"Não me vejo, de forma alguma, como líder de transição." Mariana Leitão quer renovar equipa e regressar à taxa única de IRS
A candidata única à liderança da Iniciativa Liberal promete "caras novas" e quer cumprir "pelo menos" um ciclo político. Crê que a moderação fiscal pode ter prejudicado a IL, não compreende como se pode reformar o Estado sem uma revisão constitucional e garante ter "orgulho" no percurso profissional ligado à Sonangol
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Mariana Leitão, 42 anos, já foi gestora, deputada municipal em Oeiras e chefe de gabinete no Parlamento. Foi eleita deputada há apenas um ano, chegou a líder parlamentar, candidata presidencial durante escassos quatro meses porque desistiu para concorrer à liderança da Iniciativa Liberal.
Cinco líderes em oito anos, é um excesso de renovação ou é demasiada instabilidade para um partido ainda tão jovem?
É normal num Partido dinâmico em que as pessoas não estão agarradas aos cargos. Os vários líderes que tivemos ao longo do tempo na Iniciativa Liberal foram pessoas fundamentais para o desenvolvimento, para o crescimento da IL, mas sempre o fizeram de uma forma desapegada ao poder e aos cargos e a essa lógica de permanência durante muito tempo e, portanto, eu acho que é perfeitamente normal num Partido dinâmico e cá estaremos para continuar o trabalho que foi feito por esses vários presidentes.
Mas não dificulta a identificação do eleitorado numa altura em que a política parece estar tão personalizada nas lideranças?
Nós acreditamos muito que as ideias devem prevalecer acima dos indivíduos, porque a verdade é essa, nós temos um programa muito sólido, propostas muito concretas, que defendemos desde sempre, com pequenos ajustes aqui ou acolá, para também nos irmos adaptando àquilo que vai ser a dinâmica da própria sociedade e às necessidades dos portugueses, mas o corpo central dessas ideias mantém-se inalterado. A verdade é que a Iniciativa Liberal teve já vários líderes, mas há três ou quatro ideias centrais que a Iniciativa Liberal pôs na agenda que hoje em dia já não saem dessa agenda. Foi a Iniciativa Liberal, o primeiro partido, a falar da necessidade de termos políticas públicas que promovam o crescimento económico, a redução de impostos como forma de não só promover esse crescimento económico, mas também como forma de aliviar as pessoas, para que as pessoas possam ter um melhor poder de compra. A reforma do Estado, algo que a Iniciativa Liberal, desde a sua fundação, tem falado sobre a necessidade de haver uma reforma profunda do Estado, que sabemos que hoje em dia está disperso num conjunto alargadíssimo de áreas que, em muitos casos, não serve às populações e que nós queremos que, obviamente, seja muito mais focado nas áreas em que, de facto, faz falta e onde tem falhado, nomeadamente a saúde e a educação. Portanto, quando temos estas ideias tão marcadas e que fizeram um caminho em que hoje em dia já toda a gente fala nelas, sabemos que temos feito um caminho produtivo nesse aspeto e temos marcado a agenda e eu acho que isso é o fundamental.
Já disse que tem um plano e uma estratégia para a liderança da Iniciativa Liberal, quando pensa nesse plano, que horizonte temporal é que estabelece? Já pensou, por exemplo, completar esta legislatura como líder da Iniciativa Liberal?
Obviamente que agora candidato-me e o objetivo é, pelo menos, fazer este ciclo político que é, para já, porque mudou drasticamente o ciclo político e houve aqui uma transformação, que exige também uma adaptação àquela que é a realidade atual. Acho que é importante também haver pelo menos a concretização de uma legislatura, isso sem dúvida, e conseguirmos responder aos desafios que virão a seguir ao fim desta legislatura, sem dúvida.
Não receia poder ser uma espécie de líder de transição, permita-me a provocação? Não está aqui a ser o lugar para, por exemplo, Bernardo Blanco que já disse que ambiciona ser líder da Iniciativa Liberal?
