Muitos viticultores do Douro ainda não começaram a vindimar, porque não sabem a quem vão entregar a produção. Noutros anos e nesta altura já estavam a terminar a colheita
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Na Região Demarcada do Douro há viticultores que admitem deixar parte da produção de uvas nas videiras. A procura pelos produtores de vinho tem sido muito inferior à de outros anos, deixando os lavradores sem soluções para entregar toda a colheita ou parte dela.
Perante a incerteza, há quem ainda nem tenha começado a vindima, quando noutros anos já a estaria a acabar. Manuel Fernandes, em Ervedosa do Douro, freguesia de São João da Pesqueira, lembra que, no primeiro de setembro de 2023, “já tinha cinco dias de vindima” e que “nesta altura do mês estava pronta”.
Este ano, a única certeza que Manuel Fernandes tem é que começa no dia 6 de outubro a vindima das uvas que já vendeu. São as necessárias para produzir “20 pipas (550 litros cada) de vinho do Porto”. Quanto às restantes 40 pipas para vinhos DOC Douro “estão mais ou menos apalavradas, mas as certezas são poucas”.
Em 2023, Albano Fernandes começou a vindima a 26 de agosto e terminou a 20 de setembro. Este ano tudo acontece a “conta-gotas” porque os “compradores ainda nem sabem as que querem”. “Algumas uvas vão ficar nas videiras”, admite, porque, “nesta altura, quem ainda não as tiver vendidas vai ser difícil conseguir vendê-las”. E mesmo quem as entregou foi a “preço de saldo” e não a um “valor justo”.
Para se perceber o preço de saldo, Manuel Covas faz as contas: “Um quilo de uvas produzidas por mim custa-me, no mínimo, 1,2 euros. Multiplicado por 750 quilos (necessário para uma pipa de vinho) dá 900 euros. É impensável qualquer viticultor receber esse valor este ano por pipa para vinho DOC Douro. A média vai ser abaixo dos 350 euros. Não dá para o trabalho. Trabalhar para aquecer? Mais vale mais morrer de frio.”
No início deste mês, um grupo de 20 viticultores do Douro foi a Lisboa para um encontro com Marcelo Rebelo de Sousa. Saíram de Belém com alguma esperança, que está a esmorecer. “O que o Douro precisa é de uma revolução e que os mais novos tomem o poder”, desafia Joaquim Monteiro, porque “no Douro está tudo do avesso”.
Contra um Douro do avesso, em que quem produz uvas é quem vive pior, a Associação dos Viticultores e da Agricultura Familiar Douriense prevê novas manifestações para breve. “Poderão ser duas ou três, duas simbólicas e uma de grandes dimensões”, realça o dirigente Vítor Herdeiro.
