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Strand: como os livros ajudam à normalidade em ano de eleições e de Covid-19

Cristina Lai Men/TSF

A última livraria na Broadway, em Nova Iorque, esteve em risco de fechar. O amor e a dedicação dos clientes fiéis falaram mais alto.

Fundada em 1927, a livraria Strand dedica uma banca às eleições norte-americanas, com livros de Joe Biden, Kamala Harris, Mary Trump e também sobre política, economia e a Covid-19.

Mas a pandemia ameaçou a sustentabilidade da Strand, que há cerca de duas semanas teve de fazer um apelo desesperado aos clientes.

A proprietária, Nancy Bass Wyden, escreveu uma carta aberta, pedindo aos clientes que voltassem a fazer compras. "A Strand sobreviveu à Grande Depressão, a duas guerras mundiais, o 11 de Setembro, às mudanças no mercado dos livros: as grandes lojas, os livros electrónicos, até a Amazon, mas isto da Covid deitou-nos abaixo", admite Nancy Wyden à TSF.

Com quebras de 70% nas vendas, Nancy esperava que a comunidade respondesse ao apelo, mas confessa que não esperava uma reacção tão avassaladora. "Num fim-de-semana, recebemos 25 mil encomendas online, quando num dia normal, teríamos trezentas. Claro que o sistema veio abaixo", conta com uma gargalhada, "mas mostra como os negócios independentes devem pedir o apoio da comunidade, quando estão em dificuldades".

Além das encomendas e compras na loja, a Strand recebeu outras respostas surpreendentes. "Uma pessoa ofereceu-se para dar uma festa de pizza para o pessoal, uma mulher do Bronx comprou 197 livros, alguns ofereceram aconselhamento financeiro e de impostos. Outra pessoa estava a comprar livros e ofereceu-me flores. Tem sido realmente inacreditável", afirma Nancy Wyden, repleta de gratidão pelos "melhores clientes do mundo".

A sobrevivência da livraria, com 93 anos, é também uma questão emocional. O negócio foi criado pelo avô, herdado pelo pai e agora está nas mãos de Nancy. "É muito mais do que uma livraria, é um centro para a comunidade ou um lugar de descoberta", diz a proprietária, recordando como uma cliente ficou noiva numa das salas da livraria. "O namorado deu-lhe uma cópia de Lolita, ajoelhou-se e havia um bilhete dentro do livro a dizer "por favor, casa comigo".

Lugar de inspiração para os autores, onde se encontram livros que mudam o sentido da vida, a Strand voltou por enquanto, a ser sustentável. No entanto, Nancy Wyden mantém-se cautelosa. Quer esperar por Janeiro, depois das compras de Natal, para olhar para as contas e partilha um desejo: "acho que todos queremos que este ano acabe. Queremos que as eleições aconteçam. Estamos todos esfomeados por um sentimento de normalidade. E os livros podem dar-nos isso".

Na banca a pensar nas eleições, Nancy Wyden destaca o livro de Mary Trump, sobre o presidente dos EUA. Mostra como Trump "tem de ser sempre o vencedor, seja como for, mesmo que tenha de deformar a realidade, mesmo que as pessoas se metam no seu caminho".

A 3 de Novembro, os norte-americanos decidem, sendo certo que em Nova Iorque, a Strand promete guardar, intacto, o amor pelos livros e pelas pessoas. São afinal, a alma da histórica livraria.

* A autora não escreve segundo as regras do novo acordo ortográfico