Eu não vejo as coisas assim, quando eu me apresentei como candidata à liderança da Iniciativa Liberal, fi-lo com toda a convicção, com a consciência de que posso, de facto, trazer valor acrescentado, e com a noção clara de que é preciso nós também sabermos nos posicionar face a estas alterações no ciclo político que existiram, em que é preciso, de alguma forma, também, recuperar alguma da irreverência, algum deste espírito combativo, vincadamente defensor das ideias liberais, e é isso que eu quero trazer para cima da mesa. E, portanto, ao fazê-lo de forma competente e de forma dedicada, não me vejo de forma alguma como uma líder de transição, irei, obviamente, apresentar uma moção de estratégia global, que terá uma estratégia para lidar com estas alterações que foram ocorrendo, com aquilo que são as ideias que eu acho que devem vincar este mandato da comissão executiva na Iniciativa Liberal, e, portanto, agora os membros também terão a possibilidade de dar a sua palavra, de mostrar a sua confiança e o seu apoio a essa moção de estratégia global, e depois o futuro, lá estará e cá estaremos também para lidar com ele. Mas não olho para as coisas dessa maneira, não olho para isto como agora vou fazer aqui uma liderança de transição, não, eu estou mesmo a querer fazer uma liderança de futuro, e não uma liderança de transição.
Mas sendo pública a ambição que Bernardo Blanco já explicitou de querer, um dia, ser líder da Iniciativa Liberal, não sente que isso poderá ser uma sombra no seu mandato?
De todo, é perfeitamente normal, legítimo e desejável que haja pessoas que ambicionam serem líderes da Iniciativa Liberal, é sinal de que há um futuro, de que há pessoas com vontade em contribuir e essas pessoas serão sempre bem-vindas, seja em que momento for, portanto, isso não me causa qualquer tipo de questão, ou problema, ou de dúvida, ou sombra, nada nessas questões. É ótimo que assim seja, bem pior seria que não houvesse pessoas com essa ambição e com essa disponibilidade. Trabalhei vários anos com o Bernardo Blanco, é uma pessoa que eu não só estimo muito, como admiro, uma pessoa com enormes capacidades, e portanto, ainda bem que tem essa disponibilidade e que tem essa ambição.
Até agora parece ser candidata única, isso traduz-se como um sinal de alguma unidade ou não houve tempo para as outras candidaturas, eventualmente adversárias, avançarem?
Tempo houve, porque entre o anúncio da demissão de Rui Rocha e a data da apresentação das candidaturas, tivemos mais de um mês para poder fazer esse trabalho e para desenvolver a moção de estratégia global e fazer uma equipa, etc. Eu senti, de facto, muito apoio na altura da demissão de Rui Rocha, e ainda antes de eu ter tomado a decisão de apresentar a candidatura.
Foi logo um dos nomes que foi colocado em cima da demissão.
Sim, e senti mesmo muito apoio das bases, de pessoas que voluntariamente e espontaneamente se dirigiram a mim e me deram muito apoio com essa vontade de que eu avançasse, o que foi obviamente um estímulo muito grande e muito relevante na minha tomada de decisão, e portanto eu estou muito confiante de que a minha candidatura será, de facto, uma candidatura que permitirá essa união que tanta gente fala e que é importantíssima, sem dúvida, e acho que na altura da apresentação da minha lista à comissão executiva e da própria demissão de estratégia global, ficará muito visível que há, de facto, essa vontade, pelo menos minha, de dar passos nesse sentido. É preciso, depois também, que os restantes deem esses passos.
Está a responder a críticas que vão sendo reincidentes de algum fechamento da direção sobre si próprio, ou de haver alguma dificuldade, às vezes, das vozes mais críticas poderem expressar-se dentro da Iniciativa Liberal?
