A opinião de Nádia Piazza na TSF.
O populismo está a espreita e a tomar como reféns muitas sociedades mundo afora e nada, ou quase nada, se está a fazer sobre o assunto. E fazer sobre o assunto, neste caso, é mais do que mudar leis.
Será certamente muito mais complexo. Contudo, julgo que passará por revalidar a forma como governantes e governados interagem, quase que numa constante legitimação que, numa sociedade madura, é cumprir com o que se compromete em programa eleitoral e numa muito maior ética e transparência na vida pública. Dito assim até parece que é fazer o que deveria ser sempre feito. E será. E é justamente porque assim não é, que o espaço para movimentos populistas tem ganho tamanha expressão.
Atualmente, o cenário é propício ao surgimento desses movimentos quando os principais intervenientes e instituições garantes dos direitos democráticos fundamentais não reconhecem e tão pouco estão preparados para a transformação que se está a operar no mundo com as novas tecnologias e a forma como a informação molda e muda a decisão pessoal e coletiva instantaneamente.
O povo, em democracia, é chamado a manifestar-se de 4 em 4 anos ou de 5 em 5 anos. E a tirar pelos resultados consistentes do elevado número de abstenções, há muito que o estado da democracia está a dar sinais de fraqueza. Que nos vale ir às urnas se tudo que é escrito e dito são para rasgar na primeira oportunidade sob uma alegação vinda dos confins do universo ou da anterior legislatura?
Isto porque eleitos e instituições andam a passo de caracol no reconhecimento dos riscos, numa nova forma de abordagem dos problemas que surgem, digamos, diariamente, e que exigem respostas quase que imediatas - veja-se o que 3 dias de paralisação dos transportadores dos combustíveis estava a causar no País ou o movimento dos coletes amarelos em França.
Não são apenas os eventos que são alertas, até porque podem encerrar em si mesmo novas tendências de organização e de manifestação perfeitamente legítimas, trata-se antes de uma janela de oportunidade e de oportunismo para o populismo, este sim, sempre a espreita.
Dir-se-á que é inevitável e cíclico, mas quero crer que não.
Com a disseminação e incremento substancial das novas tecnologias - que deixam de ser um instrumento, para ser afetar a própria substância, conteúdo, a forma de pensarmos, de agirmos, alterando o tempo de tolerância frente a um evento enquanto indivíduos e sobretudo como sociedade, moldando a reação, muitas vezes em cadeia ou por repetição - o modelo em que a democracia está alicerçada e os seus protagonistas podem bem ter os dias contados se continuarem a andar a passo de caracol.
Mais ética, maior transparência, maior compromisso com os programas eleitorais e maior abertura para a sociedade civil e talvez tenhamos alguma hipótese.