O pior da passagem de Eduardo Cabrita pelo ministério que tutela o SEF é o estado a que o SEF chegou, de que é triste exemplo o assassinato de um cidadão ucraniano às mãos do Estado português. O pior é isso, que não restem dúvidas. Só depois vem tudo o que se passou, ou melhor, que não se passou, de março até agora. E, no fim, a disparatada conferência do ministro. Para um governante com tanta experiência política, faltou-lhe temperar a altivez com um pouco de humildade, mesmo que daquela que os "spin doctor" costumam colocar nas palestras em que convencem um convencido que ele é a última coca-cola no deserto.
Para responder à gabarolice de um ministro que atacou tudo e todos, porque ninguém esteve à sua altura na luta pelos direitos humanos, e nos deu as boas-vindas a esse grande combate, faço minhas as palavras do Pedro Guerreiro, ontem no Público:
"Entretanto, há uma mãe na Ucrânia que diz que ainda não recebeu um telefonema de Portugal que lhe ajudasse a explicar aos filhos o que aconteceu ao pai. Foi em Março. Bem-vindos a Dezembro."
Seja então bem-vindo, senhor ministro. Sabe, como nós sabemos, porque vimos muitas vezes acontecer, que em Portugal ninguém perde o lugar por ser incompetente para o cargo que foi escolhido. A guia de marcha só costuma chegar para quem é incompetente a esconder a incompetência para o cargo.
Sabemos também que é antiga a sua cumplicidade política com António Costa e que, nestas lutas, isso vale mais que uma verdadeira amizade. Um amigo perceberia muito rapidamente o que estava a acontecer e, como amigo não empata amigo, já teria arranjado maneira de sair. Entre políticos que percorreram juntos grande parte do caminho, acontece muitas vezes caírem juntos. É o preço a pagar por viver na ilusão de que o caminho de um não podia ser feito sem o outro e vice-versa. É assim desde os tempos em que o combate era travado para ganhar associações de estudantes.
Tenho poucas dúvidas de que António Costa nunca deixaria cair Eduardo Cabrita se dependesse apenas dele. Acontece que, a caminho das eleições presidenciais, Marcelo Rebelo de Sousa pressionará tanto mais para que o ministro saia quanto mais a opinião pública der mostras de querer a cabeça de alguém. Pressionado, Eduardo Cabrita reage sempre como fez ontem no fim do Conselho de Ministros. Lembram-se, na sequência da trafulhice das golas inflamáveis, com demissões às pinguinhas, de ver o ministro da Administração Interna de dedo em riste a bater no microfone da SIC e a dizer que o jornalista tinha ali material inflamável? A culpa pode ser de todos, mas nunca é de Eduardo Cabrita.