Martim Mayer: “Direitos televisivos? Todos são parceiros, mas Benfica tem de ter um peso correspondente ao valor económico”
Candidato à presidência do Benfica identifica tiques burgueses na Direção de Rui Costa. Quer ter um Diretor-Geral no clube e potenciar a formação. Na “guerra” dos direitos televisivos, o Benfica deve ter um “papel principal”
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Martim Borges Coutinho Mayer é o mais recente candidato à presidência do Benfica. Neto do histórico presidente Borges Coutinho, Martim Mayer tem o mote “Benfica no Sangue” e quer fazer regressar a “identidade” encarnada. Na corrida até 25 de outubro, promete apresentar nomes com “independência” e “frescura”. Sem adiantar quais as mudanças que faria no plantel principal, para não desestabilizar antes do Mundial de Clubes, Mayer apela ao “discernimento benfiquista” na tomada de decisões de futuro.
O que o faz avançar agora com uma candidatura à presidência do Benfica?
Já estou há muito tempo a trabalhar com a minha equipa no Benfica, portanto, isto começou por ser um sonho de miúdo, como muitos benfiquistas têm, e depois com trabalho, com dedicação, com entrega, com experiência, seja profissional, seja experiência de vida, passou a ser um objetivo para o qual tenho trabalhado nos últimos 10 anos. Fez parte destes últimos meses uma organização mais a fundo da minha equipa e o contacto com pessoas que são preponderantes para que a abrangência de assuntos que está em causa, seja numas eleições, seja no Benfica, a trabalhar executivamente, assim exija.Foi isso que tive de fazer e, por isso, foi o tempo necessário para ter tudo isso agregado e pronto para, então, poder avançar e apresentar a candidatura como fiz ontem.
Uma das questões que foi levantada depois do anúncio da sua candidatura é o facto de ter tido alguma ausência pública na vida institucional do Benfica nos últimos anos, não teve intervenções diretas nas assembleias gerais, não fez propostas para a revisão de estatutos que aconteceu ainda este ano. Porquê desta ausência e porquê agora acha que pode ser uma voz importante para o futuro do Benfica?
Eu compreendo isso, mas há 13 anos atrás eu incorporei a lista de Rui Rangel e desde aí que não paro de trabalhar os vários aspectos do Benfica e acompanhar a vida do clube. Ora, se há algo que diferencia a minha candidatura é o imenso cuidado e respeito que eu devo ter pelo legado do meu avô [Duarte Borges Coutinho].Ou seja, eu tenho aqui uma responsabilidade adicional que diz respeito a essa ligação que imediatamente é feita com o meu avô e com aquilo que ele representa na história do Benfica. Eu sou do Benfica desde a barriga da minha mãe, como muitos benfiquistas.
O que é que o distingue daquilo que são as candidaturas que já vieram a público e também o que é que o distingue da atual Direção?
Relativamente à atual Direção, eu estava a referir o seguinte, quando o Benfica foi feito era para vencer, está na essência do que é ser do Benfica e, portanto, quando não há vitórias, tem que haver mudança. Ao longo dos últimos cinco anos, o Benfica ganhou 15% dos títulos nacionais. Penso que não há coesão na equipa, na Direção do Benfica e tem havido instabilidade, pois ao longo destes últimos anos temos assistido a pessoas que saem e a pessoas que substituem as que saem e que entram e que saem. Em relação às restantes propostas, a minha proposta é de trazer pessoas muito competentes, cada uma na sua área. Não são forçosamente mediáticas, mas têm um perfil e um percurso profissional muito bom e de grande competência em cada uma das suas áreas profissionais. Por outro lado, a independência e a frescura da minha proposta têm a ver com que nenhuma dessas pessoas tenha estado no passado ligada ou em funções no Benfica. Isto é transversal a toda a equipa. Não vamos aos assuntos do dia, não vamos aos temas do dia, porque o estado dos temas do dia são uma consequência de algo mais profundo. E esse algo mais profundo, quanto a mim, mais do que tudo, assenta em duas questões.Primeiro, na não identificação dos sócios do povo benfiquista com aquilo que é a forma burguesa como hoje em dia o clube é gerido e com a abordagem despesista com que o clube é gerido. Por outro lado, afasta os sócios e retira peso institucional ao Benfica. E o peso institucional do Benfica só existe quando temos todos os sócios a reverem-se na direção do clube e temos todos os sócios a colaborar ativamente e proximamente com o clube.
