Sebastião Bugalho, 28 anos, estudou ciência política, foi comentador na CNN Portugal e depois na SIC até há pouco tempo, foi colunista no Expresso e no DN, assinou artigos no Observador, foi jornalista alguns anos, nomeadamente no jornal i. Leia aqui a entrevista no TSF Europa
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Neste ofício há quem diga que “uma vez jornalista, para sempre jornalista”… é assim que se sente Sebastião, ou foi tão pouco tempo que não deu para aquecer o lugar?
É uma boa pergunta. Eu acho que há parte das nossas vocações que nunca nos abandonam. Eu não vou ser hipócrita consigo, eu gostei muito de ter a minha profissão. Não sinto que esteja desanimado, pelo contrário, estou muito entusiasmado com a campanha, a campanha está a correr bem, estou muito orgulhoso e muito confiante com aquilo que estamos a fazer. Mas para não fugir à sua pergunta, eu gostei muito daquilo que fiz.
Os meus dois pais são jornalistas, eu cresci no meio de redações, tenho amigos jornalistas e obviamente que o espírito de serviço público da política é algo que me atrai e que me engrandece e estou a tentar fazê-lo neste momento, mas eu também acredito no jornalismo e na liberdade da imprensa como uma forma de serviço público. E não lhe estou a dizer isso só por estar aqui à sua frente.
No CDS também esteve pouco tempo, no jornalismo acabou por estar poucos anos, é uma pessoa que se cansa facilmente?
Eu estou cheio de energia. Repare, eu tenho mais ou menos 10 anos de presença no espaço público. Fui sempre candidato como independente, as funções jornalísticas que exercia mais recentemente tinham a ver com jornalismo de opinião e jornalismo de entrevista, portanto, nesse sentido, eu acho que fui fiel do ponto de vista deontológico às funções que desempenhava, mas que também nunca escondia àquilo que vinha. Aliás, sem querer estar a citar alguém que foi um adversário, quando entrevistei o ex-primeiro-ministro António Costa, ele disse uma coisa muito engraçada, que foi: “Uma das razões pelas quais eu o aprecio, é porque você não esconde àquilo que vem”, e eu de facto nunca escondi.
Apoia António Costa para a presidência do Conselho Europeu?
Se eu apoio o António Costa para presidente do Conselho Europeu? Tem havido um equívoco, que é: os eurodeputados não têm voto na matéria, ao contrário do presidente da Comissão Europeia, por exemplo, José Manuel Durão Barroso, quando foi candidato à Comissão, teve de ir a votos. O seu nome, a sua eleição ao Parlamento Europeu e o António Costa votou a favor.
No caso do presidente do Conselho, não é assim, nós não votamos. E por outro lado, acho que também há outra circunstância...
Mas apoia?
Eu apoio o meu programa, eu não vou fazer uma campanha a favor de António Costa, nem os apoiantes da AD esperam que eu faça uma campanha a favor de António Costa, mas também não vou fazer uma campanha contra a pessoa de António Costa, quando eu nem sequer vou poder votar nele, nem contra ele. E depois há também outro ponto, que eu também acho que é justo dizer, que é o seguinte: o doutor António Costa assumiu uma posição solene de não tornar a exercer cargos públicos enquanto a sua situação judicial não estivesse esclarecida. E a situação não está esclarecida. Portanto, eu acredito nesse compromisso solene de António Costa.
O presidente do Conselho Europeu há-de iniciar funções a 1 de novembro. Se até lá for decidido e o processo judicial não trouxer nada, agradava-lhe ver o nome de um português à frente do Conselho Europeu?
Agradava-me ver, por exemplo, mais portugueses nas direções gerais da Comissão Europeia, que também é onde é decidido muito daquilo que é o processo europeu e que toca na vida dos portugueses. Eu não vou pessoalizar a questão, acho que o próprio António Costa impôs limites a si próprio que nós devemos respeitar, e, como lhe digo, não me esqueço que quando houve a possibilidade de um português presidir à Comissão Europeia, António Costa, eu já tenho lembrado esse episódio, o António Costa eurodeputado votou a favor de José Manuel Durão Barroso. Eu não vou poder votar nem a favor nem contra. Portanto, esta campanha é uma campanha ao Parlamento Europeu, eu sou candidato a eurodeputado, tenho um programa para exercer enquanto eurodeputado, e António Costa não tem nada com isso, não é chamado para a conversa. Ele é passado, nós estamos virados para o futuro.
