Cem funcionários pedem para sair da AIMA. Há quase 500.000 processos pendentes
A AIMA aponta para a existência de, pelo menos, cerca de 460 mil processos em curso. Quando o SEF foi extinto, havia ainda em espera mais de 3200 processos de proteção humanitária, quatro mil pedidos de asilo e quase 15 mil para a obtenção de nacionalidade
Corpo do artigo
Cem funcionários da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) pediram para sair do organismo. O retrato consta do relatório da agência sobre a recuperação das pendências do SEF, elaborado durante este mês de maio e a que o Expresso teve acesso.
O documento revela que o novo organismo entrou em funções em outubro com apenas 714 funcionários. Depois, saíram vários efetivos, que não foram compensados pelas entradas na AIMA. O relatório confirma que existem vários pedidos de mobilidade, o que significa que vão sair, em breve, cerca de uma centena de trabalhadores.
O “défice de recursos” é ainda mais grave, tendo em conta o número de pedidos herdados do SEF. A AIMA aponta para a existência de, pelo menos, cerca de 460 mil processos em curso. Quando o SEF foi extinto, havia ainda em espera mais de 3200 processos de proteção humanitária, quatro mil pedidos de asilo e quase 15 mil para a obtenção de nacionalidade.
Para compensar a saída dos 100 trabalhadores, a AIMA tenta recrutar novos funcionários com vários concursos dentro da Função Pública.
O presidente do Sindicato dos Funcionários do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SINSEF) não confirma os números avançados pelo Expresso, mas, em declarações à TSF, Artur Girão avisa que se os números se confirmarem vão afetar o funcionamento da agência.
"A verificarem-se os números, evidentemente são números elevados e vão certamente afetar o funcionamento da agência. Não tenho confirmação de que efetivamente seja esse o número, mas a verificarem são números que vão deixar algumas dificuldades na agência", sublinha.
É com expectativa que o sindicato aguarda as novas medidas do Governo destinadas à política migratória. "Sabemos que no início da próxima semana vai ser apresentado já o novo projeto para as migrações e, portanto, temos alguma expectativa nessa apresentação. Nós já dissemos várias vezes que o reforço de recursos humanos e o fator tecnológico vão ser essenciais para a resolução desta questão. Não há forma de dar a volta a isto", diz.
Artur Girão apela uma mudança de estratégia para gerir os recursos humanos da AIMA e a resposta aos imigrantes. "Há que adotar uma estratégia diferente. Temos de ter uma avaliação da legislação que temos: se se adapta ao atual fluxo migratório. Acho que há três vetores essenciais, o reforço de trabalhadores, o reforço das condições dos trabalhadores que cá estão e o fator tecnológico e, sobretudo, olhar para a lei de imigração e perceber se podemos ajustar ao mercado de trabalho atual e à forma e às necessidades que o mercado de trabalho apresenta. Depois, criar uma verdadeira política migratória que, até ao momento, ainda não temos."
O presidente do SINSEF lamenta que as migrações sejam hoje uma arma de arremesso político. "Esperaria até que o tema das migrações fosse um tema para ser discutido na Europa, porque a questão das migrações é um tema da Europa inteira, não é um tema de Espanha, nem da Grécia, nem dos países do Sul, é um tema de todos os países da União Europeia. Preferia que não fosse tratado como arma de arremesso, mas sim como vetor estratégico para o desenvolvimento do continente europeu", acrescenta.
O relatório destaca ainda a herança de 3 mil afastamentos coercivos de imigrantes que entraram ou permaneceram ilegais em Portugal. "Foi necessário um esforço (ainda em curso) de reconstituição do estado de análise, atenta a inexistência de uma base de dados que indique o estado de cada processo. Até ao momento, foi possível inventariar os processos de 2022 e 2023, num total de 508", refere o documento citado pelo Expresso, que diz que estes números pecam por defeito.
"Lá não estão, por exemplo, os pedidos de vistos gold, as autorizações de residência para estudantes ou as realizadas no âmbito do reagrupamento familiar", acrescenta.
No relatório, a AIMA reconhece ainda que "não é possível identificar de forma simples e fidedigna o número de processos pendentes" com a informação que consta das bases de dados.
Já o tempo de espera dos imigrantes é mais fácil de aferir. A maioria dos processos foi iniciada a partir de 2017 e há seis de data anterior, ainda sem resposta, incluindo um de 2008 e um de 2009, escreve o jornal, que indica que as fragilidades da informação do sistema são repetidamente referidas no relatório.
A AIMA fala da "obsolescência da infraestrutura tecnológica" que exigiu "significativas intervenções corretivas e de manutenção para assegurar a capacidade de resposta e os padrões mínimos de cibersegurança e de segurança da informação".
Na semana passada, o Governo anunciou que vai rever o modelo institucional de fiscalização dos imigrantes, considerando uma "asneira" o modo como a AIMA substituiu o extinto SEF.
"Portugal tinha uma instituição, a instituição foi eliminada, os seus recursos humanos foram distribuídos por várias instituições", uma decisão criticada por vários partidos e organizações, disse o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, que prometeu, para "as próximas semanas" o anúncio das medidas para setor, que inclui uma "correção também no domínio institucional", sem se comprometer com a manutenção da AIMA.
  
