Opinião

Quando um país violenta duas crianças

Daniel Oliveira defende que não só a TVI tem responsabilidades por ter divulgado as imagens de violência doméstica que envolvem um ex-político e uma apresentadora de televisão, mas também a procuradora, que foi ouvida pelo canal e, em última instância, o público.

No espaço de comentário que ocupa semanalmente na TSF, "A Opinião", Daniel Oliveira afirmou que "a exibição daquelas imagens foi um prolongamento amplificado de uma agressão", agravada pela "participação de um menor, por via telefónica, num programa".

"As imagens de violência doméstica que vimos na TVI envolvendo um ex-político e uma apresentadora de televisão começam por revoltar. Mas, quando travamos os nossos sentidos voyeuristas e pensamos cinco minutos, percebemos que a nossa revolta devia ser com a nossa participação num segundo momento de abuso e violência psicológica sobre menores", afirmou o jornalista.

Daniel Oliveira começou por recordar que o código deontológico profissional estabelece que «o jornalista não deve identificar, direta ou indiretamente, menores, sejam fontes, sejam testemunhas de factos noticiosos, sejam vítimas ou autores de atos que a lei qualifica como crime». O comentador citou, de seguida, a Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, que declara que «os órgãos de comunicação social, sempre que divulgam situações de crianças ou jovens em perigo, não podem identificar nem transmitir elementos, sons ou imagens, que permitam a sua identificação, sob pena de os seus agentes incorrerem na prática de crime de desobediência».

"Os jornalistas da TVI não cumpriram o seu dever. A TVI cometeu um crime", concluiu Daniel Oliveira.

O comentador considera que grande parte do jornalismo hoje feito é "tóxico" e "atenta contra os direitos humanos", defendendo, por isso, a necessidade de "debater seriamente a eficácia da regulação" dos meios de comunicação social no país. "Todo o poder desregulado é um poder que perde o sentido ético."

Daniel Oliveira aponta ainda o dedo a Dulce Rocha, a procuradora especializada em Direito de Menores que foi ouvida sobre o caso pela TVI. "Nenhuma criança concreta pode ser vítima da defesa de crianças abstratas. Para condenar o abuso, Dulce Rocha participou num abuso. Para denunciar um crime, foi cúmplice de outro", acusou.

"É preciso uma vila para educar uma criança, mas é preciso todo um país para a proteger. Neste fim de semana, falhámos", concluiu.

Texto: Rita Carvalho Pereira