Mas pela forma como fala e que repete duas vezes que ele apoiou José Manuel Durão Barroso e votou nele, isso quer dizer que estaria...
Ele pôde votar, está a ver? Ele tinha uma palavra a dizer. Repare uma coisa, eu tenho uma campanha, uma equipa e um programa virados para o futuro, virados para os portugueses e virados para a Europa. António Costa foi primeiro-ministro nove anos, é passado, eu estou virado para o futuro.
Mas estamos a falar do futuro do Conselho Europeu, e portanto...
Mas seria desonesto da minha parte estar aqui a dizer aos portugueses que estou a fazer campanha, ou contra ou a favor, de uma coisa para a qual eu não vou poder votar, percebe? Seria desonesto, e eu não vou fazer isso. Então, o passado recebe…
Eu queria saber se, da mesma forma que ele teve esta disponibilidade patriótica, quase, de apoiar José Manuel Durão Barroso, se faria o mesmo? O apoio não é só o voto.
José Manuel Durão Barroso, quando se apresentou a presidente da Comissão Europeia, tinha um programa. Eu, neste momento, a única coisa que sei sobre o futuro do Dr. António Costa é que ele vai ser comentador do novo canal da Cofina. Portanto, eu não sei que programa é que ele tem para a Europa. Sei que fui contra, e que sou contra, o mandato dele como primeiro-ministro português. Isso pode ter a certeza.
Se, por acaso, tivesse sido ele o escolhido pelo PS para encabeçar a lista socialista ao Parlamento Europeu, teria aceitado o desafio de Luís Montenegro na mesma? Ia a jogo?
Eu vou dizer-lhe uma coisa e digo com a humildade de alguém que tem 28 anos e que é independente, mas com a sinceridade que eu acho que os portugueses estão acostumados a que eu responda às perguntas que me são feitas. Se o Dr. António Costa tivesse sido o cabeça de lista do PS às Europeias, eu ainda tinha mais vontade de estar nesta corrida e de debater com ele.
E quais foram as suas primeiras palavras, presumo que ao telefone, mas só estou a presumir, quando Luís Montenegro o convidou?
Olhe, eu não estava à espera. Eu contei essa história quando a SIC, onde eu trabalhava enquanto jornalista, me deu a oportunidade de me despedir dos meus telespectadores, coisa que aliás eu agradeço. E eu contei a história: eu estava pronto para ir de férias, tinha pedido férias ao Expresso e à SIC, tinha ido ao barbeiro cortar o cabelo assim rentinho, para ir de férias, e tinha ido ao supermercado e tinha as compras no banco do pendura, quando o primeiro-ministro telefonou. E eu não atendi enquanto guiava, que era para não quebrar o código da estrada, encostei o carro, as compras caíram todas para o chão e o primeiro-ministro, pronto, é uma conversa pessoal, mas o primeiro-ministro manifestou-me a sua intenção de propor o meu nome enquanto cabeça de lista à direção nacional do seu partido. Eu não estava à espera e pedi 12 minutos para pensar e para falar com a minha família, com os meus mais próximos, e obviamente com a minha entidade patronal, porque eu era funcionário, eu era trabalhador. E ele, além de 12 minutos, deu-me 15. E eu decidi que sim.
Pediu um tempo para pensar e não hesitou… Eu vi numa entrevista sua, creio que ao Manuel Luís Goucha na TVI, meses antes dizia: “A minha ambição é ter voz, e se eu já tenho, acho que sirvo melhor o país como jornalista e comentador na televisão e nos jornais do que como político.” O que é que o fez mudar? É o salário que um eurodeputado ganha?
