Luís Costa Correia: "As legislativas têm tido participação média de cinco milhões de pessoas. Isso ajuda a desfazer mitos"
O Voto é a Arma do Povo: as primeiras eleições livres em Portugal fazem 50 anos e a TSF convida 25 personalidades a falar sobre o voto. Luís Costa Correia conta como as eleições constituintes estiveram perto de não acontecer, explica como a sua ação foi determinante e ainda aponta o "mito" da enorme abstenção
Corpo do artigo
O oficial reformado da Marinha Luís Costa Correia foi uma das vozes mais importantes para que as eleições para a Assembleia Constituinte se realizassem a 25 de abril de 1975, tornando-se nas primeiras eleições livres em Portugal.
Reiterando que não participou diretamente na organização das eleições, Costa Correia "acompanhou de perto" o general Costa Braz, esse, sim, responsável pela organização do sufrágio. O processo iniciou-se em outubro de 1974 e foi feito o recenseamento que durou até fevereiro de 1975, quando se realizou a primeira reunião da Comissão Nacional de Eleições. No entanto, foi nessa altura que a ida às urnas foi posta em causa.
"Pouco depois, 10 ou 11 dias depois, um conjunto de oficiais, aliás, oficiais de grande craveira, muito ligados ao geral Spínola, motivados ou não por um boato sobre uma matança chamada ‘matança de Páscoa’, resolveram então tentar um golpe de estado. Efetivamente, aquele boato nunca foi provado. O único assunto, e julgo que publicamente é a primeira vez que é dito, é que houve uma carta entregue por ordens do geral Spínola, alguns dias antes do 11 de março, dirigida ao general Costa Gomes, cujo conteúdo não se conhece", conta à TSF o oficial da Marinha.
Posto isto, Costa Correia considera que esse ato foi um erro: "De qualquer maneira, isto é só para salientar que foi realmente uma péssima ocasião para se lançar um golpe de Estado quando, ao fim e ao cabo, o recenseamento mostrava que mais de seis milhões de pessoas tinham procurado recensear-se, numa operação muito louvável, em que milhares e milhares de pessoas que participaram nas ações de recenseamento e cuja mensagem subliminar era 'o país quer eleições’."
Ainda assim, a tentativa de golpe teve efeitos no que viria a acontecer. "As consequências do 11 de março levaram a que fossem impostas condições para que a Assembleia Constituinte funcionasse, no sentido de não serem exatamente decisões exclusivas pela Assembleia, mas sim condicionada por um pacto que era um bocado ridículo", considera.
Após ter ajudado a acalmar as tensões no 11 de março, foi "mais do que convidado" a participar na Assembleia Militar que decorreu nessa noite.
"Qual não é o meu espanto quando às 21h00, mais ou menos, surge em minha casa um distinto oficial que me ia convidar, ou quase mais do que convidar, quase solicitar, que eu fosse a uma assembleia que estava em curso. Cheguei lá e apercebi-me que o ambiente era tenso e queriam que explicasse o porquê de lá ter ido. Bom, foi uma mera curiosidade. Curiosidade matou o gato, não é? E então, em vez de responder a qualquer pergunta, disse: ‘bom, meus amigos, está provado que os militares não têm competência para se imiscuírem na orientação política do país. O que temos de fazer todos é ajudar a que se façam as eleições como previsto e que delas então surja um outro rumo para o país.’ Soube mais tarde que o general Costa Gomes tinha considerado que aquela minha intervenção tinha sido importante", recorda.
Dando um salto de 50 anos, Luís Costa Correia desmonta o "mito" do crescimento da abstenção, considera que o voto é sempre importante e confia que boa parte da população portuguesa continua a acreditar na democracia.
"O voto é sempre determinante, haver mais ou menos votos depende das circunstâncias. De um modo geral, no que diz respeito às eleições legislativas, as pessoas começaram a abster-se. Aqueles resultados da ordem de 90% de participação nas eleições foram-se atenuando, mas, em média, se olharmos para os números, as legislativas têm tido uma média de participação de cerca de cinco milhões de pessoas. Isso ajuda a compreender e a desfazer alguns mitos no sentido de se dizer que há uma abstenção enorme. A abstenção fixou-se num número razoável, em termos de comparação europeia. Admito que, com estas repetições sucessivas de eleições, possa haver algum cansaço e alguma diminuição na participação. Mas não me parece muito, porque as pessoas, pelo menos 60% de pessoas, continuam a acreditar firmemente na democracia e nas eleições", conclui.
Depois de uma revolução quase sem sangue, Portugal está há 50 anos a utilizar a arma mais forte que o povo tem: o voto. A TSF convida 25 personalidades a falarem sobre a importância da participação dos eleitores. Para ouvir todos os dias na antena da TSF de manhã, à tarde e à noite, e a qualquer hora em tsf.pt