Política

Emplastros ou papagaios. Quem são as pessoas atrás dos políticos que falam na TV?

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Assim que avistam o tripé da câmara de televisão a ser montado, "atropelam-se" para se colocarem atrás do líder e ficarem no alinhamento do repórter de imagem. Antigos assessores, um professor de comunicação política e um repórter de imagem explicam o fenómeno.

Na maioria das vezes não se sabe ao certo quem são. Podem ser dois ou mais. Assumem posição atrás do entrevistado e olham o horizonte, enquanto vão acenando com a cabeça como que a confirmar tudo o que é dito. Seja durante uma visita a uma feira, na inauguração de um monumento ou numa ação de campanha, eles estão lá.

Rafael Homem, repórter de imagem da SIC, explica que a presença de pessoas atrás do líder durante a entrevista "é uma grande dificuldade". O homem da câmara admite que, por vezes, "as pessoas ficam cortadas a meio, aparece só parte da cara e torna-se ruído".

Miguel Guedes, antigo assessor de Paulo Portas, teve de lidar com muitos "emplastros políticos". Hoje já não está ligado à política, tem uma empresa de comunicação, mas conhece bem o fenómeno. "Há de facto um tipo de pessoas que nestes eventos faz os possíveis para aparecer ao lado daquele político". O antigo porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros explica que há uma atração pelo poder que leva estas pessoas a juntarem-se aos líderes de forma a "passarem um pouco a ideia de que também elas estão próximas do poder".

Vasco Ribeiro, antigo assessor de Francisco Assis, usa outro termo: "papagaio do pirata". "Tal como acontece com o pirata principal, também existe um conjunto de políticos - políticos menores - que vão fazendo a sua carreira atrás do ombro do político que é a figura central". O professor de Comunicação Política na Faculdade de Letras da Universidade do Porto defende que alguns nunca passam de papagaios.

Emplastros convocados?

A presença de papagaios depende muito da ocasião. Há situações em que aparecem sem serem chamados, mas Rafael Homem garante que a maioria das vezes é trabalhada pelos assessores. "Ou porque são presidentes das distritais, ou porque são presidentes de câmara da mesma cor partidária. Dependendo do acontecimento, as pessoas são colocadas atrás para fazer volume e para aparecer".

O antigo assessor político, Miguel Guedes, explica que há eventos mais preparados, em que se convidam pessoas para acompanhar o líder e transmitir uma sensação de proximidade entre o político e o seu eleitorado. "Cria-se um pouco o cenário de o envolver com pessoas de faixas etárias diferentes, de etnias diferentes para criar um fenómeno de identificação". Nestes casos, recebem orientações. "Não olhar para a câmara muito diretamente, não ser demasiado efusivo porque transmite uma imagem de falsidade e há muitas vezes tendência para isso", explica Miguel Guedes.

O processo nem sempre corre bem. Vasco Ribeiro revela que, muitas vezes, o fenómeno foge ao controlo dos assessores de imprensa. "Por vezes, ficava admirado com a forma com que determinados políticos se atropelavam para colocar atrás do líder. Quando se começa o colocar o tripé da câmara de televisão e se vai buscar o líder para prestar a declaração, há um conjunto de políticos - menores - que vão logo atrás e que tentam logo colocar-se no alinhamento da câmara que tem maior audiência."

Rafael Homem defende que quem sofre é o repórter de imagem que, muitas vezes, vê os planos estragados devido à "ânsia de aparecer". Às vezes os assessores têm de intervir, conta Miguel Guedes, tentando "retirar simpaticamente essas pessoas do plano, para que a pessoa que está a falar possa estar corretamente enquadrada", longe dos "profissionais da colagem ao político".

Ser "emplastro" pode servir como trampolim?

Vasco Ribeiro entende que existem várias figuras da política em Portugal que têm feito carreira aos ombros dos piratas. "Usam isso para circuitos de influência e para construir a sua própria teia, do bairro, das zonas de influência, acabam por ir ganhando estatuto."

O antigo assessor recorda os agradecimentos que recebeu de uma pessoa com quem trabalhou e que entrou como "papagaio de pirata" na Política. "Dizia que começou a ter desconto e a ser melhor tratada na peixaria, porque as pessoas reconheciam-na da televisão."

Por vezes, para quem está por detrás da câmara, só há uma solução. "Desisto. Não dá", admite Rafael Homem. "É muita gente a acompanhar o líder que quer aparecer. Quer estar no momento do cumprimento para aparecer na televisão."