E como é que se pode fazer diferente? Estava a falar dessa questão mais aburguesada do Benfica…
Talvez vá usar aqui um termo que abrange isso tudo, que é o discernimento benfiquista. No fundo, a capacidade, diante de qualquer situação, perceber, julgar e decidir com um bom senso benfiquista o que é que é melhor para o clube. E isto depois aplica-se transversalmente a tudo. Portanto, havendo isto de base, depois a especialização a cada tema do clube tem que ser um reflexo precisamente disto. Seja no futebol profissional, seja nas modalidades, seja na gestão dos recursos financeiros, seja numa coisa que tem faltado imenso aos sócios e que tem sido, quanto a mim, muito fraco, que é a comunicação. Seja a comunicação com os sócios, seja a comunicação com as diferentes entidades que andam à volta do futebol e com a própria comunicação social. E, portanto, alterar todo este paradigma, parece-me a mim, que irá trazer grandes diferenças àquilo que o clube pode ser no futuro.
Na questão dos direitos televisivos, qual é, para si, a melhor solução para o Benfica?
(Esse tema é um tema do qual eu estou bastante por dentro e há várias entidades que estão envolvidas naquela que será a solução, mas isso acontece por uma determinada ordem. Primeiro é preciso ter em conta duas datas, 2026 e 2028. E até 2026, se não me engano, até junho de 2026, tem que estar definido um modelo de repartição dos direitos televisivos com solidariedade e isso tem que acontecer a ser feito pelos clubes. Agora, quando eu digo que o Benfica vai liderar, eu só estou a falar de que o Benfica tem que ter um peso correspondente ao valor económico que o Benfica tem.E portanto, tem que se definir um modelo de repartição, para isso o Benfica não se pode demitir do assunto e fingir que não acontece nada. A minha proposta é que o Benfica seja agregador dos outros clubes, garantindo, desde logo, que não sai prejudicado. Depois é preciso transportar esse acordo para outra mesa. Vamos ter que falar com os parceiros que são encontrados para fazer aquilo que se pretende, que é melhorar o produto de futebol português. Para que este produto possa competir com outros produtos do futebol europeu. E, portanto, ao conversar com esses parceiros, tem que se encontrar uma solução que sirva os interesses de curto prazo de cada um dos clubes, que sirva os interesses de cada um dos clubes no sentido de fazer investimento para melhorar o produto e para o produto ser mais vendável, ter mais receitas, ter mais interesse e, com base nisso, garantir que, à medida que o tempo passa, o benefício para cada um dos clubes e, no meu caso, em concreto, o benefício para o Benfica é cada vez maior. Aquilo que proponho é que o Benfica, com o peso institucional e com o peso económico que tem nessa equação, seja, obviamente, um dos intervenientes principais ao longo de todo este processo.
Inevitavelmente terá que haver aí conversas e acordos com o Sporting e FC Porto. Se for presidente, qual é que vai ser a sua relação com estes dois clubes?
A relação institucional do Benfica vai ser sempre à Benfica. Temos que ser elevados e institucionalmente temos que transmitir aquilo que o Benfica é, independentemente do que nos fazem. Agora, o peso institucional do Benfica existe, o Benfica tem que ser sempre respeitado e é o presidente, a primeira pessoa, que tem que garantir isso. Há uma parte grande da garantia disso que vem de trabalhar antecipadamente para que um conjunto de situações nunca venham a acontecer. Além disso, relativamente aos direitos televisivos, temos que considerar todos os clubes da Liga Portugal parceiros entre si. E como parceiros económicos entre si, eles terão que se relacionar uns com os outros em prol de um interesse comum. Desportivamente, nós vamos querer sempre ganhar a todos. E dentro de casa, trabalhamos todos os dias e a cada minuto para que quando entramos em campo ganhamos. E ganhemos pelo máximo de golos possível.