Não, não é o salário, porque felizmente, e sem querer entrar aqui na intimidade e no foro pessoal, felizmente a minha família, apesar de sermos uma família jovem, eu tenho 28 anos e a minha companheira é da minha geração, temos duas carreiras de sucesso, eu tinha uma carreira de sucesso na televisão, a minha companheira também tem sucesso profissional, portanto não é uma ambição material que me leva para o Parlamento Europeu, é uma ambição de serviço. Eu sei que parece uma resposta pré-fabricada, mas é uma resposta sincera. Mas deixe-me dizer-lhe, aquilo que eu respondi nessa entrevista ao Manuel Luís Goucha era sincero e era verdadeiro. Eu fui muito feliz enquanto jornalista e analista, enquanto estive na televisão, eu era uma pessoa muito feliz, sentia-me muito realizado, como o Ricardo estava a relembrar, eu sentia que tinha uma voz. Agora, eu não estava a contar com o desafio, não estava à espera do desafio de poder levar essa voz para a Europa. E, ainda por cima, levar mais do que uma voz, levar a minha e levar a voz dos portugueses que acreditam no meu programa. Portanto, eu senti-me impelido a servir. Não é uma opção fácil e eu espero encontrar a mesma felicidade no Parlamento Europeu e o mesmo espírito de serviço, é isso que eu quero fazer.
É verdade que ligou a outras cabeças de lista a desejar-lhes boa campanha?
Não só é verdade como liguei a todos, claro que sim, por uma questão de cortesia democrática. Porque, repare, antes da minha profissão, que era jornalista, e antes da minha função, que neste momento sou candidato, sou cabeça de lista, eu sou um cidadão, sou um democrata. A cidadania começa com a democracia e eu sou um cidadão. Portanto, se o candidato é de extrema-direita, se o candidato é de extrema-esquerda, se o candidato é liberal, se o candidato é animalista, eu acho que são seres humanos que estão connosco dentro da democracia, dentro da mesma casa. Não temos todos que nos sentar no mesmo sofá, mas podemos entender-nos e tratarmo-nos com respeito e elevação para debatermos a Europa como ela merece ser debatida. Mas para responder diretamente à sua pergunta, liguei a todos os cabeças de lista e posso dizer-lhe que o mesmo espírito democrático da minha chamada foi o mesmo espírito democrático que eu ouvi do outro lado do telemóvel.
O aparecimento de Francisco Paupério como candidato do Livre não o fez pensar com os seus botões e dizer algo do género para si: ‘Estou feito! Sou um candidato jovem de um partido velho e ele é um candidato jovem de um partido novo’?
Eu não vou ser cínico. Eu fiquei contente com a candidatura de Francisco Paupério. Nós não nos conhecíamos pessoalmente mas fomos trocando ideias e impressões quando nos cruzámos nos estúdios de televisão e nos próprios debates também trocámos ideias. Ele ficou ao meu lado no primeiro debate, ficou à minha esquerda, portanto ficou sentado no sítio certo e eu fico contente. Repare, eu não vou votar no Livre, obviamente. Nem o Francisco Paupério vai votar na AD. Mas eu acho que um jovem que não teve as mesmas oportunidades mediáticas que eu tive, que tem um percurso profissional diferente, que tem ideias para a Europa que são diferentes e nas quais, em muitas delas, eu não me revejo, mas que mesmo assim quer contribuir para o debate, eu acho que ele tem mérito. Eu acho que o Francisco Paupério é bem-vindo a este debate sobre as europeias. Portanto, eu não fiquei nada preocupado, pelo contrário.
O Pedro Fidalgo Marques também não é propriamente velho...
Exatamente, mas repare, eu não tenho uma visão idadista da política. Eu não acho que o João Cotrim Figueiredo seja um candidato velho por ter 62 anos. Eu não acho que tenha um programa menos jovem por causa disso. Eu não acho que falte energia ao candidato Tanger Corrêa por ter 73 anos. E também não acho que a Catarina Martins esteja desligada dos jovens apesar de serem com propostas nas quais eu não me revejo, por estar na política há quase 20 anos. Eu não tenho uma visão idadista da política. Eu não sou o melhor candidato porque sou jovem. Eu acho que nós somos a melhor candidatura porque temos o melhor programa.
Está preparado para a burocracia de Bruxelas? Ou seja, alguma vez conseguirá fazer valer a vossa proposta de reforma regulatória no sentido da aplicação do princípio ‘uma entrada, duas saídas’ para cada nova regulação introduzida?
