Em entrevista ao programa Fontes Europeias da TSF, António Costa fala do apoio à Ucrânia, do Brexit e da relação com os EUA
Corpo do artigo
O presidente do Conselho Europeu, António Costa, alerta para “a incerteza” em torno da posição de Donald Trump sobre a Ucrânia, sublinhando a necessidade de a União Europeia “se preparar” para assumir o apoio a Kiev. Em entrevista à TSF, o presidente do Conselho Europeu considera que a UE tem de garantir que “o direito internacional prevalece sobre a força da guerra”.
“O que está em causa na Ucrânia não é só a Ucrânia, não é só a segurança europeia, mas é a validade daquilo que são valores universais e, por isso, nós temos que assegurar que o direito internacional prevalece sobre a força da guerra”, afirmou António Costa, numa entrevista, em Bruxelas, ao programa Fontes Europeias, da TSF.
Reconhecendo que “os ucranianos têm travado uma luta muito difícil para recuperarem a paz, o direito à soberania, à integridade do seu território, o respeito pelas suas fronteiras”, o presidente do Conselho Europeu aponta para a “incerteza” face ao posicionamento da futura administração norte-americana, a 20 de janeiro.
“Obviamente, estamos numa situação onde muitos antecipam alguma incerteza em função da eventual posição da nova administração americana, e a Europa tem que se preparar para poder apoiar a Ucrânia, porque só a Ucrânia tem legitimidade para definir os termos em que está disponível a negociar e a aceitar as condições de paz”, frisou António Costa.
Questionado sobre o conceito de apoio que prevalecerá dentro da cimeira desta quinta-feira, uma vez que entre os 27 as posições divergem, António Costa destacou que ainda esta semana “mais uma vez foi possível fazer um acordo para a aplicação do novo pacote de sanções”.
“E, relativamente ao suporte à Ucrânia, temos conseguido manter esse nível”, afirmou, dando como exemplo que “ainda este mês, vai ser desembolsada a primeira tranche do grande empréstimo que foi negociado ao nível do G7 e, a partir do próximo ano, a União Europeia apoiará com 1,5 mil milhões de euros por mês o orçamento ucraniano, para além daquilo que é o apoio militar que os diferentes Estados-Membros têm vindo a assegurar à Ucrânia à medida das necessidades do esforço de guerra da Ucrânia”.
António Costa desvalorizou ainda o impacto das crises políticas, como as que têm surgido recentemente em França e na Alemanha, lembrando que a União Europeia é composta por “democracias e, portanto, os percalços no processo governativo em cada Estado-membro são normais e não têm de ser vividos como crise”. E acredita que, apesar desses percalços, o apoio à Ucrânia não será posto em causa.
“A Alemanha vai ter eleições, não sabemos qual é o resultado. Provavelmente resultará destas eleições uma coligação mais sólida do que a coligação que governou a Alemanha nos últimos tempos. A França acaba de ter a nomeação do novo governo, mas é preciso ter em conta o seguinte: que, independentemente desses percalços da vida política interna, o apoio da União Europeia e do conjunto dos países da União Europeia à Ucrânia não tem variado em função dos governos. Já mudámos o governo em Portugal e isso nada alterou o apoio à Ucrânia”, frisou.
Defesa
Sobre a área da Defesa, António Costa afirmou que “não tem havido dúvidas de todos que temos que reforçar o investimento em defesa e o relatório Draghi ajudou, aliás, todos a perceberem que o investimento em defesa, que está a par com o investimento na transição energética, pode ser um dos dois grandes vetores de promoção da competitividade da nossa economia através da inovação”.
“Temos que fazer aquilo que o engenheiro Guterres costumava ensinar aos membros dos seus governos, que é: a primeira função de um político é não criar problemas; a segunda é, perante um problema, resolvê-lo; e, em terceiro lugar, sempre que encontrar um problema, procurar transformá-lo numa oportunidade”, comentou.
Questionado sobre se não espera “complicações” no âmbito da discussão do Quadro Financeiro Plurianual, uma vez que será preciso também acomodar o investimento em Defesa e fazer escolhas difíceis, António Costa afirma que, na realidade, na UE, “todas as decisões (...) implicam complicações”.
“O nosso foco tem que ser perceber as complicações para encontrar as soluções. É essa a nossa função. Isso é assim quando falamos de defesa, é assim quando falamos do quadro financeiro plurianual, é assim quando falamos da política agrícola, é assim quando falamos sobre conectividade, é assim quando falamos sobre o pilar social. Portanto, complicações, elas existem. O nosso trabalho é encontrar soluções para elas e resolver”, afirmou.
Brexit
Na entrevista, António Costa aborda o regresso do primeiro-ministro britânico a uma reunião europeia. Embora seja uma reunião informal, é algo inédito desde a efetivação do Brexit. Segundo o presidente do Conselho Europeu, este gesto político simboliza uma nova disposição do Reino Unido para “renovar” e aprofundar as relações com a União Europeia.
Costa destaca que “o novo governo britânico deu um sinal político muito claro de que deseja renovar as relações com a União Europeia”, porém, sublinha que “essa renovação implica, por um lado, assegurar o cumprimento escrupuloso dos tratados assinados entre ambas as partes, incluindo o tratado de saída e os acordos que estão prestes a caducar, como o relativo às pescas”.
Por outro lado, considera que “uma nova dimensão” que pode ser explorada, relativa a “melhorar as liberdades de circulação de bens, serviços, investimento e pessoas”. Costa reconhece que essas negociações implicam “desafios para ambas as partes”, lembrando que será a Comissão Europeia a liderar esse processo.
Na vertente da cooperação política e de segurança, Costa identificou áreas concretas de potencial avanço, especialmente no combate ao crime organizado e ao tráfico de seres humanos e de droga, mas também na área da defesa.
“O Reino Unido é uma grande potência militar, e, quando pensamos numa defesa europeia, devemos considerar uma defesa conjunta com o Reino Unido. É um exemplo do que temos feito no apoio à Ucrânia, onde o Reino Unido desempenhou um papel crucial na articulação do suporte europeu à luta ucraniana por uma paz justa e duradoura", reforçou.
EUA
O presidente do Conselho Europeu apela a uma abordagem pragmática, orientada para evitar divisões adicionais num cenário internacional já complexo e marcado pela guerra na Ucrânia. "A cooperação com o Reino Unido e os Estados Unidos é essencial para enfrentarmos os desafios de segurança e para garantirmos um comércio global equilibrado e vantajoso para todas as partes", concluiu.
"Os Estados Unidos são parceiros, aliados e amigos da Europa. Desejamos preservar essa amizade e resolver, de forma amigável e inteligente, os problemas comerciais que foram levantados, como o déficit comercial entre a Europa e os Estados Unidos. Estamos a trabalhar para encontrar soluções que evitem novos conflitos comerciais, que seriam mutuamente desvantajosos e prejudiciais para a economia global", afirmou ainda.