Em relação à atual presidência, na sua opinião, qual é que foi o maior erro ou aquilo que, se fosse presidente, não teria feito se tivesse estado no papel de Rui Costa nos últimos anos?
Eu acho que sendo o ganhar é a grande finalidade do clube, ganhar à Benfica e ganhar com identidade. Toda e qualquer decisão que às vezes silenciosamente fez com que perdêssemos essa identidade e com que perdêssemos esse cunho de vitória, é isso aquilo que mais me entristece...
E estamos a falar de que tipo de decisões, concretamente?
São de vária ordem, mas falo, por exemplo, daquilo que já referi atrás do aburguesamento, da forma como o clube deixou de ter a nação benfiquista a identificar-se na postura e na forma como o clube é gerido e como o clube comunica. Em geral, eu acho que isso é o maior prejuízo e é isso que temos que recuperar, é por aí que começa a minha proposta. Portanto, não lhe consigo dizer uma situação concreta, sou pena de estar a especializar muito a minha resposta. Isto é um tema de fundo que é muito mais importante de resolver do que tocar neste ponto, ou que comprou mal este jogador, ou que contratou ou despediu tarde aquele treinador. Isso tem que ver com consequências de um determinado comportamento, com consequências de uma determinada filosofia. E, por isso, eu acho muito mais importante abordar o tema como um todo, como genérico, porque isso depois, em cada uma das situações, teria um fim diferente.
E o que é o aburguesamento do Benfica? Em termos concretos, o que é que o leva a pensar que o Benfica passou a ser um clube, hoje de uma forma aburguesada?
Há muito despesismo numa quantidade de situações onde não se pode afirmar que esses valores são investimento. Tem que saber o que é que é investimento e o que é que cada euro que os sócios trazem para o clube vai para investimento e o que é que vai para despesa que não é útil a que se consiga a vitória. Portanto, o Benfica é um clube do povo, o Benfica tem que ser dos seus sócios e os seus sócios quando veem que os recursos do Benfica são utilizados em prol de vencer e a maior parte do investimento vai efetivamente para investimento e não para despesismo, então aí identifica-se com a direção e aproxima-se do clube. Em todas as coisas em que nós vemos que existe despesismo que não tem a ver com os resultados desportivos, isso é uma aproximação burguesa ao clube, ainda por cima quando depois sabemos que o dinheiro faz falta, que não somos um clube que está financeiramente sólido e que precisa de vendas de jogadores para colmatar a diferença negativa que existe entre as restantes receitas que gera e os custos que tem.
Olhando para a próxima temporada, quais são as lacunas que identifica no plantel do Benfica para a próxima temporada e, por outro lado, que jogadores é que para si são imprescindíveis?
Eu mais do que tudo entendo que tem faltado muito melhor coordenação entre a formação, entre a equipa A, o scouting e as contratações e, portanto, primeiro do que tudo, entendo que falta essa coordenação e por isso é que proponho uma alteração ao organigrama do futebol profissional que passa por existir um diretor-geral que vai coordenar muito melhor essas várias áreas.
Por outro lado, ao termos alguém que, de cima para baixo, defina um modelo de jogo, defina um estilo de jogo, defina perfis posicionais, defina perfis específicos do staff técnico, trabalha com big data, com mapas de sucessão e por aí fora, aquilo que teremos é uma operação muito mais bem-sucedida e uma operação muito mais racional do ponto de vista da aplicação dos recursos financeiros do clube. Portanto, se em conjugação com isso, conseguirmos fazer com que os jogadores que vêm da formação e que muitas vezes são trabalhados na formação até virem para a equipa A, chegarem à equipa A e levando-os a que sejam muito mais influentes na identidade da própria equipa, eu acho que vamos ver grandes transformações no futebol do Benfica.
Mas quais são as suas ideias concretamente para o plantel do ano que vem? Se for eleito presidente, é presidente a partir de outubro, já não tem interferência neste mercado de verão, tem no mercado de janeiro, mas se tivesse agora que gerir este mercado para o próximo ano, o que é que faria?