É óbvio que a sua pergunta está no nosso programa, também está no programa da Iniciativa Liberal, e obviamente que é um princípio difícil de aplicação, mas eu tenho dito muitas vezes: nós não temos só medidas fáceis. O nosso programa não é um programa que seja fácil de implementar. Se fosse para ser fácil era para outros. Nós temos medidas que sabemos que serão difíceis de aplicar, e não é só essa. Essa é difícil de aplicar porque é do ponto de vista regulatório. No fundo é um princípio que, muitas vezes, num processo burocrático, como o Ricardo diz, pode não ser instintivo para a máquina de Bruxelas aceitar essa nossa proposta. Mas há outro tipo de ideias que temos no nosso programa que nós sabemos que vão ser difíceis.
Por exemplo, nós quando quisermos elevar e universalizar o direito à habitação na Carta dos Direitos Fundamentais vai-me dizer assim: vai ser fácil fazer isso? Não, não vai ser fácil.
E não pode ter como efeito ser algo mais simbólico que qualquer outra coisa?
A democracia também tem direito aos seus símbolos, mas não. E se me permitir eu explico-lhe porquê. Eu não tenho uma proposta ou a candidatura não se apresenta com propostas meramente simbólicas para fazer bandeiras. A nossa perspectiva é simples. Neste momento o debate sobre a habitação está dividido, inclusive cá em Portugal, se repararmos mais ou menos em dois grupos. Está dividido no grupo que não quer falar da habitação na Europa, porque sente que há limites formais e que é uma competência nacional, não quer ter uma discussão sobre a habitação na Europa, e há outro grupo que é o grupo que quer prometer tudo a todos, sabendo que não vai ter o apoio na Europa para conseguir implementar essas soluções. Nós não queremos nem prometer soluções impossíveis nem desistir da discussão. Por isso é que queremos universalizar o direito e consagrá-lo na Carta dos Direitos Fundamentais, porque nós sabemos que o primeiro passo para implementar soluções de políticas públicas é garantir um horizonte legal e constitucional que lhes permita ter uma discussão com um horizonte de esperança. Mas, repare, por exemplo, a partir daí, consagrando o direito na Carta dos Direitos Fundamentais o que é que poderíamos fazer? Posso-lhe dar um exemplo. O antigo Plano Juncker, que hoje é mais conhecido como Plano InvestEU, tem um conjunto de janelas, nomeadamente de modernização, de tecnologia. Se abrirmos uma janela dentro do plano do ex-Plano Juncker, do Plano InvestEU, virado para a juventude e para a habitação, onde, por exemplo, a Europa desse uma garantia europeia para a primeira habitação jovem, nós já estávamos a criar uma nova modalidade, uma nova oportunidade para a discussão da habitação na Europa com uma solução europeia que anime o mercado e, ao mesmo tempo, ajude a resolver o problema. Ou seja, não é uma solução apenas simbólica. Nós simplesmente sentimos que temos mais margem para abrir a discussão sobre a habitação se ela for um direito fundamental.
Quando pensam em reduzir a burocracia, mas estão ao mesmo tempo a propor um comissário para as pequenas e médias empresas, isso não pode ter precisamente o efeito contrário?
Não, porque o primeiro objetivo de um comissário totalmente dedicado às pequenas e médias empresas - já vi que o Ricardo leu o nosso programa porque essa proposta está no nosso programa - tem justamente a ver com isso. Nós quando olhamos para o tecido empresarial português e europeu, eles são muito idênticos na presença das PMEs; entre os 88 e os 92% do tecido empresarial europeu e português é fundamentado nas pequenas e médias empresas. Nós ao propormos uma pasta, um portefólio, na Comissão com um comissário totalmente dedicado às PMEs estamos a fazer o oposto. Estamos a garantir que há um homem ou uma mulher totalmente focado em desburocratizar o excesso de burocracia.
Mas quando o sistema dos comissários é um comissário por cada país segundo o modelo que temos em vigor, por enquanto...
É um modelo que nós defendemos, mas há outros partidos e outros programas que defendem a redução do número de comissários...
Mas mantendo-se como está, e sendo a AD da família política do Partido Popular Europeu, o partido da senhora Ursula von der Leyen, e tendo sido este modelo que temos em vigor aquele que ela desenhou na Comissão a que preside, estar a criar um novo comissário vai implicar deixar cair um portfólio, deixar cair uma pasta. Qual era a pasta que vocês extinguiam?
