Foram recrutados nos últimos oito anos por António Silveira Ferreira, empresário da Herdade do Vale da Rosa, maior produtora de uva de mesa de Portugal, e hoje habitam na região de Ferreira do Alentejo. Até o padre gosta deles, pois viu o número de fiéis aumentar nas missas de domingo
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Ao todo já são mais de 250 venezuelanos e lusodescendentes acolhidos pelo empresário António Silvestre Ferreira, na Herdade do Vale da Rosa, em Ferreira do Alentejo, para trabalhar na produção das uvas de mesa sem grainha. A maioria integra os quadros da empresa e quase todos já se fixaram na região.
O processo de recrutamento teve duas fases. Numa primeira, foi feita através da comunidade luso-venezuelana estabelecida na ilha da Madeira, mas numa segunda fase, desencadeada há quatro anos, começou pela contratação direta em países vizinhos da Venezuela e que leva as equipas de recrutamento da empresa duas ou três vezes por ano à Colômbia e ao Peru, para recrutar os refugiados venezuelanos que aí se encontram, com a ajuda de uma empresa local de recrutamento.
Para o empresário, é uma aventura que começou há oito anos. Já Portugal tinha visto passar a Troika pelo país e a Venezuela assistia a um choque de poderes que levava o povo às ruas, revendo-se no nível de sofrimento destas pessoas. "Até o cão ficou para trás", recorda o depoimento de um dos recém-chegados. Histórias que lhe lembram a da sua própria família, que passou por um processo idêntico há 50 anos, obrigada a emigrar para o Brasil e viu partir um irmão para a Venezuela.
Hoje, António Silvestre Ferreira diz que acompanha com muita preocupação o que se está a passar na Venezuela, porque considera que vive em clima de "guerra civil" e haverá mais população com vontade de sair do país. Mais um motivo que o leva a desejar continuar a recrutar luso-venezuelanos.
Para já, conseguiu, numa primeira tentativa, contratar 150 luso-venezuelanos, 80% ficaram nos quadros da empresa e foi aumentando esse número no último ano, o que se traduz em cerca de 250 pessoas já a trabalhar e a viver na região. Mulheres e homens que chegaram sozinhos. Contam vivências de supressão. Filas diárias para comprar pão. Recurso a limão para colmatar a falta de pastas de dentes ou desodorizantes. Depois de instalados em Portugal e começarem a receber os primeiros salários, mandam vir as suas famílias e fixam-se nas freguesias de Alfundão e Peroguarda, no concelho de Ferreira do Alentejo.
Numa região que tem sido afetada pela desertificação, confessa que até o padre está contente com a chegada deles, pois são pessoas extremamente religiosas e engrossaram o número de fiéis que vão à missa aos domingos.
Mas boa parte do trabalho na herdade é sazonal, dependendo dos ciclos das campanhas de fruta e estas pessoas no resto do ano têm a possibilidade de frequentar programas de formação profissional, oferecidos pela recém criada Fundação Vale da Rosa, que conta com o auxílio do IEFP - Instituto de Emprego e Formação Profissional, bem como das instituições de ensino superior da região.
Mesmo perante o clima de incerteza quanto ao futuro político da Venezuela, António Silvestre Ferreira assegura que não vai desistir de continuar o recrutamento de pessoas oriundas deste país e até está a usar o mesmo método para recrutar timorenses.
Para já, é uma aventura com quase uma década que o empresário garante que não quer pôr fim, até pelas semelhanças que encontra com a história da própria família que viu partir do Brasil para Caracas, um dos irmãos, também obrigado a emigrar há 50 anos.