Eu compreendo as críticas todas, mas há umas que concordo mais, outras que concordo menos. Nesse caso, considerando, por exemplo, os conselhos nacionais, em que as pessoas podem estar lá, dizer aquilo que bem lhes apetece, fazer as críticas todas, como acontece em inúmeros conselhos nacionais sobre os vários temas, há esse espaço, os próprios membros têm essa possibilidade e fazem-no com frequência em vários fóruns, com aquilo que pensam, com a forma como acham que as coisas devem ser feitas, e por aí fora. Agora, é óbvio que há contributos que são dados, que são aproveitados, porque de facto têm essa validade, há outros que, não estando dentro da estratégia que está pensada, não são aproveitados, digamos assim, mas não deixam de ser ouvidos. Portanto, eu acho que essa crítica de fechamento, considerando que nós temos neste momento representantes por tudo quanto é sítio em todos os parlamentos, vamos ter agora também nas autárquicas um aumento significativo, ao menos assim espero, de representantes da iniciativa liberal, um aumento progressivo do número de membros que entram para a iniciativa liberal e números processos que contaram com contributos dos membros, desde o programa político, as revisões estatutárias, todos esses processos são feitos de forma aberta e colaborativa, e portanto, as pessoas podem de facto dar as suas opiniões, essas opiniões, os seus contributos, tudo isso é tido em conta, agora, é óbvio que há uns que vão ao encontro daquilo que é a estratégia da direção, há outros que não, e as pessoas também têm de saber aceitar as duas situações.
Nesta convenção que vai acontecer a 19 de julho, só está em causa a mexida no topo da estrutura do partido, ou seja, no núcleo dirigente. Vai haver mudanças, vai introduzir nomes novos?
É um processo que está obviamente em curso, porque tem de ser apresentado, se não me engano, na sexta-feira, é óbvio que vai haver algumas alterações, mas coisas mais concretas eu vou deixar para depois...
Pode dizer se vai haver renovação ou não nesse núcleo duro de aconselhamento da liderança?
É óbvio que vai haver renovação. Há um caminho que tem sido feito, há o próprio perfil do líder, e portanto isso tudo também estará expresso, não só na moção de estratégia global, mas também na composição da comissão executiva, que não é um núcleo tão restrito, estamos a falar de 25 pessoas, ou pelo menos o que está previsto nos Estatutos...
Tem os vice e depois os vogais também...
Sim, claro, e é óbvio que haverá renovação, e haverá caras novas, e haverá pessoas com várias sensibilidades também a serem incluídas, porque esse pluralismo também é importante, e que eu estou a tentar também, que dentro dessa comissão executiva ele exista, e também, e no encontro dessa ideia de renovação, que também é importante, porque eu estou a começar um ciclo novo, sou uma putativa líder nova, também com algumas ideias novas, e portanto é importante também ter isso à minha imagem, digamos assim, ou de acordo com aquilo que eu acho que é importante neste momento para o partido, e é isso que vou obviamente apresentar.
Mudanças na liderança da bancada, que agora é ocupada por si, também são de esperar depois de 19 de julho, não antes?
Antes não.
Está preparada para um maior escrutínio? Ultimamente surgiram notícias ligadas ao seu passado profissional.
É algo perfeitamente normal, é algo que já era expectável, o escrutínio é fundamental em política, é normal que seja feito, desde que seja feito de forma objetiva, ouvindo as pessoas, e portanto eu tive a possibilidade de responder a várias questões que me colocaram e isso acho que é fundamental, porque não se pode só fazer notícias com base em ideias soltas, sem se falar concretamente com as pessoas. Eu não tenho absolutamente nada a esconder, muito pelo contrário, tenho muito orgulho em tudo aquilo que fiz ao longo da minha vida profissional, e portanto estou obviamente perfeitamente à vontade e completamente disponível para responder a todas as questões, como tenho estado até agora, sobre a minha vida, sobre aquilo que fiz, não tenho qualquer tipo de problemas, e acho que é normal, é perfeitamente normal que assim seja, eu sabia já que, à medida que fosse dando alguns passos, que é normal que haja esse escrutínio, e todas as pessoas que estão em cargos públicos têm de ter essa noção de que é normal que haja o escrutínio
Estamos a falar do seu percurso profissional que passou por uma empresa ligada ao universo da Sonangol...
