir os objetivos globais desta diretiva-quadro, que é a obtenção do bom estado ambiental de todas as águas."

O objetivo número seis de desenvolvimento sustentável é: "água e saneamento para todos até 2030", que coincide também com o tema deste ano da ONU para o Dia Mundial da Água. Para a especialista, a nível nacional, temos "um avanço muito grande" para cumprir aquela meta.

"Em termos de qualidade da água para consumo humano já estamos numa boa situação. No caso do saneamento, ainda não é 100%, temos cerca de 86% dos alojamentos em Portugal continental servidos por serviços públicos de recolha e tratamento de águas residuais urbanas e isso é muito positivo, mas ainda está longe dos 100%. Tem a ver com as características do país, a dispersão urbana, que, às vezes, leva a que estes sistemas partilhados e públicos não sejam a melhor solução. Mas, em geral, houve uma evolução positiva e Portugal não está mal posicionado", defende.

Ainda assim, a nível global, "a situação é bastante diferente". "Há muito por fazer e também por isso há este objetivo por parte da ONU de reforçar a ação e a eficácia das ações nesta área da gestão do recurso água."

Então, o que falta para cumprir o sexto Objetivo de Desenvolvimento Sustentável? Susana Fonseca responde: "Se até em países como Portugal, que tem uma legislação robusta, conseguimos ter indicadores que vão no sentido contrário, ou seja, de perda da qualidade em termos de algumas massas de água superficiais, podemos imaginar o que se passa um pouco pelo mundo fora, em países onde ainda não há infraestruturas de tratamento das águas, até para o consumo humano."

Acesso a água potável e tratamento das águas residuais: a Agenda de Ação da ONU

Tendo em conta esse panorama, está em construção a Agenda de Ação da Água, que será discutida na Conferência da Água na ONU, nos próximos dias. Esta agenda passa pelo "compromisso em termos de ação, implementação de projetos, e garantir que os projetos estão a ser implementados, a ter resultados positivos em termos da qualidade da água, de acesso a água potável de qualidade, e de tratamento das águas residuais".

"É quase um plano de ação para tentar concretizar mais aquilo que se fala no âmbito dos diferentes objetivos que estão dentro do objetivo de desenvolvimento sustentável 6, mas depois tentar concretizar no terreno", indica.

Em Portugal, há também "muito para fazer", desde logo, "ser um bom exemplo de implementação de boas políticas em termos de gestão do recurso".

"Somos um país que corre risco em termos de disponibilidades hídricas, a gestão do recurso água tem que ser feita sempre, quando chove e quando não chove, essa aprendizagem ainda não a temos bem integrada. É crucial que Portugal assuma a água e o recurso água como um elemento fundamental para o seu futuro. Depois, a cooperação e o apoio aos países de língua oficial portuguesa na implementação de projetos nestas áreas, porque os países mais desenvolvidos têm acesso a mais recursos e mais experiência, e, por isso, podem ter um papel muito importante de aconselhamento a outros países", sublinha.

Como poupar e contribuir para uma água de maior qualidade?

Para uma maior sustentabilidade ao nível dos recursos hídricos, além da poupança de água, Susana Fonseca recomenda o consumo de água da torneira. "Temos água de grande qualidade, não há razão para consumir água engarrafada. E também tem um impacto ambiental muito menor."

A especialista reforça ainda os "cuidados habituais": "Apenas usar o indispensável, fechar as torneiras, evitar tudo o que são gastos desnecessários, reutilizar água em casa."

E alerta para as "águas virtuais", ou seja, a água que não se vê, e que vem "incorporada nos produtos que usamos e nos alimentos": "Quando bebemos um café, por trás desse café, estão cerca de 130 litros de água. Um quilo de carne de vaca pode implicar até cerca de 15.000 litros de água. Também quando combatemos o desperdício alimentar podemos um papel importante na preservação deste recurso", finaliza.

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