Celebrar o 1.º de Maio aos 83 anos: "É fazer aquilo que no tempo da outra senhora não tínhamos autorização"
José Manuel Rosado mantém a tradição de fazer uma sardinhada com os amigos na Alameda D. Afonso Henriques, em Lisboa, e revela à TSF que este ano foi surpreendido: "Agora, no 25 de Abril, nunca tinha visto tanta juventude nova. Não estava à espera daquilo"
Corpo do artigo
Aos 83 anos, José Manuel Rosado mantém a tradição de juntar-se à concentração da CGTP e comer uma sardinhada com amigos no 1.º de Maio.
"Foi uma sardinhada, seis sardinhas a cada um, acompanhado com vinho tinto", conta à TSF, sentado numa mesa de campismo com mais dois amigos. Já foram mais, mas os outros já morreram.
Ainda assim, José Rosado e os amigos mantêm a tradição: "Quase todos os anos é assim. Faz-se sardinhadas aqui."
Na Alameda D. Afonso Henriques, em Lisboa, o homem de 83 anos fala do Estado Novo, numa altura em que não se podia falar de política no quotidiano das cidades e das aldeias.
"É o convívio e fazer aquilo no tempo da outra senhora não tínhamos autorização de fazer. Entre famílias, só podiam estar com três pessoas cada uma. Se um casal tinha quatro ou cinco filhos, tinha que dividir, porque não podiam estar mais do que três pessoas em familiares e, portanto, tinha que ser dividido (...) Nós estávamos a comer, tínhamos de ter cuidado. Andavam sempre ali ou à GNR, ou a civil a ouvir aquilo que a gente estávamos a falar, se estamos a falar em política", explica.
E o ultramar deixou memórias bem vivas em José Manuel Rosado: "Fui para a guerra em 1963, estive lá na Guiné. Ao fim de três meses fui ferido, levei um tiro e vim para o hospital, no qual passei lá a minha mocidade. Seis anos no hospital, 19 cirurgias, intervenções plásticas. Passei lá a minha mocidade. Dei baixa em 1964 e tive alta militar, na junta militar, em 1970."
Mas a memória, aos 83 anos, também guarda momentos bonitos, como o primeiro Dia do Trabalhador em Liberdade, a 1 de maio de 1974.
"O 1.º de Maio ali no Estádio de 1.º de Maio, onde se encontraram os líderes que estavam exilados, foi uma manifestação com o estádio cheio, com aquela rua cheia. Foi uma festa, tudo ali a fotografar. Foi a maior. E depois ao seguir 25 de Abril, foi o. 1.º de Maio. Depois, começou-se a dividir", conta.
José Rosado faz uma crítica à atual classe trabalhadora do país, dizendo que esta já não é politizada como antes e como deveria ser.
"Hoje a classe trabalhadora não tem politização nenhuma. Os outros em que ainda há uma politização, são aqueles de antes do 25 de Abril e que se seguiram. Esta juventude quer é festas", aponta.
No entanto, reconhece que recentemente foi surpreendido: "Agora, no 25 de Abril, nunca tinha visto tanta juventude nova. Não estava à espera daquilo. Foi muito bonito este ano."
A esperança de José Rosado é que a nova geração mantenha vivos os ideais de Abril.