É um percurso profissional perfeitamente normal, onde eu trabalhei muitos anos até numa área que me deu particular satisfação e orgulho de trabalhar, porque era um programa de gestão de bolsas de estudo, de jovens angolanos que vinham para o nosso país para estudar, muitos que até tinham situações financeiras muito complicadas, e portanto era a possibilidade de não só dar um futuro a esses jovens, mas também contribuir de forma decisiva para o desenvolvimento do próprio país, porque estes jovens depois de concluírem os seus estudos regressariam à Angola para poderem lá ser inseridos no mercado de trabalho. Portanto, tenho muito orgulho nesse meu percurso profissional, exatamente porque teve esta componente também de, de alguma forma, ser decisivo em dar um futuro a jovens que de outra maneira não teriam esse futuro e provavelmente dificilmente sairiam da situação de pobreza, em muitos casos em que se encontrava.
Regressando à moção de estratégia que leva agora a votos dentro do partido. Como é que vai posicionar a Iniciativa Liberal, agora que falhou o objetivo de levar o partido a fazer parte de uma solução do governo?
É óbvio que todos os partidos têm a ambição de ter um papel governativo, faz parte, o desenvolvimento normal de um partido assim deve ser. Agora é preciso que haja, de facto, condições eleitorais, e quando eu falo disso é de votos, que permitam que essa negociação para uma solução de governo traga benefícios para o país, nomeadamente na implementação de soluções e de políticas liberais, e esse tem de ser o foco da Iniciativa Liberal, ter um programa muito sólido, que tem, mas que em algumas matérias moderou...
No campo fiscal, por exemplo?
Sim, e eu aí acho que essa moderação, a moderação pode nos ter prejudicado, no sentido em que há uma estratégia e há uma visão para o país, que nós defendemos há bastante tempo, que passa por, e sabemos que é ambicioso o corte fiscal que queremos fazer, mas também é muito ambicioso a reforma do Estado que queremos fazer. Estas duas situações têm de andar em paralelo, porque nós para conseguirmos ter um orçamento que permita que haja essa baixa fiscal para as famílias, para as empresas, precisamos de facto de equilibrar as finanças pelo lado da reforma do Estado, e aí nós temos uma visão muito diferente dos restantes partidos.
Mesmo da AD?
Mesmo da AD. A AD agora criou um ministério concretamente para a Reforma do Estado, que é uma ideia que obviamente subscrevemos, faz todo sentido, mas fica a dúvida até onde é que vão essas reformas? Será que o partido que, por exemplo, fez um conjunto de alterações ao nível dos conselhos de administração na área da saúde, que tirou algumas pessoas, algumas delas até competentes para pôr em outras que faziam parte, supostamente, do universo de pessoas que andam ali à volta da AD, será que vai mesmo conseguir ir a fundo nesta reforma do Estado e limpar todos aqueles organismos que existem no fundo para alimentar a máquina, para colocar pessoas ligadas ao partido em alguns cargos e distribuir, o que chamamos normalmente de distribuição de lugares para os boys, será que vai até aí? Será que vai mesmo haver uma análise profunda àquela que é a nossa Administração Pública, o número de funcionários que temos, o que é que eles estão a fazer, será que vai haver mesmo a implementação de uma lógica de mérito na administração pública, há um conjunto de dúvidas que subsistem. O governo faz algumas promessas, nós cá estaremos também para fazer o escrutínio e para perceber se vão mesmo levar em prática. E portanto, isto são tudo coisas que se combatem, mas não se combatem com umas medidas aqui pontuais, aqui e acolá, uns remendos, não, tem de haver mesmo uma transformação grande da forma como tudo isto funciona.
E neste cenário, como é que viu a intenção do governo de garantir que haja uma redução fiscal agora no verão? É uma dessas medidas de fundo ou é apenas um retoque?
