Radicalização do discurso: extrema-direita quer "caos", extrema-esquerda "pode deslizar para retória de violência"
O filósofo José Gil assinala, no Fórum TSF, que "o problema do alastramento da extrema-direita é planetário" e o risco prende-se com o "fracasso das democracias". E traça uma diferença com a extrema-esquerda, que "não quer impor um regime antidemocrático"
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Das palavras ao atear fogo a autocarros, a morte de Odair Moniz espoletou um conjunto de reações. O disparo de um polícia que matou um homem cabo-verdiano continua envolto em questões por responder e, entretanto, assiste-se à radicalização do discurso político. "A retórica do ódio é uma retórica em que as palavras equivalem a ações. Insultar é uma ação violenta", sublinhou o filósofo José Gil, em declarações no Fórum TSF desta sexta-feira.
Após o episódio trágico ocorrido no bairro da Cova da Moura, na Amadora, André Ventura, o presidente do Chega, defendeu que o agente devia ser condecorado. Já Pedro Pinto, líder parlamentar daquele partido, afirmou que se as forças de segurança “disparassem mais a matar, o país estaria mais em ordem”.
José Gil assinalou que, neste ponto, já não se trata de "debate democrático", mas sim "de guerra". Ventura "quer o caos, o tumulto, a desordem instalados no espaço político português para tirar daí benefícios e para um só efeito: a tomada tirânica do poder".
O "perigoso" discurso de ódio coloca, no final de contas, a vivência em sociedade em risco: "O problema do alastramento da extrema-direita, que é planetário, é o fracasso das democracias."
Indo ao outro lado do espectro político: o líder parlamentar do Bloco de Esquerda, Fabian Figueiredo, referiu que "em Portugal é 21 vezes mais provável uma pessoa ser morta pela polícia se for negra".
Perante estas palavras, o filósofo realçou que há uma diferença entre um radicalismo e outro. Antes de mais, não vê como "a extrema-esquerda, no seu objetivo, queira impor um regime autocrático e antidemocrático".
"A extrema-esquerda tem de ter o máximo cuidado, porque há uma possibilidade de deslize quase automática da sua retórica para uma retórica de violência. Quer dizer, não é só de protesto", considerou ainda José Gil.

