A líder parlamentar do PS, Alexandra Leitão, volta a falar numa medida "inconstitucional", com os partidos da esquerda a denunciar o seu caráter discriminatório
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O Parlamento aprovou esta quinta-feira os projetos de lei da Aliança Democrática e do Chega que visam alterar a Lei de Bases da Saúde para restringir o acesso de estrangeiros não residentes em Portugal ao Serviço Nacional de Saúde.
Os projetos de lei apresentados esta quinta-feira foram aprovado com os votos contra dos partidos políticos da esquerda (PS, BE, PAN, Livre, PCP) e Iniciativa Liberal e contou com os votos a favor do Chega e da Aliança Democrática. As medidas descem agora à fase de especialidade.
A proposta de lei do Chega pretende alterar a Lei de Bases da Saúde de 2019 para limitar o acesso ao SNS a estrangeiros que não residam em Portugal, só lhes permitindo aceder aos cuidados de saúde públicos em casos de emergência ou mediante pagamento.
Também o projeto de lei apresentado por PSD e CDS-PP visa alterar a Lei de Bases da Saúde para travar a "utilização abusiva" do Serviço Nacional de Saúde por estrangeiros não residentes em Portugal, exigindo documentação extra a estes cidadãos. A proposta refere que não pode ser ignorado o fenómeno da utilização do SNS por parte de estrangeiros não residentes e que se deslocam ao país com o propósito de acederem gratuitamente a cuidados e serviços de saúde ou a tratamentos médicos assegurados aos utentes do SNS.
A líder parlamentar do PS, Alexandra Leitão, voltou a falar numa medida "inconstitucional" e os partidos da esquerda denunciam o seu caráter discriminatório.
"Os residentes, ainda que irregulares, e muitas vezes pagantes para a Segurança Social, são, repito, inconstitucionalmente afastados do acesso ao SNS pela vossa proposta", denunciou Alexandra Leitão.
"Onde é que diz que os estrangeiros não têm cuidados de saúde que os portugueses têm? O que está é que pagam e não há nenhum impedimento na Constituição em que os estrangeiros pagam", foi a resposta de João Almeida, do CDS PP.
O deputado do PSD Miguel Guimarães completa: "Utilizar o SNS é diferente de ser beneficiário do SNS. É importante que introduzam isto no vosso discurso."
Os partidos de Governo exigem um comprovativo de cobertura de cuidados de saúde. O Chega vai mais longe e pede mesmo que quem entra em Portugal tenha um seguro de saúde.
"Temos de ter a coragem de deixar cair a palavra fácil, de deixar cair a palavra do humanismo bacoco, para dizer o que é mais básico e mais óbvio a Portugal: se não há para os nossos, não haverá para ninguém", atirou André Ventura.
Mariana Vieira da Silva, do PS, lamenta o debate com base em perceções: "Quem aqui vem a dizer que é esta utilização que traz sobrecarga ao SNS falta a verdade. Quem aqui venha dizer que esta utilização explica as dificuldades nas urgências agita fantasmas e alimentam um clima de ódio."
A coordenadora do BE acusou mesmo o PSD de "atirar gasolina" para as perceções sem factos, alegando que os estrangeiros não residentes em Portugal e não cobertos por seguros representaram 0,7% dos atendimentos nas urgências em 2023.
"Só se sabe uma coisa. Os 43 mil não residentes que não foram cobertos por nenhum seguro ou convenção e que acederam às urgências em 2023 são 0,7% de todos os atendimentos das urgências" nesse ano, afirmou Mariana Mortágua.
A deputada do BE falava no debate agendado pelo Chega sobre iniciativas legislativas de vários partidos, incluindo um projeto de lei apresentado pelo PSD e CDS-PP, relativamente às condições de acesso ao SNS por parte de pessoas estrangeiras que não residem em Portugal.
Segundo Mariana Mortágua, o PSD "fez tudo ao contrário" neste processo e conseguiu um 'hat-trick' de irresponsabilidade".
"Não garante o acesso da população ao SNS, atira gasolina para a fogueira das perceções sem factos que comprovem essas mesmas perceções e alimenta o crescente clima de desconfiança e xenofobia", lamentou a parlamentar do BE.
Referiu ainda que, se há redes organizadas para aceder ao SNS indevidamente, devem ser apresentados os casos e os números, alegando que a "lei existe para ser aplicada".
Na mesma linha, Paula Santos, do PCP, salientou que "é desumano" recusar cuidados de saúde a imigrantes que vivem e trabalham em Portugal "porque a sua situação é irregular".
"O que pretendem com estas iniciativas é construir uma narrativa contra os imigrantes, promover conceções racistas e xenófobas, dividir trabalhadores. É isso que o Chega faz e que o PSD, CDS e IL alimentam", criticou a deputada comunista, para quem o objetivo é também "atacar a Lei de Bases da Saúde" de 2019.
Os partidos que suportam o Governo querem retirar da lista dos beneficiários com acesso ao SNS os migrantes sem situação legalizada, passando a constar, além dos cidadãos portugueses, "os cidadãos em situação de permanência regular em território nacional ou em situação de estada ou em situação de residência temporária em Portugal, que sejam nacionais de Estados-Membros da União Europeia ou equiparados, nacionais de países terceiros, bem como apátridas ou requerentes de proteção internacional".
PSD e CDS-PP acrescentam ainda que "o acesso de cidadãos em situação de permanência irregular ou de cidadãos não residentes em território nacional implica a apresentação de comprovativo de cobertura de cuidados de saúde, bem como a apresentação de documentação considerada necessária pelo Serviço Nacional de Saúde para adequada identificação e contacto do cidadão", mas tal não se aplica a situações urgentes ou vitais.
Notícia atualizada às 19h47