De fundo? Nós estamos a falar de, se não me engano, uma pessoa que recebe 1.200 euros por mês, com esta proposta do governo, a redução que vai ter ao fim do mês são de 4 ou 5 euros, mas o que é que uma pessoa que ganha 1.200 euros, tem de pagar uma casa, uma renda, um empréstimo, o que seja, tem de comer, tem de pagar água, luz, e as suas despesas do dia-a-dia, em que é que 5 euros vão resolver a vida desta pessoa?
Portanto, podemos esperar, sob sua liderança, uma Iniciativa Liberal de regresso à proposta de uma redução fiscal mais acentuada, nomeadamente da chamada flat tax, como no início?
Sim. Tem de haver uma lógica em que há um compromisso grande com aliviar as famílias e as empresas, e ao mesmo tempo, porque isto tudo tem de equilibrar, nomeadamente em termos orçamentais, que há uma profunda reforma do Estado, e essa reforma do Estado tem de ser ambiciosa, e essa reforma do Estado tem de acabar com tudo o que é organismos duplicados, com todo o setor empresarial do Estado, que é uma coisa completamente distópica, o Estado tem participações em empresas com atividades que não fazem qualquer sentido, hostels, talhos, coisas do género, mas isto não faz sentido nenhum, portanto, o setor empresarial do Estado é algo também que tem de ser profundamente reformado. É preciso privatizar a TAP, por exemplo, que é algo que já falamos há anos, gastaram-se 3 mil milhões de euros já, mais até entretanto, anda-se a falar disto há não sei quanto tempo, para avançar com a privatização, não vemos nada a acontecer.. Isto é urgente, portanto, tirar do Estado tudo aquilo que é supérfluo e que não contribui em nada para a vida das pessoas, e focar o Estado naquilo que interessa e onde tem falhado de forma profunda, nomeadamente o caso da saúde, que me parece ser o mais gritante.
A IL vai, aliás, avançar com uma comissão de inquérito parlamentar. Se não tiver o apoio, pondera torná-la potestativa, ou seja, obrigatória, mesmo que todos os outros contrariem?
Temos de ponderar isso, mas para já, eu acho que é importante fazermos esta discussão na Assembleia da República, e eu tenho a convicção de que os restantes partidos terão todo o interesse também em apoiar esta iniciativa, porque nós não estamos aqui... Há um problema grave com o INEM, sabemos disso, vimos o que aconteceu com a greve, vimos que a senhora ministra trouxe a si a pasta do INEM e que disse que ia dedicar 70% do seu tempo ao INEM, portanto, passaram-se estes meses, eu não vi absolutamente alteração nenhuma a ser feita no INEM, não houve nada, uma proposta, uma alteração, uma mudança de orgânica, nada. Sabemos que o INEM funciona na base de voluntarismo, há uma escassez enorme de recursos humanos no INEM, há falta de equipamento, há falta de recursos, e portanto quando vemos que isto acontece há anos sem que nada seja feito, o objetivo de uma CPI é perceber, no fundo, onde é que estão, além das responsabilidades políticas, obviamente, estamos a falar da morte de uma pessoa, pelo menos com relação direta com a greve que aconteceu, e portanto é preciso apurar as responsabilidades políticas também disso, porque as restantes serão para as instâncias próprias. Agora, além disso, é preciso perceber a fundo quais são os problemas do INEM e para conseguirmos com isso encontrar as soluções que permitam ao INEM funcionar bem, porque é aqui que o Estado não pode falhar, é na proteção da vida, ou no auxílio ao socorro das pessoas que o Estado não pode falhar, e tem falhado sucessivamente. O Estado não pode ter urgências fechadas, o Estado não pode ter grávidas a percorrerem centenas de quilómetros para conseguirem ser atendidas, o Estado não pode pôr as pessoas simplesmente em situação de urgência, em que estão, obviamente, muitas vezes em pânico, preocupadas, a terem de estar em lista de espera para um call center. Isto tem de mudar radicalmente.
A Iniciativa Liberal vai assumir mais um papel de maior oposição do que propriamente de um parceiro potencial de AD?