Repare, na recandidatura da presidente Ursula von der Leyen nós ainda temos, obviamente, que ver como é que ela se apresenta neste seu segundo mandato.
Até porque isso tem influência na nossa atividade no Parlamento Europeu. Nós gostaríamos de dar o portefólio das PMEs e da desburocratização a um comissário. Também há a possibilidade neste momento, essa discussão existe muito viva na Europa, de um comissário na próxima comissão, no próximo quadro do Parlamento Europeu, ter a pasta da defesa, devido ao contexto que a Europa vive. Eu acho que nós não podemos abdicar de dar novas prioridades à Europa para manter antigas, mas também não temos que prescindir das antigas sem as incluirmos noutros portefólios. Repare, eu não sou candidato a presidente da Comissão Europeia, mas acho que é perfeitamente conciliável termos novas prioridades sem prescindirmos das antigas.
Reconhecimento da Palestina, sim ou não?
Claro, nós somos a favor de dois Estados.
Isso é evidente, é a nossa posição.
E Portugal deveria aderir a isso já no dia 28? Próxima semana?
Nós somos a favor de todo e qualquer modelo que encaminhe a situação para a solução dos dois Estados. Portanto, não dizemos que não a nada por princípio. Agora, qual é que nós achamos que é o melhor caminho? É o reconhecimento do Estado da Palestina, incluindo o maior número de países possíveis na União Europeia e nas Nações Unidas, mas por uma razão muito simples: porque é a única forma que nós temos de garantir que esse direito, que esse reconhecimento é preservado no tempo. Enquanto a decisão não for o mais multilateral possível, acho que é arriscado e prematuro apoiá-la sem contar com o número de países que fortaleçam essa decisão.
Não é apenas a defesa de uma postura de ficar sossegadinho a ver o que é que os outros fazem?
Uma coisa lhe garanto, nos próximos cinco anos se há coisa que eu não vou estar é sossegadinho.
Acredita mesmo, até pelo andar da carruagem, que alguma vez a Ucrânia vai estar em condições de ter uma posição negocial forte? Porque a ideia é: vamos ajudar a Ucrânia até a Ucrânia estar numa posição negocial forte, para então se possa sentar à mesa das negociações. Acha que alguma vez isso vai acontecer?
Eu acredito convictamente na vitória ucraniana e tanto ou mais do que isso.
Vitória militar?
A Ucrânia foi invadida militarmente, portanto tem que sair vitoriosa militarmente, como me parece que é claro, é pela lógica mesmo, já não é uma questão de opinião. E mais do que isso, acredito piamente que é um imperativo estratégico e moral da Europa apoiar politicamente, economicamente, humanitariamente e militarmente a Ucrânia até à derrota russa. Caso contrário, aquilo que estaremos a fazer é entregar a Vladimir Putin as chaves de segurança da Europa e isso nós não podemos permitir.
E a União Europeia tem feito tudo o que pode pela Ucrânia?
A União Europeia tem feito tudo o que pode, sabendo que todo o trabalho que envolve política externa e ajuda a um contexto militar de uma invasão implica unanimidade, como sabe, no Conselho. Nesse sentido, muitas vezes há uma lentidão típica dos processos europeus que faz com que nem sempre consigamos responder à velocidade que gostaríamos. Isso não quer dizer que não tenhamos conseguido chegar até agora a consensos que têm ajudado a Ucrânia. Portanto, se o Ricardo me pergunta: 'temos ajudado como podemos?' Temos. Poderíamos fazê-lo mais depressa? Poderíamos, mas como essas decisões necessitam e beneficiam da unanimidade para poderem avançar, muitas vezes demoramos um pouco mais do que os EUA que não precisam, obviamente, de unanimidade entre os seus Estados porque é uma federação de Estados, não é uma confederação como a UE. Para tomar esse tipo de decisões nós demoramos um bocadinho mais de tempo, mas eu acho que estamos no caminho certo.
