Opinião

Mais juros, menos dinheiro na carteira

A economia continua a brilhar, mas os bolsos dos portugueses ainda não dão por isso. Portugal teve um excedente orçamental de 1,2% no primeiro trimestre, conforme foi noticiado ontem. Face ao mesmo período do ano anterior, verificou-se um aumento de 9,3% da receita e de 4,3% da despesa.

Esta semana, o Banco de Portugal também já tinha revelado que a economia nacional registou um excedente externo de 693 milhões de euros até abril. Segundo o banco central, as exportações de viagens e turismo totalizaram 1942 milhões de euros, o valor mais elevado de sempre para um mês de abril.

No final de maio, foi a vez do Conselho de Finanças Pública ter anunciado que a Segurança Social registou, em 2022, o maior excedente em mais de uma década. Assim, são vários os indicadores de que a economia, a pouco e pouco, vai ressuscitando da pandemia e da guerra. Porém, como afirmou ontem Vítor Bento, presidente da Associação Portuguesa de Bancos, ao DN e TSF, "a inflação ainda não está controlada"e é preciso mais um esforço, "a inflação tem de ser contida. Se perdurar, aí sim, vamos ter uma recessão maior".

Para as famílias isso significa mais aumentos das taxas de juro, tal como, aliás, o Banco Central Europeu já anunciou. Do lado do Estado e dos próprios bancos, a situação vai exigir uma especial atenção aos mais vulneráveis. A banca garante que tem estado a renegociar com quem precisa, mas a procissão parece ainda estar no adro.

Se lermos com atenção o último relatório do FMI, a previsão aponta que se os juros continuarem a subir na Zona Euro e a emagrecer as carteiras, muitas famílias portuguesas vão gastar 70% do seu rendimento em alimentação, eletricidade, água e dívidas. Travar a inflação vai ter um custo sério para muitos.

Na avaliação do FMI há elogios à política orçamental seguida em Portugal, mas ficam alguns alertas: vai ser preciso mais para reduzir o défice e a dívida pública e há uma forte preocupação com o duro cenário que as famílias vão enfrentar. Vai faltar o dinheiro na carteira e o FMI antevê contração do consumo privado e perdas no crédito, ou seja, mais incumprimentos bancários e malparado. Assim, o crescimento previsto pelo governo de 1,8% vai ser pouco para acomodar tantos desafios. Independentemente da ideologia, tudo indica que em 2023 vai ser necessária uma política mais humanista.

Rosália Amorim