Há coisas que nunca mudam: o prazer da leitura não se decreta e as crianças continuam a gostar de ouvir contar histórias. Mas os escritores tiveram que adaptar as ferramentas de escrita às exigências de uma sociedade que vive a um ritmo cada vez mais veloz e onde a atenção se dispersa cada vez mais.
Se temos um ritmo de vida alucinante, se as crianças do século XXI estão imersas em atividades extracurriculares e acham que dois minutos para aquecer a sopa no micro-ondas é imenso tempo, se se dispersam pelas redes sociais, se tudo mudou, a escrita, diz Ana Maria Magalhães, também teve que se adaptar.
Já não se faz "o que se fazia há 30 anos, com dois ou três capítulos para criar ambiente". Agora "ou se prende o leitor nas primeiras páginas ou ele vai abandonar a leitura".
Captar a atenção logo no início é essencial. Mas há coisas que nunca mudam, diz a autora da coleção "Uma Aventura". Há uma premissa que já era verdadeira há 30 anos e que se mantém inalterada: o gosto pela leitura não se impõe. Ou seja, não faz sentido nenhum, diz Ana Maria Magalhães, ter nas escolas livros de leitura obrigatória.
"A ideia de forçar as pessoas a ler livros de que não gostam é a vacina anti-leitura", sublinha. É a forma mais fácil da pessoa "decidir que não gosta de ler". A receita é ir dando vários livros à criança até que ela descubra um estilo de que goste.
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António Torrado diz que anda de terra em terra com essa missão de divulgar o prazer de ler e de ouvir ler. E conta um episódio recente durante uma sessão com as crianças. "Evoquei memórias e lengalengas e, no fim, uma menina dos seus 4 anos disse que queria perguntar-me uma coisa: O senhor quer ser meu avô?".
A pergunta enterneceu o escritor e revela a vontade que as crianças têm de que um adulto se debruce sobre elas e lhes conte uma história. É isso também que desperta o prazer da leitura. Se isso é igual ao antigamente, há outras coisas que se tornaram anacrónicas, sublinha o autor do best seller O Macaco de Rabo Cortado, que "tem uma série de personagens que foram vencidos pelo tempo, como a peixeira e o homem que faz guitarras".
"É fatal que haja anacronismos", considera António Torrado. "É o rodar das gerações que vai limando essas pequenas arestas". E para as crianças, as histórias, mesmo as dos tempos dos nossos avós, são sempre novas, porque "são sempre uma descoberta".