Xixi na rua: Não há tinta que chegue!

Beber é o verbo mais praticado, aos fins de semana, no Cais do Sodré. Quem lá vive, acorda ao sábado e ao domingo num imenso urinol. Usam tinta repelente para salpicar os persistentes.

A ideia foi da associação de moradores do Cais do Sodré e entrou no orçamento participativo da Junta da Misericórdia. Foram 10 mil euros em tinta para repelir os adeptos do "xixi aqui já". Começou este verão, a pintura de paredes que repelem a urina para cima de quem procura alívio na rua e a junta já decidiu alargar o projeto.

A repórter Dora Pires foi verificar se estas ruas de bares estão mais limpas, mas parece que é tanta gente e são tantos hectolitros de álcool vendidos por noite, que ainda não há tinta que chegue.

Carla Madeira, a Presidente da Junta da Misericórdia explica que só têm sido pintadas as áreas onde há moradores que o pediram..mas a tinta repelente vai avançar pela baixa da cidade.

A autarca vai para já duplicar a área a pintar, depois vai depender da avaliação dos moradores. Carla Madeira garante que a ideia está a suscitar o interesse de muitas autarquias por todo o país, autarquias que telefonam a pedir mais informações sobre a tal tinta que pode acabar com os urinóis de rua.

Reportagem de Dora Pires com sonoplastia de Gonçalo Coutinho

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É tinta hidrófoba, com fobia a líquidos, é repelente. Quem faz xixi nas paredes pintadas acaba com as calças e os sapatos molhados. A parede cospe. A tinta é invisível, é preciso passar pela experiência, ainda assim insistir, e ter boa memória para saber que paredes evitar no futuro.

Há noites que parecem de Santo António, milhares de pessoas sem espaço para "ir ali". Os bares só permitem idas a casas de banho aos seus clientes. A alternativa é a rua. E parece que seria preciso pintar tudo, com a tal tinta, paredes e passeios, ruelas e becos.

A avalanche de negócios de venda e álcool deixa cada vez menos a quem tem outras lojas. A senhora X, que tem medo de ser identificada para não ter ainda mais surpresas desagradáveis, conta que "é uma hora todos os dias, antes de abrir a porta, só para limpar isto tudo. Se fosse só xixi... Até tenho aqui uma máscara, quer experimentar?". Ali mais perto, a tinta mágica está na Rua dos Remolares, não chegou a esta travessa.

Junto ao Mercado da Ribeira há água suja, escamas e sangue, presume-se que de peixe. Não cheira bem, mas não cheira também, a urina. É o mesmo junto à Unidade de Saúde Familiar. As paredes estão sem manchas escuras, cheiinhas de grafittis. Mas sem cheiro.

A Igreja de S. Paulo é outra zona livre. Lá está o cartaz "Xixi na rua, não". Lurdes põe as chaves à porta com dificuldade em acertar na fechadura, "vivo mesmo aqui. Ali, está a ver? Ao pé daquele quiosque? Aquilo de vidro é uma casa de banho pública. Mas partem tudo, destroem tudo! Ao fim de semana isto é um cheiro que não se pode!"

"Deviam era ter casas de banho no meio da rua! E caixotes do lixo! Ora as pessoas vêm para aqui. Se querem que sejam civilizadas, têm de lhes dar condições para serem civilizadas", clama Bernardo, dono do Botequim da Ribeira. "Eu é que sei como é que ficam as casas de banho ao fim da noite... Isto da tinta é só uma invenção ao dinheiro: Se não for na parede é para o chão".

Subindo sempre, o Largo dos Stephens também parece zona seca. Mais acima ainda, no Largo Camões, há tabuletas a apontarem os sanitários públicos. Tabuletas da Junta de Freguesia da Misericórdia, que nem tudo se resolve com tinta. E nada a assinalar nas proximidades. Entrando no Bairro alto, o caso muda de figura.

"Só lhe digo isto...tenho 55 anos de Bairro Alto, isto é um bairro muito antigo. Mas antigamente, digo-lhe, preferia as prostitutas. Ao menos tinham-nos respeito. Agora esta juventude." Júlia abana a cabeça como quem sabe que está a assistir, conformado, ao fim do mundo, "digo-lhe, eu com esta idade, nunca vi tanta gaita de homem! Chegam ali, tiram a gaita para fora como quem puxa de um cigarro!". O cheiro? Do mal o menos, agora a falta de vergonha...

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