Nós estamos a dias do Mundial de Clubes…Eu vou lá a fazer força no dia 16 para ganharmos o primeiro jogo. É com esse grupo, treinadores e jogadores, que eu conto, porque eu sou do Sport Lisboa e Benfica. Não lhe vou dar uma resposta eleitoralista. Eu quero dar uma resposta que dê estabilidade ao clube e que cada jogador que possa estar a ouvir esta entrevista saiba que é com eles que eu conto. Portanto, não vou trazer para cima da mesa a quatro meses das eleições, ainda por cima quando não tenho qualquer poder de decisão, nenhuma informação que possa trazer a mais pequena instabilidade.
Mas seria importante para os benfiquistas perceberem quais são as suas ideias. Daí a minha pergunta, olhando para este plantel, com uma época com tantas derrotas desportivas e que não correu ao nível que os benfiquistas quereriam, olha para esta época e o que é que acha que poderia ser feito diferente para a próxima?
Eu tento explicar isso do ponto de vista conceptual. A esta distância e a uns dias udo primeiro jogo do Mundial de Clubes, obviamente, por discernimento benfiquista, como eu dizia, não lhe posso responder mais do que aquilo que lhe estou a dizer, porque mais do que ter preocupações de trazer notícia, eu tenho de facto é preocupação de que o Benfica ganhe, e que o Benfica esteja e seja, esteja estável, e acho que todos temos que contribuir por isso.
Vai estar nos Estados Unidos, qual é o seu objetivo nessa ida?
Eu vou como adepto, portanto, aquilo que eu vou fazer é torcer pela equipa como sempre torço, até às lágrimas, e gritar pelo meu Benfica, porque gostava muito que passássemos a fase de grupos, seria algo que traria grande visibilidade ao clube, numa prova que se estreia, e numa prova que acontece noutro continente, onde o futebol está em grande expansão e onde o Benfica teria muito a ganhar em conseguir evidenciar-se, e em conseguir mostrar-se como aquilo que é o maior clube do mundo. E portanto, eu estou lá como adepto, essa é a minha agenda, antes disso vou às casas do Benfica, integrado no meu programa para estas eleições, para comunicar e fazer passar a minha mensagem aos benfiquistas que vivem nos Estados Unidos, mas depois no estádio, vou estar como adepto, e vou torcer pelo nosso Benfica com toda a minha força.
Já deixou em aberto a possibilidade de Bruno Lares não continuar depois das eleições, caso fosse eleito, mantém essa ideia?
Fui um mau comunicador, porque não foi isso que eu quis dizer. E portanto, eu quis dizer uma coisa e foi mal interpretado. Aquilo que eu disse foi que o Bruno Lage é o treinador do Benfica, não sabemos se em outubro, caso eu seja eleito presidente, será o treinador do Benfica, portanto é uma questão vazia. Não me devo pronunciar sobre isso agora. O Bruno Lage tem contrato com o Benfica, é o treinador do Benfica, portanto não me devo pronunciar sobre isso.
Em relação a apoios, e para terminar, há algum nome que queira avançar já?
Neste momento, o meu nome. Martim Mayer. Martim Borges Coutinho Mayer é o meu nome. Apresentei ontem [na quarta-feira] a candidatura. Temos aqui mais uma vez a preocupação de fazer bem as coisas, fazer as coisas de uma forma consistente e portanto temos tudo pensado do ponto de vista de como iremos comunicar ao longo destes quatro meses. Não sou uma pessoa mediática, a maior parte dos sócios do Benfica não me conhece, primeiro tenho que me dar eu a conhecer, é na minha pessoa que eu neste momento tenho que focar as atenções, transmitir aos sócios do Benfica quem é que eu sou, qual é que é o Benfica no sangue que eu tenho dentro de mim. Mais para a frente terei todo o gosto, todo o interesse, em falar das pessoas que estão na minha equipa e em falar nas outras pessoas com quem temos estado a trabalhar.
