Opinião

19 anos

Dezanove anos é muito tempo. E há uma geração inteira em sofrimento, que nunca viu, nunca festejou, nunca saiu de casa cantando que só não quer é ficar em casa. É uma geração, alimentada por pais e familiares e amigos, que sofreu época após época até conseguir ir para a rua festejar. E está de parabéns, com o seu clube. Só que não. Eles falharam. E alguém nos falhou.

O espetáculo a que assistimos em frente ao estádio de Alvalade, com milhares de pessoas sem máscaras, empoleiradas umas nas outras, ao mesmo tempo em que o porta-voz da PSP apelava a que fossem tomados todos os cuidados sanitários, reflete a irresponsabilidade coletiva, mas sobretudo o falhanço inaceitável de quem tinha por missão preservar a saúde pública.

Parece que não vivemos há mais de um ano limitados nas nossas liberdades individuais e coletivas, a enfrentar uma pandemia que já causou milhares de mortes, cujas incertezas diárias nos assolam, deixando famílias na miséria, empresas fechadas, negócios sem futuro.

Para lá de declarações de intenções e de uns apelos, vimos reação, bastonadas, tentativas de atenuar o mal já feito. Não houve planeamento, nem prevenção por parte de polícias, da Câmara de Lisboa e até do próprio clube. E sim, era expectável a euforia e a quebra de regras. Basta lembrar os festejos dos adeptos portistas no ano passado, na Avenida dos Aliados, mas longe, tão longe das imagens violentas e que nos envergonham de terça-feira, pela madrugada de quarta.

O primeiro-ministro defende o seu "excelente ministro da Administração Interna", que ordenou agora um inquérito ao sucedido. A PSP justifica-se num comunicado com 20 pontos onde fala numa "operação de grande envergadura", sem contudo, em momento nenhum, falar no planeamento conjunto com outras atividades.

O presidente da República entende que "quem deve prevenir" aglomerados de pessoas como os dos festejos do Sporting, em Lisboa, "não conseguiu prevenir", esperando que tal "não tenha custos" para a saúde pública em breve. Que, relativamente à pandemia de Covid-19, daqui por 15 dias, três semanas, o país não tenha "notícias menos boas por causa da euforia".

Esperamos todos. Dezanove anos depois, seria um troféu inaceitável.

Domingos de Andrade