A nossa postura será exatamente a mesma em relação às outras legislaturas. As propostas que forem ao encontro da resolução dos problemas das pessoas de forma objetiva, concreta e em que se perceba de facto que aquilo está a ir no caminho certo, terão o nosso apoio, independentemente de onde venham, seja do governo, seja dos partidos da oposição. As propostas que forem contrárias a isso, ou que se desviarem completamente do foco da solução, ou que forem antagónicas àquela que é o pensamento da iniciativa liberal, é óbvio que aí não contarão com o nosso apoio. Portanto, a nossa postura em relação à AD será, obviamente, de escrutínio absoluto, oposição construtiva, porque também queremos apresentar muitas propostas que possam ajudar o governo a ir ao encontro das soluções necessárias para mudar a vida das pessoas. A palavra reformar, parece que era um tabu, no sentido em que falava-se muito dela, mas depois ela na prática nunca acontecia, e portanto nós agora queremos que ela aconteça, nomeadamente no Estado, e iremos obviamente instigar o governo para isso, apresentando também as nossas propostas nesse sentido, que são sem dúvida muito mais ambiciosas que as do governo, mas também vou dar obviamente o benefício da dúvida, porque o governo acabou de tomar posse há relativamente pouco tempo, e é preciso que agora também se veja o que é que será o trabalho dos próximos tempos.
Como é que viu a posição de Luís Montenegro ao remeter muito lá para a frente uma eventual revisão constitucional, que tinha sido proposta pela Iniciativa Liberal logo a seguir às eleições?
Eu fiquei um bocadinho intrigada com essa afirmação, porque inclusive, mudar a Constituição não é suposto ser uma coisa dantesca, é um processo perfeitamente normal, não vamos retirar direitos às pessoas, não se vai atentar contra direitos, liberdades e garantias, não é nada disso que está em causa agora. Nós temos uma Constituição que, em algumas matérias, está bastante desfasada daquela que foi a evolução que nós fomos tendo ao longo do tempo, considerando que ainda lá temos, só para dar um exemplo, uma coisa em que o poder económico tem de estar submisso ao poder político. Ora, isto é o contrário daquilo que nós, pelo menos na Iniciativa Liberal, achamos que deve ser, deve haver uma total independência entre o poder político e o poder económico.
Os motivos não são mais de vontade política do que, propriamente, do que está escrito na constituição?
Não, por exemplo, no caso da saúde e da educação, quando a nossa constituição assume que a prestação do serviço, quer de saúde, quer de educação, tem de ser exclusivamente do Estado, ela não impede que haja privados, isso aí, sem dúvida, mas pressupõe que o serviço público é prestado pelo Estado. Ora, nós achamos que o serviço público tem de ser garantido pelo Estado, não há dúvida nenhuma aí, mas a prestação do serviço não precisa de ser exclusivamente do Estado, e isto na saúde e na educação é fundamental, na saúde para garantir que acabamos com as listas de espera, garantimos o acesso, garantimos mais atendimento às pessoas, até em piores, na educação para garantir igualdade de oportunidades, porque neste momento, por exemplo, na educação, aquilo que nós temos, que são as pessoas, no fundo, obrigadas a irem para as escolas de acordo com o seu código postal, em vez de irem para as escolas de acordo com as suas reais necessidades, daquele aluno em concreto, também é uma limitação à igualdade de oportunidades, e portanto, estas duas matérias, em particular, são matérias muito relevantes que é preciso também acautelar na Constituição para garantir que, de facto, o Estado garante o serviço, garante o acesso ao serviço, mas não precisa de ser o único prestador. E, portanto, é óbvio que se queremos reformar, se queremos, inclusivamente, reformar o Estado, garantir uma maior independência, por exemplo, no caso das nomeações para determinados cargos, porquê que eles vão ser nomeações? Porquê que o governador do Banco de Portugal há de ser nomeado? Porquê que não é um concurso público, internacional até, que as pessoas possam concorrer e ganham o melhor? Toda esta dinâmica, que para nós é muito relevante, que garante essas alterações que é preciso serem feitas ao nível do Estado, também, passa por uma revisão da Constituição, e daí também a nossa urgência nesta matéria. Não queremos populismos, não queremos entrar aqui em discussões pífias.