A par desse esforço de ajuda política, económica, militar, não tem faltado também esforço europeu no sentido de tentativa de construção da paz? Ou seja, por exemplo, esta conferência internacional para a paz na Ucrânia que a Suíça se propõe a realizar agora? Isso não devia ter sido, e desde há muito, uma prioridade também da União Europeia?
Eu percebo a sua pergunta e a mim parece-me que qualquer reforço do ímpeto diplomático da União Europeia é positivo e será necessário para a Europa se afirmar como uma voz do mundo.
Uma Europa diplomática é fundamental para enfrentar o contexto geopolítico e geoeconómico que vamos viver na próxima década. A mim parece-me que o reforço - e, aliás, isso também consta do nosso programa -, o reforço do âmbito diplomático da UE é um imperativo dado o contexto geopolítico e geoeconómico que vamos viver na próxima década. Mas deixe-me dizer-lhe que o ónus está ao contrário. É a Rússia que está em guerra com a Europa, não é a Europa que está em guerra com a Rússia. Nós não somos a potência belicista. Nós estamos a defender-nos, não estamos a atacar ninguém. Eu não tenho qualquer espécie de dúvida que o objetivo da Europa é a paz, mas é uma paz que não implica a derrota da Ucrânia e é essa a nossa posição.
E neste contexto geopolítico é preciso reforçar a NATO?
É preciso reforçar a defesa europeia para que a Europa possa ser o pilar europeu da Aliança Atlântica. Claro que sim, está no nosso programa. E, sobretudo, é possível fazê-lo, não desvirtuando a natureza social do orçamento europeu. Nós, muitas vezes, temos um discurso que é, no meu entender, ao mesmo tempo pessimista e irrealista. Normalmente são os otimistas que são os irrealistas e neste momento há alguma parte ou há partes da discussão sobre o futuro da defesa na Europa que acabam por ser ao mesmo tempo pessimistas e irrealistas. Repare, nós a seguir à Segunda Guerra Mundial, durante o período da Guerra Fria, de 1948, bloqueio de Berlim até 1989, queda do muro, nós estivemos em Guerra Fria, entre o Ocidente e a União Soviética. E o custo dos orçamentos de defesa das democracias para essa altura era muito maior do que era hoje, era cerca de 4%. Portugal está longe dos 4%, mas, no geral, estamos todos muito longe dos 4% ainda. Se foi possível construir o Estado Social Europeu, social-democrata e democrata- cristão, enquanto enfrentávamos a ameaça da União Soviética, porque é que não há-de ser possível agora?
Voltando à Guerra do Médio Oriente, a Europa não tem demonstrado a sua falta de peso enquanto ator geopolítico?
Eu diria que esta candidatura é favorável ao reforço da União Europeia enquanto ator geopolítico. Ursula von der Leyen, quando tomou posse como Presidente da Comissão Europeia, queria ter uma comissão mais geopolítica. Era esse o objetivo dela. Mas isso não é fácil. Não é fácil e...
Não conseguiu, basicamente.
Eu não acho que se possa dizer que não tenha conseguido. Acho que teve um papel fundamental na Ucrânia. Acho que nem sempre é fácil de gerir, porque nós somos uma Europa que também é uma Europa de Estados e os Estados têm sensibilidades diferentes e políticas externas diferentes.
Portanto, não se pode estalar os dedos e de repente haver uma política externa europeia. Agora, há uma coisa que nós temos que perceber, nós queremos ter uma voz na Europa, mas há uma coisa que, se queremos que a Europa seja forte no mundo, isto é, se queremos aquilo que o Ricardo me está a perguntar, seja com Ursula von der Leyen, seja daqui a 10 anos com outro Presidente ou outra Presidente da Comissão, se queremos que, de facto, a voz da Europa seja ouvida no mundo, seja uma atua internacional, como se costuma dizer no estudo destas matérias, é impossível fazer isso sem coesão social na União Europeia. Porque, repare, se as decisões de política externa precisam de unanimidade, enquanto houver desigualdade social entre os Estados, como é que eles vão concordar sobre a sua voz no mundo se eles não conseguem estar unidos do ponto de vista da coesão social? Esse é o paradoxo que ainda está por resolver.
Nós precisamos de menos desigualdade na Europa para termos mais força enquanto voz fora da Europa. Essa é a nossa posição.
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