Novas suspeitas de corrupção no Parlamento Europeu envolvem lobby ligado à Huawei, buscas realizadas em Portugal
Em causa estão suspeitas de corrupção, falsificação de documentos, branqueamento de capitais e participação em organização criminosa. A Procuradoria-Geral da República confirma à TSF a realização de buscas em Portugal
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Numa operação coordenada pela Procuradoria Federal da Bélgica, a Polícia Judiciária apoiou, esta quinta-feira, a realização de várias buscas em Portugal, efetuadas pelas autoridades belgas, num caso no âmbito de uma investigação sobre suspeitas de corrupção no Parlamento Europeu, que envolve lobistas ligados à empresa tecnológica chinesa Huawei.
De acordo com informações recolhidas pela TSF, através do registo de transparência da UE, a Huawei declarou despesas de lobbying entre 2.000.000€ e 2.249.999€ para o ano financeiro de 2023, empregando 11 lobistas a tempo inteiro, dos quais nove possuíam acreditação junto do Parlamento Europeu.
A notícia sobre as suspeitas está a ser avançada pelo jornal belga Le Soir, que cita fontes da Procuradoria Federal. O jornal dá conta do envolvimento de uma centena de agentes da Polícia Judiciária Federal da Bélgica, sob a orientação de uma juíza de instrução financeira e do Ministério Público federal.
É referida a investigação sobre o envolvimento de uma empresa portuguesa, que foi esta quinta-feira alvo de buscas. Seria a partir desta empresa em Portugal que circulavam as transferências para “um ou mais eurodeputados”.
Contactada pela TSF, a Procuradoria-Geral da República confirma a "realização de buscas no âmbito de uma DEI (Decisão Europeia de Investigação) emitida pelas autoridades belgas". "A DEI foi cumprida pelo Ministério Público do DCIAP com a coadjuvação da PJ", lê-se na resposta enviada à TSF.
“Os benefícios patrimoniais associados à alegada corrupção estariam possivelmente misturados em fluxos financeiros relacionados com a cobertura de despesas de conferências e pagos a diversos intermediários, com o objetivo de dissimular a sua natureza ilícita ou permitir que os responsáveis escapassem às consequências dos seus atos. Neste sentido, a investigação procura também identificar eventuais indícios de branqueamento de capitais”, refere uma nota do Ministério Público Belga.
“A corrupção teria sido praticada regularmente e de forma muito discreta desde 2021 até ao dia de hoje, sob o pretexto de lobbying comercial e assumindo várias formas, como pagamentos em troca de posições políticas ou ainda ofertas desproporcionadas, tais como despesas de refeição, viagens ou convites regulares para jogos de futebol”, confirma a Procuradoria Federal, sem mencionar o nome da Huawei, refere o Le Soir.
A investigação centra-se em vários lobistas que alegadamente tentaram influenciar decisões políticas europeias a favor da Huawei. Segundo Le Soir, há indícios de que estes profissionais ofereceram vantagens financeiras e bens de elevado valor a pelo menos 15 eurodeputados, com o objetivo de favorecer a política comercial da empresa no mercado europeu.
As buscas ocorreram em diversas regiões da Bélgica, incluindo Bruxelas, Flandres, Valónia e também em Portugal. No total foram realizadas 21 buscas.
Entre os principais suspeitos está Valerio Ottati, diretor de assuntos públicos do escritório da Huawei junto da União Europeia desde 2019. Ottati, que anteriormente trabalhou como assistente parlamentar de dois eurodeputados italianos, teria facilitado encontros entre representantes da Huawei e decisores políticos europeus.
O jornal Le Soir adianta que os investigadores suspeitam que as práticas de corrupção ocorreram de 2021 até hoje, com ofertas de smartphones, bilhetes para eventos desportivos e transferências financeiras de milhares de euros.
O caso, que foi conduzido sob sigilo até à operação desta manhã, tem como nome de código "Génération". O Ministério Público belga confirmou a realização das buscas e afirmou que as suspeitas envolvem os crimes de corrupção, falsificação de documentos, branqueamento de capitais e participação em organização criminosa.
Até ao momento, não foi divulgada a identidade dos eurodeputados que alegadamente receberam os benefícios ilícitos, mas o Le Soir afirma que o número de suspeitos poderá aumentar à medida que as investigações avançam.
O Parlamento Europeu, reunido esta semana em plenário em Estrasburgo, reagiu de forma breve, afirmando que "toma nota das informações" e que vai colaborar plenamente com as autoridades judiciais, caso seja necessário.
O caso agora revelado surge pouco mais de dois anos após o escândalo do "Catargate", que envolveu acusações de corrupção e ingerência política por parte do Catar e de Marrocos no Parlamento Europeu.
Segundo o Le Soir, os serviços de informação da Bélgica tinham vigiado as atividades da Huawei e dos seus representantes ao longo de vários anos, alertando para possíveis ameaças de ingerência estrangeira e espionagem económica.