Mas a discussão acaba por ser também influenciada por outras propostas, não é?
Claro, mas essas propostas estão condenadas à partida, porque é óbvio que os restantes partidos, moderados, democráticos, etc., nunca vão permitir que passem determinadas coisas que são completamente estapafúrdias ou que ponham em causa direitos, liberdades e garantias. Não precisamos de ter medo, precisamos é de pensar o que é que nós queremos alterar e dar os passos para isso. Eu percebo, Luís Montenegro diz que não é uma prioridade, mas pronto, vamos ver como é que ele vai conseguir fazer uma verdadeira reforma do Estado sem colidir em nada com a Constituição. E até porque era um processo que já estava em curso. E foi interrompido. Já estava praticamente concluído e era importante retomar esse processo, fazer uma nova análise daquilo que é necessário mudar, fazer as mudanças necessárias, para que depois a própria reforma do Estado, a própria organização de como tudo isto funciona, se puder adaptar.
A campanha autárquica vai ser o seu primeiro grande teste, se caso seja eleita líder. Desta vez a Iniciativa Liberal vai concorrer em mais locais, ou em coligação com a AD ou em coligação com o PSD. Isso traduz alguma dificuldade da Iniciativa Liberal de avançar sozinha ou é uma estratégia para tentar conseguir vitórias em locais onde, sem esses entendimentos, tal não seria possível?
Esse processo, que obviamente eu, ganhando as eleições internas, vou respeitar integralmente tudo aquilo que já está acertado, não está em momento algum em causa. A estratégia parece ter sido bem montada, no sentido em que, e o Rui Rocha disse isto várias vezes, que as coligações deviam ser coligações vencedoras. A expectativa nas coligações que temos é que elas de facto vençam. E é óbvio que vencer implica termos pessoas nossas da Iniciativa Liberal a entrarem para executivos, a entrarem para as assembleias municipais, a entrarem para as assembleias de freguesia, a constituírem executivos também nas juntas de freguesia, e portanto, do ponto de vista das pessoas, claro que as temos, tanto que as temos que nas coligações em que pode haver essas vitórias, e que eu estou muito convicta de que vão existir, estas pessoas farão parte desses executivos. E considerando que no caso das autárquicas, a lógica é, quem ganha a eleição, ganha o executivo, é óbvio que há uma mais-valia nesse tipo de coligações autárquicas do que há em qualquer outro ato eleitoral do país. Será também uma boa forma de termos uma maior implementação no território, de termos as nossas pessoas a conseguirem trazer para os municípios propostas liberais, a termos propostas liberais e ideias e os vários programas que nós temos com um cunho liberal, também a serem uma realidade nos vários municípios.
E a meta é superar o resultado das últimas autárquicas da Iniciativa Liberal?
Claro, eu acho que vamos ter esse crescimento, sem dúvida, e acho que vamos ter muitas pessoas eleitas, e isso será um momento também de grande transformação para o partido, e para o qual nós também temos de garantir preparação e garantir que damos resposta a esse desafio, mas eu tenho a certeza que vamos ter um resultado superior ao que tivemos nas últimas autárquicas, com muitas pessoas eleitas por vários sítios, nós temos muitas candidaturas, muitas também candidaturas próprias. Vamos a vários municípios, mais do que fomos no passado, e portanto tudo isso mostra também o crescimento que tem havido da Iniciativa Liberal.
Em Lisboa, desta vez a IL está disponível para um entendimento com Carlos Moedas, Já foi muito crítica, apresentou reservas à forma como Carlos Moedas estava a gerir os destinos de Lisboa. O que é que mudou agora para a Iniciativa Liberal já ponderar um entendimento?
