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Relator da ONU quer entrar no Irão e pede criação de mecanismo de investigação

Abedin Taherkenareh/EPA (arquivo)

"Peço que a comunidade estabeleça um mecanismo internacional para investigar todos estes abusos", apelou Javaid Rehman.

O relator especial da ONU para os Direitos Humanos no Irão pediu esta quinta-feira a rápida criação de um mecanismo internacional de investigação às graves violações no país, reforçando o pedido para que o deixem entrar em território iraniano

Numa conferência de imprensa na sede da ONU, em Nova Iorque, Javaid Rehman afirmou que agora é o momento para a comunidade internacional agir, enquanto o povo iraniano "ainda não perdeu a esperança".

"Peço que a comunidade estabeleça um mecanismo internacional para investigar todos estes abusos. (...) Todas estas mortes são demasiadas e a comunidade internacional deve agir já na responsabilização, com o estabelecimento de um mecanismo internacional de investigação. É fundamental o comprometimento dos Estados-membros aqui, na ONU", apelou Rehman.

"Quantas vezes estas pessoas podem ser brutalizadas? Quantas vezes podem violar as suas liberdades fundamentais? As mulheres iranianas não querem ser subjugadas, elas veem o mundo, veem o mundo a mudar. As autoridades iranianas, brutais como são, não podem travar estas pessoas, estas mulheres. Agora é o momento de agir. Há o risco dessas pessoas perderem a esperança e isso teria sérias consequências para esse povo", avaliou.

O Irão enfrenta intensos protestos desde a morte de a Mahsa Amini, uma jovem curda de 22 anos que foi detida e agredida violentamente pela "Polícia da moral" por estar a usar o hijab (véu islâmico) demasiado solto, deixando parte do cabelo à mostra.

A sua morte desencadeou protestos em dezenas de cidades por todo o país de 80 milhões de pessoas, com jovens mulheres a marcharem pelas ruas expondo publicamente e cortando o cabelo. O Governo iraniano reagiu com forte repressão, atribuindo a culpa das manifestações à ingerência estrangeira.

De acordo com o relator da ONU, Amini "é uma vítima da brutalidade e da repressão do Estado".

Javaid Rehman detalhou que desde a morte da jovem, em 16 de setembro, foram emitidos muitos relatórios por parte de entidades iranianas sobre o que terá levado à morte de Amini. Contudo, todos foram rejeitados pela família da jovem, que pede que sejam médicos independentes a fazer a avaliação, o que tem sido negado.

"As investigações falharam os mínimos requeridos de imparcialidade e independência", observou o relator das Nações Unidas.

"Ela não foi a primeira, nem será a última mulher alvo deste tipo de violência. Temos recebido inúmeros relatos de situações semelhantes. Além disso, pelo menos 27 crianças já foram mortas pelas autoridades iranianas desde que os protestos começaram e foram registados, pelos menos, 250 mortos", frisou

Rehman criticou o facto de os seus pedidos por investigações imparciais e por responsabilização não tenham sido acolhidos.

Responsável por relatar a situação dos Direitos Humanos no Irão, Rehman lamentou ainda não ser autorizado a entrar no país, algo que seria fundamental para observar os desenvolvimentos no terreno.

"Não me autorizaram a visitar o país desde que assumi o mandato, mas os meus antecessores também não tiveram autorização. Se os líderes iranianos me estão a ouvir, eu deveria ser autorizado, eu quero estar lá, para poder ver e responder a todas as vossas perguntas", apelou Rehman, acrescentando que o Governo iraniano considera os seus relatórios parciais.

O relator reforçou que tem havido uma condenação global contra toda a brutalidade registada no Irão, mas frisou que isso não é suficiente, "é preciso ir mais longe".

"O que peço é que se unam num mecanismo de investigação internacional, para investigar estas graves violações. É muito importante que a ONU e a comunidade internacional tomem passos concretos para responsabilizarem os perpetradores destas violações", reiterou.

Rehman abordou ainda a repressão contra jornalistas e o bloqueio da internet por parte das autoridades iranianas, considerando trata-se de um "abuso do poder" de uma tentativa de limitar a liberdade de expressão.

"Foram detidos dezenas de jornalistas desde o início desta vaga de protestos. Os jornalistas são alvos desta brutalidade iraniana", sublinhou.