Opinião

Falhanço climático ou a esperança na humanidade

Jorge Cristino

Que a Humanidade vive tempos difíceis e perturbadores, já muita gente vaticinou. No entanto, poucos são os que apontam soluções de bom senso e credíveis, que permitam garantir uma estabilidade mundial. Para sabermos para onde apontar o caminho, precisamos antes de mais, de saber identificar os principais problemas e reconhecer a origem e as suas causas.

A conflitualidade crescente

Começo pela guerra, ou melhor, as guerras. A guerra na Ucrânia após a invasão da Rússia, que decidiu atacar um país independente, soberano e autónomo, por se sentir ameaçada por este e pela ordem internacional, enquadrando-se na clássica teoria do "dilema da segurança", em que a violência nunca para de escalar, até à retumbante derrota de uma das forças. Mas não é apenas esta guerra, que está em cima da mesa do mundo. Temos outras que também envolvem grandes potências, como os conflitos asiáticos entre China, Tailândia, Japão e Coreias. Para além de conflitos aparentemente mais "domésticos", no Médio Oriente, que colocam em causa a liberdade e um sem número de direitos humanos, globalmente acordados.

Estas crispações criam um ambiente tenso e de desconfiança na ordem internacional, colocando em causa a paz e a segurança dos estados e das pessoas. Além disso, diminui sobremaneira a possibilidade de cooperações não bélicas e do sucesso do multilateralismo, assente em princípios e valores básicos fundamentais, para um clima de crescimento e progresso internacional, que deve estar assente em causas nobres, a favor do bem comum da Humanidade e do Planeta.

Estas tensões, baseadas em argumentos e propósitos de poder e hegemonia económica e de recursos, utilizam como chantagem o uso dos mesmos, fundamentais para a sobrevivência das sociedades, como por exemplo, a alimentação, a energia ou a segurança.

Através do clima de incerteza, do medo e da ameaça, tentam, com relativo sucesso, instalar a discórdia, o caos, a cólera e a fúria entre os povos e dentro das comunidades, fazendo esquecer que a união e a cooperação estão na base da força para superar os desafios globais.

O desafio climático e o combate à pobreza

Como se não chegasse termos de enfrentar as birras de líderes internacionais poderosos, temos ainda que enfrentar os impactos das alterações climáticas, provocadas por ações naturais ou antropogénicas - para servir aos céticos ou negacionistas - em que como causa principal, está o excesso de emissões e o consequente aquecimento global. Tratados e acordos internacionais, falham constantemente, metas e objetivos são sucessivamente alterados, prazos adiados e oportunidades perdidas. A verdade é que vivemos perante 3 grupos de países, com velocidades e direções diferentes. Um grupo que apresenta ambição climática, que apesar de tudo, há uns que cumprem com a ação e outros não, ainda que alinhados na agenda. Outro grupo está em completo negacionismo e nem sequer está disponível para falar de acordos e metas de redução de emissões, ou mesmo de compensações. E por fim, existe o grupo de países completamente vulnerável, a sofrer os maiores impactos climáticos de sempre, com perdas e danos irreparáveis, aumentando o fosso da desigualdade entre os mais riscos e mais pobres, provocando um aumento de degradação da natureza, dos solos, da aptidão agrícola, da qualidade e quantidade da água e fazendo com que se tornem mais dependentes da ajuda externa, ao mesmo tempo que crescem as migrações e os desalojados climáticos. Nesta agenda, a frase atribuída a Einstein, não espere um resultado diferente, se todos os dias faz a mesma coisa, aplica-se como uma luva. No que se refere à abordagem no combate às alterações climáticas, associado ao desafio da desigualdade, à má distribuição de recursos e à pobreza, se não alterarmos o modelo económico, vamos continuar a aumentar o desastre numa "autoestrada para o inferno", como disse António Guterres na abertura da COP27, em Sharm El Sheikh, no Egito.

A nova era de esperança e a fénix renascida

O mundo não pode esperar mais, ainda que vivamos num clima de angústia permanente e tensões crescentes. Não podemos deixar que o medo e a incerteza invadam a vida das nossas organizações e da nossa sociedade e por maioria de razão, temos que dar o exemplo e servir de referência. Portugal, ao longo da sua história, foi uma nação que se soube afirmar e exigir a independência, ao mesmo tempo que soube criar pontes, negociar e cooperar com os vários povos. De crise em crise, sempre soubemos superar os piores momentos e servir de inspiração para outros. Um País que não o era para ser, um Povo que não se governa, nem deixa governar, mas que nas horas mais difíceis sabe unir-se e apresentar-se ao mundo como modelo. Veja-se até na história mais recente, com as crises financeiras e económicas que antecederam a própria crise provocada pela pandemia. Estamos perante o crucial momento de fazer a diferença. Perante o resultado de mais uma COP, a 27ª, em que não conseguimos chegar a um acordo ambicioso pelo bem comum e pela sobrevivência da humanidade - apesar da evidência científica - resta-nos agir com o objetivo de resolvermos o problema da nossa interdependência do exterior e dos impactos a que somos sujeitos. E sobretudo demonstrar, que através desde novo modelo, sairemos bem-sucedidos.

Este novo modelo, baseia-se na aplicação do conceito de uma ecoeconomia em que passamos a dar valor ao capital natural e a pagar pelos serviços de ecossistema a favor do bem comum. A ideia é começar por identificar o bem comum, o clima, como um bem intangível e estatuto jurídico internacional, seguindo-se a definição de um conjunto de métricas económicas, territoriais e ambientais, que permitam a implementação de um sistema de contabilização. Por fim, criar mecanismos de compensação certificados, que de alguma forma criem uma economia baseada na natureza, em que pagamos pelos serviços, para além dos produtos que dali retiramos. Todo um sistema de recursos, tangíveis e intangíveis, passando a valorizar-se não apenas aqueles que fazem menos mal ao clima, mas também aqueles que fazem bem, pela Saúde Planetária.

Este é precisamente o trabalho que tem feito, junto das Nações Unidas, o grupo de missão de reconhecimento do clima como património da humanidade, liderado por Paulo Magalhães e que com a conferência recentemente organizada com a CPLP, tornou possível uma cooperação assente nos tais princípios fundamentais da paz, da liberdade e da justiça, ancorados pelo denominador comum da língua portuguesa e repescando a história destes povos, em que podem voltar a fazer história num Mundo em crise de valores.

O Mundo precisa destes exemplos e destas soluções que nos inspiram para uma ação coletiva, demonstrando que é através da cooperação, da solidariedade, da tolerância, do respeito pela natureza e da compreensão pelo outro, que conseguimos criar um modelo justo, em que todos ganham. É a esbater progressivamente as desigualdades e a eliminar a guerra e a pobreza, enquanto aumentamos a resiliência climática, que teremos ativos fundamentais para a nossa sobrevivência.

Não podemos continuar a achar que os extremismos nos conduzam à solução. Por muito genuíno que seja o nosso ativismo, há sempre um ou outro oportunista à espreita, que nos orientará para o lado errado, retirando a assertividade necessária à ação. Agir sem hipocrisia e sem segundas intenções, é dirigir a ação construtiva aos nossos antípodas e estender a mão à convergência.