A ADSE é um assunto que volta à discussão pública em ciclos de 3 a 5 anos. E cada ciclo repete os mitos e problemas do ciclo anterior. Este novo ciclo não está a ser diferente. Vou dedicar os minutos de hoje a três elementos.
Primeiro, a ADSE como forma de ir buscar mais dinheiro para o setor da Saúde. Ora, se for obrigatória, de forma a que todos contribuam é como se fosse um aumento de impostos, porque é então melhor o sistema de contribuição da ADSE? Se for uma contribuição voluntária, como seguro público, e sendo uma percentagem dos rendimentos do trabalho, como se tratam quem, voluntariamente ou não, não trabalha? E se for voluntário, porque não descobriram os seguros de saúde essa fórmula? Mais, como a ADSE se tem que equilibrar aumentando as contribuições se for preciso, ou reduzindo as coberturas e comparticipações, o que defendem a este respeito as propostas que surgem? Sem responder a estas perguntas, defender a abertura da ADSE a todos não se sabe bem o que seja.
Segundo, a ADSE como forma de ultrapassar as dificuldades de acesso ao SNS, recorrendo a prestadores privados. O curioso é que se essa fosse uma boa solução, nada hoje impede o recurso a essa solução (e tal será possível mesmo com a nova lei de bases da saúde). Só que não é necessariamente uma boa solução, pelo menos tal como a ADSE funciona hoje - ao dar acesso direto a médicos de todas as especialidades, mina por dentro o que é frequentemente visto como um dos pontos fortes do SNS português - a rede de cuidados de saúde primários, tendo o médico de família o papel de acompanhar cada um de nós. No modelo de acesso a cuidados de saúde da ADSE esse papel não existe. É verdadeiramente essa mudança de modelo global que se pretende quando se fala no alargamento da ADSE?
Terceiro, a ADSE é mais barata do que o SNS. Na verdade, dizer isso ou o seu contrário é hoje uma questão de fé. Há despesas que a ADSE não paga porque o SNS as cobre para todos, incluindo a quem tem a ADSE, como é o caso das despesas hospitalares. E a população que tem a ADSE não é representativa da população nacional, pelo que as necessidades e a utilização de cuidados de saúde são diferentes. As comparações não podem ser facilmente feitas. As propostas de alargamento da ADSE têm por isso uma tarefa complicada em argumentar com valores sobre os efeitos que terão. Mas a pergunta permanece, quais as consequências financeiras, para o sistema de saúde?
Se não houver resposta clara a estas perguntas, a discussão sobre um modelo ADSE alargado a todos é imprecisa, sujeita a erros de avaliação, e irá desaparecendo do espaço público. Pelo menos até voltar a aparecer daqui a 3 ou 5 anos, outra vez com os mesmos argumentos.