Médico e director de um hospital na cidade de Gaza, capital do território em guerra, Salah é agora um dos quase dois milhões de deslocados internos palestinianos em Al-Awasi, perto de Khan Yunis. Entrevista na TSF.
Salah é medico, dirigiu um hospital na cidade de Gaza. Está a quilómetro e meio da bela casa que mandou construir, mas não lá consegue ir. É zona de guerra. Hoje vive num campo de refugiados. A TSF tinha falado com ele em finais de outubro, cerca de mês e meio após o ataque do Hamas.
Continua no território substancialmente destruído, mas já não na capital. “Sim, estou na faixa de Gaza, em Khan Yunis. As tropas israelitas obrigaram-nos a abandonar as nossas casas. Agora estou num campo em Al-Mawasi, que fica no Mar Mediterrâneo, perto de Khan Yunis”. Aquilo que começou por ser, segundo relatava a BBC a 25 de novembro, “aglomerados em barracas, entre os campos arenosos”, é agora um enorme estendal de tendas da ajuda humanitária, que mal resistem às baixas temperaturas.
O médico não dá propriamente uma visão otimista da situação no terreno: “A vida agora em Gaza, na minha casa, em Khan Yunis, em Rafah ou em qualquer lugar em Gaza, é muito, muito difícil, porque agora o tempo está muito frio. A maioria das pessoas, cerca de dois milhões, vive em tendas. A maior parte das pessoas tremem de frio, especialmente à noite e de manhã, porque não há roupa suficiente para cobrir à noite e também não há comida para lhes dar energia.”
Montado muito graças à ajuda internacional ao longo de várias décadas, pouco sobra do sistema hospitalar dos palestinianos que não estão na Cisjordânia: “O total dos hospitais em Gaza que estão a trabalhar é de cerca de 15, mas não trabalham totalmente, talvez metade consiga ou menos de metade, porque não há instrumentos, não há medicamentos, não há materiais para utilizar. E se me pergunta como é que o equipamento tem entrado, não há nenhum equipamento que tenha entrado para os hospitais e também os médicos, muitos deles morreram, alguns deles na prisão, outros longe dos locais, dos hospitais onde estavam a trabalhar. Por exemplo, o Hospital Nasser, é um hospital muito, muito grande, é o segundo hospital em Gaza, depois do Shiva, e o número de médicos é talvez de 10. Só há 10 médicos no hospital, porque está cercado pelas tropas israelitas, que não permitem que ninguém entre no hospital. Quero dizer, o estado dos hospitais é muito miserável.”
E em Rafah, cidade a sul de Khan Yunis, junto à fronteira do Egito, a mais recente operação militar israelita anunciada por Netanyahu? Salah responde que “há um hospital pequeno ou demasiado pequeno em Rafah que dificilmente funciona e as pessoas sabem que o total de população em Rafah é de cerca de um milhão e meio, porque os imigrantes ou refugiados em Rafah são agora cerca de um milhão e 200 mil e o total da população era de pouco mais de 300 mil pessoas, agora o total é de cerca de um milhão e meio, numa área muito, muito pequena.”
Sobre a recente proposta do Hamas para acabar com a guerra, libertando primeiro reféns mulheres, crianças, idosos e doentes em troca da paragem da ofensiva, fim dos ataques aéreos e libertação de mil e quinhentos prisioneiros palestinianos, num período de cessar-fogo de 45 dias, o médico considera que “é muito adequada para o povo de Gaza, para o nosso povo, mas é claro que Israel vai rejeitá-la e, claro, vai demorar alguns dias ou mesmo semanas para resolver este problema.”
Agora, admite que “os americanos estão a fazer um pequena pressão para os israelitas resolverem a guerra”, mas se realmente quiserem, “podem fazê-lo facilmente, mas o que fazem é vetar o fim da guerra e a guerra continua; quero dizer, Biden pode pará-la muito rapidamente e muito facilmente, mas não quer parar esta guerra… Não sei porquê.”
Pode ouvir a entrevista na íntegra no episódio deste sábado do Estado do Sítio.