Nós criticarmos, mas não é questão de ter mudado nada. É óbvio que os executivos têm muito a melhorar, nomeadamente o de Lisboa, e teve vários problemas em que precisa de melhorar. Provavelmente numa eventual coligação em Lisboa, o que é que pode acontecer é que a Iniciativa Liberal consiga de facto trazer um ímpeto diferente, garantir uma lógica de gestão diferente e com isso ter um contributo decisivo para melhorar a vida das pessoas. No fim do dia é isso que nós queremos.
Em que áreas é que poderia haver melhorias?
Eu acho que nesta lógica da reforma, que também passa por haver uma lógica na própria gestão dos municípios, do peso que estes vários organismos municipais têm, também poderemos dar um contributo muito relevante para diminuirmos, no fundo, as ineficiências, para garantirmos que os orçamentos são melhor geridos, que não há tantos desperdícios. É isso, sem dúvida, que também poderemos dar um cunho importante. Mas no caso concreto de Lisboa, considerando, e eu sempre disse isto, a perspetiva de uma frente de esquerda, temos obviamente de olhar aí, não podemos ser indiferentes a isso. Havendo essa frente de esquerda, faz-me sentido que haja uma coligação com Carlos Moedas, garantindo, lá está, que as nossas propostas, a nossa visão, também é implementada e considerada nessas negociações.
E com peso na vereação?
Claro.
Com peso igual ou inferior ao que tem o CDS?
Esses detalhes deixo, obviamente, para os núcleos, são eles em primeira instância, que gerem esses processos e que saberão o que é que é melhor nessa negociação. De forma alguma a presidente do partido se vai intrometer.
Mas percebeu que durante a campanha foi dito que poderia haver ciúmes por parte do CDS em relação, à perspetiva de a IL poder ir para o governo...
Sim, mas isso é um problema do CDS, não é um problema da Iniciativa Liberal. A Iniciativa Liberal faz as suas negociações de acordo com aquilo que é o seu peso, de acordo com aquilo que são as suas ideias para os vários municípios e do peso que cada núcleo também quer ter e as pessoas que têm, tudo mais. Isso é um problema do CDS, não tenho que estar sequer a comentar as birras do CDS...
Depois das eleições autárquicas, haverá presenciais, o seu lugar como candidata apoiada pela IL fica livre, quando é que vai haver uma decisão sobre se há ou não candidatura?
Primeiro vamos passar por este processo interno, para o qual também já faltam só algumas semanas, dia 19 de julho já haverá a convenção e depois, obviamente, teremos tempo...
Mas não vai ficar o espaço não vai ficar vago?
Eu não gostaria que ficasse vago, eu sempre fui uma defensora de que a Iniciativa Liberal devia apoiar um candidato que representasse as ideias liberais. Mais uma vez, até à data, continua-se sem aparecer um candidato que cumpra esse critério e, portanto, nessa circunstância, é óbvio que tudo faremos para ter o nosso candidato. E temos várias pessoas que fariam, sem dúvida, uma...
Dentro da Iniciativa Liberal?
Claro, com certeza que sim.
Também é uma jogadora de bridge, chegou até a representar Portugal em competições. Na jogada política com o atual governo, jogaria na mesma equipa, sentada de frente para Luís Montenegro, ou na equipa do outro lado?
Isso vai depender muito de Luís Montenegro e daquilo que for a governação. Nós estaremos sempre disponíveis para apoiar mudanças objetivas que permitam mudar a vida das pessoas para melhor. Aí estaremos sempre a jogar frente a frente. Se não for esse o caminho, se continuarmos sem a ambição que é necessária, sem vermos as mudanças necessárias para alterar o rumo do país, que neste momento está completamente estagnado, sem haver mudanças, sem haver reforma do Estado, sem haver reforma da saúde, com um conjunto alargado de problemas, se continuarmos aí, obviamente aí estaremos a jogar como adversários.
E tem tido tempo para jogar agora?
Não, desde que vim para a política que não jogo, é impossível, não tenho mesmo tempo.